Nos fiordes
A política e as sacanices portuguesas, vistas de Oslo, perdem todo o sentido. Fazem, tão somente, muita pena.
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A política e as sacanices portuguesas, vistas de Oslo, perdem todo o sentido. Fazem, tão somente, muita pena.
Depois do enfraquecimento do governo, tivemos hoje a confirmação do enfraquecimento da Presidência. Sem falar, claro está, na pouca qualidade da maioria dos novos deputados.
À crise económica junta-se agora a crise das instituições da República.
Preocupante.
É tempo de dar a primazia aos interesses do país. Ultrapassando as questões pessoais e os egos ofendidos ou vingadores. Atacando os verdadeiros problemas, da economia, da justiça, da educação, da pobreza e da segurança.
Este texto está a ser escrito a alta velocidade, numa bela manhã de um Outono com Sol, no TGV entre Bruxelas e Paris. O pequeno-almoço, que está incluído no bilhete do comboio, foi de boa qualidade. Mas não é a qualidade que nos faz pensar em Portugal. É a alta velocidade, a polémica, a nossa aptidão para discutir o já resolvido noutras terras.
Parece, ao ver os resultados das eleições de ontem, que os nossos projectos de TGV vão para a frente. Ainda bem. A economia, a interligação com o grande mercado que é a Espanha, todos precisam de novas oportunidades.
Ganhou a aposta na infra-estrutura.
Mas ao nível da superstrutura que é a política, como se reconhece quem ganhou? Para lá da resposta óbvia de quem vai ser convidado a formar governo, penso que conta muito ganhar deputados. Afinal, estamos ou não, numa democracia representativa?
Quando um partido perde um grande número de assentos, a verdade é que leva uma sova do eleitorado. O partido que ganha deputados, ganha força. Essa é que é a verdade.
Derrotada sai a formação que tinha reais hipóteses de ser governo e que deixou escapar a ocasião. As hipóteses existiam. Havia muita gente à procura de alternativa. Como a não encontraram, resolveram ir passear. Talvez para ver onde vai ser construído o novo aeroporto de Lisboa e por onde vai passar o TGV da nossa esperança.
Ontem acordei em Farchana, passei o dia em a correr, em N´Djaména, e segui à noite para Paris. Um dia de grandes contrastes.
Farchana é um pequena localidade no Leste do Chade, a cerca de uma hora e meia de estrada da cidade sudanesa de El Geneina. Está no centro da região mais perigosa de toda a nossa zona de operações. Homens armados atacam veículos, pessoas e bens, roubam gado, atiram com calibres de guerra, sem aviso, por dá cá aquela palha.
Temos uma base mista, civil e militar, em Farchana. Os civis ocupam-se do reforço administrativo e político das autoridades locais, dos direitos humanos e da justiça. Os militares fazem patrulhas, organizam escoltas e dão apoio aos polícias das Nações Unidas e à força de manutenção de ordem especialmente destacada para o Leste. A base, a partir das cinco da tarde, é como uma prisão. Não se pode sair. Cada um recolhe ao seu contentor, como quem se retira no fundo da sua cela.
Temos civis de todas as nacionalidades, homens e mulheres relativamente jovens. O chefe da segurança é português. Um oficial distinto da PSP.
Além de não haver nenhum tipo de distracção, e da comida ser sempre à base da lata, falta a àgua. Só está disponível três horas por dia. Quem volta à base depois de horas no mato, tem que esperar até que chegue o horário do abastecimento.
Os militares são do Gana. Eram para ser 850 e temos apenas um pouco mais de 200. Disse ao General Ganês que isto tem que ser resolvido sem demora. Diz-me que assim será em Outubro. Não podemos estar a contar com as tropas de um determinado país e depois só ter uma pequena parte do prometido. Este é um dos problemas das operações de manutenção de paz.
São, no entanto, muito dedicados. Demoram a arrancar mas quando o fazem, empenham-se.
De Farchana a Paris viaja-se do passado para o pós-moderno. Assim é o mundo de hoje.
Copyright V. Ângelo
Quem tem algum poder político-administrativo, na pobreza que é o nosso país, tende a ser arbitrário, clubista e amigo da onça.
Falando de animais, as hienas são muitas e os ossos são poucos.
O oportunismo é a principal linha de orientação de muitos dos que nos administram, aos mais variados níveis.
Como esta garça africana, que agora passou a viver no meu jardim de N'Djaména, convém estar sempre de olhos bem abertos.
A reflexão desta semana na revista VISÃO é sobre a Assembleia-geral das Nações Unidas. Na altura da abertura da sessão anual, faço uma série de comentários sobre as questões mais importantes da agenda deste ano.
Também comento a pobreza de ideias dos dirigentes dos países mais ricos. Falo, em poucas palavras, do G 20.
Foi um texto escrito no meio de muitas outras tarefas. Espero que a escrita não denuncie muito a correria em que tenho andado.
http://aeiou.visao.pt/vias-diplomaticas=f530382
O leitor dirá.
