O senhor muito bem educado e muito simpático que recebeu quase 200 000 Euros do BPN, sem que tenha mexido muita palha, continua a receber todos os meses uns largos milhares de Euros, em Bruxelas, em pagamento de um "emprego" que na realidade não existe.
Desempenha umas funções fantasmas, que ninguém consegue ver, mas recebe um salário real. É mais uma avença, como a que recebia do Banco. Tudo muito limpo e com boas maneiras.
Acabo de voltar de Yaoundé e Bangui, a esta hora tardia do serão. É um girar na via rápida, a passo de jet, uma aceleração que tem que ter uma pausa.
Entretanto, o grupo gostou muito de conhecer Yaoundé. Estivera recentemente na capital dos Camarões, no meu caso, a cidade não era uma descoberta. Mas para quase todos os outros, constituía uma novidade. Incluindo para os dois colegas do GOE que comigo viajaram.
É uma cidade verde, de colinas, rodeada por uma floresta equatorial, cheia de vida e com uma certa graça. Há dinheiro em Yaoundé. Casas grandes, gente rica, e, como sempre, o outro lado da equação. Gente a tentar sobreviver o dia-a-dia. Mas como a maioria das migrações se fazem do meio rural camaronês para Douala, o grande porto e centro da vida económica, a capital consegue manter um ar relativamente organizado e próspero.
Disse ao Ministro dos Negócios Estrangeiros que tinha estado muitas vezes no seu país. Que a primeira vez fora em Julho de 1978, numa altura em que os Camarões estavam numa fase de arranque acelerado da economia. Quando o país se havia transformado num grande exportador de frutas e de outros produtos agrícolas tropicais.
Retribuiu a amabilidade, ao lembrar que o país recebera o seu nome dos navegantes portugueses.
Hoje, certos navegantes andam num rodopio que dá um ar de importância, mas que não leva à descoberta de novas terras.
Hoje é dia de visita a Bangui. Bangui La Coquette, como eles dizem, a cidade que gosta de se enfeitar e pintar.
Não está longe da verdade. Só que, como muitas coquettes que se pintam de todas as cores e colocam uma variedade de postiços, a beleza é só de fachada. Os problemas são imensos, mas como a um bom político do antigamente, a brilhantina dá um ar de elegância...
Com uma superfície seis vezes superior à de Portugal, e uma população que caberia na zona da grande Lisboa, minérios de alto valor estratégico e diamantes, é um enorme espaço virgem, que é violado por toda uma vaga de aventureiros.
Este é dos vários felinos do Padre Missionário Avelino Maravilha. Que maravilha de bicho, dirá o leitor. Eu, que conheço melhor o Padre, digo que maravilha de homem, que há 17 anos vive a sua vida de missionário no Sul do Chade. Muito longe de tudo, muito perto da miséria. A única ligação com Portugal é o bagacito de boa cepa que vem chegando pelo correio --quem diria que os correios do austero Chade servem de veículo à aguardente do Douro? Ou, outra ligação, a viagem até Lamego, de três em três anos.
Pensei no seu gato, porque os gatos sempre caiem de pé. Hoje, também caí de pé. O nosso jacto para Abéché não conseguia arranjar vez para aterrar. Havia uma série de voos humanitários à nossa frente. Andámos às voltas pelo deserto, que a assistência humanitária está a transformar o aeroporto de ABC, como nós por cá dizemos, numa espécie de Heathrow local.
Finalmente, veio a autorização de aproximação e de aterrar. Eu estava no cockpit, favor do estatuto, não por ter asas. Com o avião já a tocar a pista, a torre pergunta onde estamos. Como? Onde estamos?! A cinco metros do solo, teria sido a resposta exacta. E a duzentos e tal à hora, meus amigos. O co-piloto, que tinha a responsabilidade da aterragem, paralisou durante um quarto de segundo. Sentindo que havia um problema, foi a sua primeira reacção, acelerou de imediato, para levantar o bicho metálico do chão. Um outro quarto de segundo depois, apercebeu-se que a torre estava pura e simplesmente fora de jogo. E voltou à manobra de aterragem. Lá batemos com toda a força na pista, um pouco de lado, mas somos uns gatos do deserto, e continuámos de pé.
Hoje recebi a condecoração que Javier Solana me atribuiu, em nome da Política Europeia de Segurança e Defesa. A medalha reconhece a minha contribuição para o sucesso da política europeia de segurança em África.
Foi um gesto apreciado. A medalha pesa, que a tarefa não foi fácil de levar a bom termo.
A VISÃO desta semana teve a amabilidade de publicar o meu texto mais cedo. Foi enviado hoje de manhã para sair na Quinta. Saiu hoje mesmo à tarde. Parece que gostaram muito.
Depois de um dia ao Sol, 45 graus, a pôr condecorações no peito de militares, a discutir como conjugar o trabalho das tropas com o dos polícias, rebeliões e outras aventuras armadas, o papel das comunidades na resolução dos conflitos à volta da água e das terras, o ter ou não uma reserva estratégica de combustíveis para o abastecimento necessário durante a estação das chuvas que está a chegar - consumimos centenas de milhares de litros por mês - , fui jantar com uma delegação do Eliseu e mais uns ministros e outros notáveis aqui da terra.
Calhou-me uma conversa séria com Presidente da Assembleia Nacional. É um gigante de dois metros e tal, um dos filhos de uma das cinquenta e três esposas do seu falecido pai.
Resolvidos os assuntos em causa, o Presidente virou-se para mim, viu os meus cabelos brancos, a minha posição, estatuto, e disse-me: "Temos que ir visitar a minha região natal. É aquela ponta que entra pelos Camarões adentro." Acrescentou, após uma pausa que tardou em findar: "Garanto-te que voltarás com dez mulheres!"
Claro que respondi muito obrigado. Mas a viagem fica sem data marcada. Foi apenas um jantar diplomático das dez. Da noite.