Aterragens suaves
Copyright V. Ângelo
Este é dos vários felinos do Padre Missionário Avelino Maravilha. Que maravilha de bicho, dirá o leitor. Eu, que conheço melhor o Padre, digo que maravilha de homem, que há 17 anos vive a sua vida de missionário no Sul do Chade. Muito longe de tudo, muito perto da miséria. A única ligação com Portugal é o bagacito de boa cepa que vem chegando pelo correio --quem diria que os correios do austero Chade servem de veículo à aguardente do Douro? Ou, outra ligação, a viagem até Lamego, de três em três anos.
Pensei no seu gato, porque os gatos sempre caiem de pé. Hoje, também caí de pé. O nosso jacto para Abéché não conseguia arranjar vez para aterrar. Havia uma série de voos humanitários à nossa frente. Andámos às voltas pelo deserto, que a assistência humanitária está a transformar o aeroporto de ABC, como nós por cá dizemos, numa espécie de Heathrow local.
Finalmente, veio a autorização de aproximação e de aterrar. Eu estava no cockpit, favor do estatuto, não por ter asas. Com o avião já a tocar a pista, a torre pergunta onde estamos. Como? Onde estamos?! A cinco metros do solo, teria sido a resposta exacta. E a duzentos e tal à hora, meus amigos. O co-piloto, que tinha a responsabilidade da aterragem, paralisou durante um quarto de segundo. Sentindo que havia um problema, foi a sua primeira reacção, acelerou de imediato, para levantar o bicho metálico do chão. Um outro quarto de segundo depois, apercebeu-se que a torre estava pura e simplesmente fora de jogo. E voltou à manobra de aterragem. Lá batemos com toda a força na pista, um pouco de lado, mas somos uns gatos do deserto, e continuámos de pé.
Uma maravilha.
É bom para quem gosta de emoções fortes.