Ontem foi um dia agitado. Primeiro, foi a viagem para Abéché. O jacto é rápido, mas estreito e com sete passageiros fica muito cheio. 'A chegada, primeiro telefonema na linha de urgência: um dos nossos aviões sem piloto acabara de se estatelar em Goz Beida. Trata-se de um modelo militar, com cerca de um metro ou pouco mais de comprimento, umas câmaras. Mas a primeira notícia foi que "...um avião havia caído."
Felizmente que é bem mais pequeno e muito mais barato do que um 747...
Mesmo assim, custa caro e causou agitação, chamadas telefónicas da presidência da república, do governador, do chefe que é general, de jornalistas...Podia ter caído em cima de muita coisa. Pessoas, casas, vacas, cabras, mesmo ums meras galinhas. Tivémos sorte. Foi esmagar-se perto do quintal do governador local, mas sem outros estragos. Embora pequeno, faz mossa. Mas a maior mossa foi a perda deste aparelho que tanto jeito nos faz, quando se trata de tirar umas fotos dos rapazes maus...
Depois, um dos nossos veículos foi atacado à mão armada em Farchana, no mercado da localidade, nas barbas de toda a gente. Passavam cinco minutos das 11 horas. Como era um carro da equipa de desminagem, tinha explosivos e outras pequenas maravilhas a bordo. Dois homens de metralhadora em punho, bandidos das terras bravas, levaram-no para o Sudão. As autoridades fronteiriças sudanesas colaboraram connosco e o veículo foi recuperado, já do outro lado da raia. O Leonardo, um grande oficial da PSP que é o nosso chefe de segurança na região, organizou uma expedição. Para recuperar a máquina e os bens. Assim acontecerá, mas é preciso ter paciência.
Seguiu-se a reunião com as ONGs internacionais. Para falar do medo que começa a existir, face à possibilidade de raptos. Uma grande nacionalidade ocidental é particularmente visada. Corre o boato, aqui e no Darfur, que esse país paga resgates...Logo, é um bom negócio apanhar gente com esse passaporte...
Continuei o dia tendo um encontro com os guardas prisionais. Ou melhor, com os nossos conselheiros em matéria de prisões. As condições de detenção são abomináveis. Os presos passam o dia acorrentados, para que não se escapem. Mesmo assim, muitos acabam por fugir. Só não precisam de ser guardados os prisioneiros que sabem que se voltarem para a sociedade serão eliminados pelos familiares das suas vítimas. Prisioneiros assim sentem-se em segurança nas prisões desta terra.
Seguiram-se reuniões sobre os direitos humanos, a questão do recrutamento de mulheres para a polícia, os soldados nepaleses que chegaram com armas mas sem munições, os soldados que estão destinados a ser uma força de intervenção rápida e que vieram equipados como se fossem meros sentinelas, o planeamento da transferência de um campo de 28 000 refugiados da zona da fronteira para uma outra localização.
Finalmente, chegou a hora de voltar a N'Djaména. Mais 800 quilómetros de distância a percorrer. No que seria para muitos um fim de dia bem preenchido. Mas não. Na capital, havia outras matérias à espera. Falar com Nova Iorque, enviar o telegrama das actividades do dia, ver em que ponto está a investigação para apanhar uns tipos que gostam de dar uns tiros de metralhadora nos trabalhadores humanitários, falar para Bangui, ver se os embaixadores do Conselho de Segurança sempre podem visitar o Leste em Outubro, etc, etc.
Mais tarde, passar ainda, cinco minutos, por uma recepção, só para marcar presença. E provar o vinho branco.
Chegar finalmente a casa, responder a uns mails, telefonar para o estrangeiro, preparar o blog, ler os jornais do dia.
Há dias piores.
Fotos copyright V. Ângelo
Homens do deserto.
Andar perdido no deserto, ou na vida política portuguesa. Qual é a diferença?
O assessor de imprensa desempenhou ontem a tarefa de mensageiro. Levou o recado do chefe. Para um jornal amigo. Para alimentar a fogueira da intriga política contra o adversário com quem finge manter uma relação institucional correcta.
O mesmo assessor de imprensa desempenhou hoje uma outra importante tarefa. Serviu de fusível político. Quando a temperatura aumentou em demasia, o chefe fez saltar o fusível. Assim, evitou queimar-se. Sai apenas chamuscado. Pelo menos, assim o pensa.
Enquanto houver fusíveis e dinheiro para a luz, Portugal vai pretendendo que as instituições funcionam. É uma democracia de alta voltagem.
Ou de alta tensão.
Mas, no meio de tudo isto, quem anda às escuras são os que vivem com rendimentos de pobreza.
Depois das asfixias democráticas e agora, das sociais, temos a impressão que os nossos líderes políticos sofrem de uma séria asfixia mental.
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