A derrocada do Crédit Suisse mostra, uma vez mais, que nestas coisas de bancos e negócios não há nada que seja eterno e seguro. Os gigantes também cometem erros, embora tenham todos os recursos necessários para pagar os melhores conselheiros que o mercado pode oferecer. Mas nesta área, como na política e noutras, muitas vezes a opinião dos conselheiros é ignorada pelos líderes e a catástrofe surge, ao virar da esquina ou com o tempo. Os líderes de grandes instituições, tais como os líderes de grandes potências, pensam que são seres superiores e que, por isso, não cometem erros. A realidade é muitas vezes outra. Na economia e na política a prudência é a virtude mais importante.
Três comentários breves, por não haver tempo para mais. Mas terei de voltar a estes assuntos.
Primeiro: A nossa elite política, nos partidos e na comunicação social, não aceita ser contestada. É uma elite de aldeia. Vive em círculos fechados e não admite estranhos. Só as estrelas da aldeia é que têm direito à voz pública.
Segundo: Ter qualidades de liderança, como Zelensky e muitos outros o mostram ou já mostraram, é saber obter resultados com meios reduzidos. Não passa pelo uso dos galões, estatutos, nem por invocações tolas e burocráticas de regras que não podem ser aplicadas. Quando se quer que o sistema funcione, cria-se primeiro as condições necessárias.
Terceiro: O servilismo de certos órgãos da comunicação social em relação a um pardal não chega para o transformar numa águia real. Mostra, simplesmente, um nível de subserviência que roça a saloiice.
Somos uma geração de egoístas, a viver de modo insustentável, hipotecando o futuro, destruindo a natureza e esquecendo o futuro dos nossos descendentes. Os políticos endividam os países para dar a impressão que se vive bem, com todas as comodidades, que somos dirigidos por gente que sabe o que está a fazer. E na verdade, sabem, têm todas as matreirices: estão a destruir o planeta terra, a ganhar agora sem se importarem com as consequências futuras.
Liderar é preparar um futuro melhor e sustentável. Ser-se oportunista é tratar apenas da imagem que se projecta hoje.
Quando escrevi sobre Desmond Tutu, liguei a sua vida à expressão "liderança positiva". Sempre me interessei pelas questões de liderança. A capacidade e a qualidade dos líderes fazem a diferença, nos processos de transformação social. Por isso, procuro frisar os exemplos que merecem ser frisados.
Um dos meus leitores interroga-me sobre a expressão. Que significa positiva, quando ligada à liderança? Como resposta, mencionarei Donald Trump. O homem é um líder. Não tenho dúvidas. Mas é um líder que leva as pessoas no sentido errado. É um exemplo de liderança negativa.
Aqui deixo uma profunda homenagem ao Arcebispo Desmond Tutu. Quando tudo passa, a memória que fica desde grande personagem de cariz mundial – foi Prémio Nobel da Paz – é do poder que uma só pessoa pode ter em termos de transformação social. Para isso, como o Arcebispo Tutu nos mostrou ao longo da sua vida, é preciso combinar uma excelente capacidade de comunicação, dizendo as palavras que tocam as vidas dos mais simples, com um exemplo permanente de humildade e de humanismo, sem perder a alegria de viver e a esperança em dias melhores. É preciso ser-se coerente, nas diferentes facetas da vida. Tutu foi um mestre para quem o procurou ouvir. Um exemplo de liderança positiva.
Liderar implica estar atento às preocupações das pessoas. E saber dar voz e sentido a essas preocupações. Ou seja, é preciso manter uma ligação permanente com os cidadãos. O erro de muitos políticos é confundirem elitismo com liderança. As elites tendem a relacionar-se apenas entre elas e a ignorar o resto das pessoas, as gentes comuns. E assim acabam por falar uma linguagem que nada diz à generalidade das pessoas, uma linguagem que não é entendível e que é vista como uma maçada, um aborrecimento, um falar à “político”.
Ainda recentemente um amigo meu escrevia um texto sobre a reforma do Estado, que faria se estivesse no poder. Foi uma escrita enfadonha, cheia de lugares-comuns e de frases feitas, que são frequentemente repetidas, mas que nada dizem de concreto às pessoas. É como a conversa sobre a redução dos impostos, uma bandeira frequente de vários políticos. Juram a pés juntos que os irão baixar, mas não explicam que relação haverá entre essa descida e a modernização e racionalização de certas funções do Estado. Ora, sem uma reorganização de certos serviços – é preciso dizer quais – não é possível poupar nas despesas públicas. E sem isso, não há imposto que diminua. Também deveriam dizer que a alta taxa de imposição tem muito que ver com o mau funcionamento da administração pública. Há muito dinheiro que é gasto em burocracias inúteis e em serviços que poderiam ser agrupados ou reorganizados. Assim se faz noutros países, incluindo em países de desenvolvimento intermédio. Há que enumerar esses serviços, proceder a uma avaliação em profundidade e reestruturar.
