Fazer de parvo
Andar a fazer de parvo dá muito jeito. Assim acontece, na vida diplomática. Finge-se que não se entende e passa-se em frente, ao que é, de facto, importante. Com elegância, que na diplomacia, e na política, convém ter maneiras. A cortesia, a forma, o porte, a postura, são armas eficazes. Sobretudo quando o outro lado usa essas mesmas tácticas para tentar levar-nos à certa.
Lembro-me quando negociava com o governo japonês, haverá uns dez anos. Os meus interlocutores, quando a questão lhes parecia embaraçosa, murmuravam umas frases impossíveis de entender. Repetia eu o ponto, para tentar obter um esclarecimento. E a contraparte voltava a dizer umas coisas mal pronunciadas e sem sentido claro. Mas eram ditas com calma e educação. Eu ficava desarmado. Não podia passar a reunião a pedir que repetissem a mesma coisa. Entre fazer de parvo, por não compreender, e fazer de parvo, por parecer ter compreendido, a segunda opção sempre era mais digna.
O fundamental era entender bem o que os meus interlocutores queriam dizer, mas não diziam. E tirar as conclusões que se impunham.
Nestes dias, as andanças fazem-me pensar nestas experiências. Pratico, de novo, o jogo do parvo. Mas não convém andar a fazer de cego. Isso, sim, seria uma parvoíce das antigas.