Assim se ganharia apoio popular. E se faria política de uma maneira mais séria e mais eficiente
A mais de dois meses e meio das lições legislativas é muito difícil fazer prognósticos. Estamos num período de grandes incertezas e mudanças. Os acontecimentos que poderão ocorrer neste período pré-eleitoral e as campanhas que vierem a ser feitas pesarão mais do que o que tem sido habitual.
Também será importante escolher bem os candidatos que desempenharão um papel de bandeira. É aí que os partidos estabelecidos há mais tempo poderão ter alguma vantagem. Os novos partidos não têm gente conhecida e com credibilidade suficiente. E não vão conseguir apresentar listas de candidatos convincentes.
Um exemplo concreto é o do partido Chega. Além do chefe, não têm mais ninguém que se veja. A própria direcção central está cheia de pessoas de passado duvidoso. E o resto é gente sem experiência. Isto, independentemente das ideias que defendem, que são poucas, pobres e primárias.
Sem optimismo não há futuro, sem imaginação não há optimismo. Esta é a minha divisa preferida, criada por mim próprio e na qual penso frequentemente. Nestes tempos, é muitas vezes necessário não perder de vista o optimismo.
Mencionei esta divisa na entrevista que ontem foi publicada pelo Diário de Notícias. E acabou por ser uma das mensagens que mais atenção atraiu. Mas havia outras mensagens na entrevista: sobre a pobreza estratégica da actual liderança política portuguesa; sobre a falta de civismo de muitos de nós; e sobre a forma caótica como se tem desfigurado o território nacional, sobretudo nalgumas regiões de grande valor e beleza natural. Todas elas chamaram a atenção de muitos milhares de leitores. O texto despertou um interesse enorme, invulgar.
Mostrou também que se pode falar das nossas realidades sem ser preciso fazer longos arrazoados. As pessoas querem ideias novas expressas de modo sintético. O resto é depois construído por elas. Isso lembra-me que o trabalho do líder é o de abrir portas e apontar para os caminhos possíveis.
Contra todos os pareceres científicos, Boris Johnson anunciou esta tarde que as medidas restritivas, destinadas a controlar a propagação da covid-19, iriam ser levantadas dentro de duas semanas, no que diz respeito à Inglaterra. Em matéria de saúde pública, cada nação do Reino Unido tem autonomia própria. Por isso, o seu anúncio limita-se à parte inglesa do país.
Esta decisão política é um sinal de fraqueza. O PM sabe que as normas impostas são cada vez mais ignoradas pela população. Basta ver as fotografias do fim-de-semana para se perceber isso: gente por toda a parte, nos bares e noutros locais públicos, sem distância nem máscara, na maioria dos casos. Os especialistas queriam que as normas em vigor fossem aplicadas com seriedade e disciplina. Boris não teve coragem para isso. Decidiu permitir o que já estava a ser praticado.
Entretanto, o número de casos diários, na Inglaterra como por cá, continuam a aumentar. É verdade que há menos óbitos. Mas é igualmente um facto que a expansão da pandemia não é algo que possa ser levado de modo ligeiro. Tem múltiplos impactos: humanos, económicos, sociais e nas relações entre os Estados.
A Cimeira Social, que ontem e hoje decorreu no Porto, deve ser vista como uma iniciativa positiva. A dimensão social é certamente uma das características mais definidoras das sociedades europeias.
Mas convém ter presente algumas verdades. O nível de protecção social de cada Estado-membro depende fundamentalmente do grau de desenvolvimento da sua economia. E nessa matéria, existem sérias disparidades que não serão resolvidas nos próximos dez anos. O que a Alemanha pode oferecer aos seus residentes é muito distinto do que a Letónia é capaz, para não falar da Bulgária ou da Roménia.
É verdade que existem mecanismos para ajudar a resolver essas disparidades. Mas também é um facto que o fosso entre os diferentes níveis de vida e de protecção não tem diminuído, apesar das ajudas e de outras transferências entre países.
Progresso é essencialmente um desafio nacional. É preciso ter isso presente. Arrumar a casa começa por quem lá vive. É uma questão de responsabilidade. Na União Europeia, o esforço comunitário deve vir em complemento do esforço nacional. A liderança que importa e deve prestar contas aos cidadãos é, acima de tudo, a que está à frente do país, não apenas a que trabalha a partir das instituições europeias. Uma liderança com valor é a que consegue reduzir as diferenças.