Domingo de Páscoa. A minha rua está vazia. Como se tratava de um fim-de-semana prolongado, os vizinhos saíram da cidade. Fico uma vez mais com a impressão que nesta rua não há crise. Há, isso sim, um grande interesse pelos dias feriados. Como se a vida quotidiana fosse um mero compasso de espera, entre períodos de lazer. Nisto, a Europa é muito diferente dos Estados Unidos, para já não falar da China. Na América há menos feriados, férias anuais mais curtas, menos pontes.
E existe também uma outra grande diferença: neste país onde me encontro, quem chega aos 65 anos é obrigado a parar e a ir para a reforma. Não pode, excepto em casos muito excepcionais, continuar a exercer uma actividade laboral remunerada. Nos Estados Unidos, é frequente ver pessoas de idade avançada ainda a trabalhar. O sistema de reformas não é tão generoso como o europeu.
Afinal, o “mundo global desenvolvido” tem muitas disparidades. O que nos parece ser a verdade absoluta é visto por outros de um modo bem diferente. É bom pensar nisso.
A cidade, situada a cerca de 30 quilómetros a Leste de Bruxelas, tem crescido muito na última década, em termos populacionais. Lovaina é hoje, para além da universidade e dos centros de investigação que a ela estão ligados, uma aglomeração com uma economia diversificada. Tem, por exemplo, uma das melhores redes de pesquisa biomédica. É, igualmente, uma atracção turística importante, que tem sabido explorar o património cultural e fazer das actividades ligadas à cultura uma fonte de emprego e de rendimentos. Por outro lado, uma percentagem significativa dos seus habitantes trabalha em Bruxelas ou nos arredores da capital. Não é apenas uma questão de proximidade. Lovaina tem sabido apostar na promoção do bilinguismo – flamengo e francês –, o que é um trunfo vital para se conseguir alguns dos melhores empregos na região. Sem contar, claro, com a fluência de muitos em inglês e de vários em alemão.
Lovaina tem também uma das mais densas redes de radares de controlo de velocidade e de passagem por sinais vermelhos. A disciplina cívica é, aliás, uma das marcas da cidade. É uma aposta política.
Olhar para Portugal a partir de uma cidade com sucesso é inspirador. Lembra-nos o que faz – e como se faz – a riqueza de uma população: através do investimento nas indústrias do conhecimento, na investigação científica ligada às indústrias de ponta, nos serviços de qualidade, no turismo que sabe valorizar o passado e criar manifestações culturais viradas para os gostos do presente, nas línguas estrangeiras e numa cidadania responsável.
O fulano que diz que a solução dos nossos problemas se resume “a deixar de escavar o buraco em que nos encontramos” ganharia em passar uns dias em Lovaina, como estudioso de política. Entenderia, então, uma filosofia política do desenvolvimento que dá frutos. Haverá outras, claro. Mas esta já nos ajuda a pensar em muitas coisas que nos poderiam dar jeito.
A cimeira dos BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – teve lugar ontem e hoje em Durban, a cidade sul-africana que vive virada para o Oceano Índico. Também hoje escrevoo um texto na Visão que saiu ao público e está nas bancas deste esta manhã.
O texto ainda não está publicado on-line. Mas pode ser lido através do seguinte link:
Alguém me dizia hoje que as economias europeias têm que se habituar a viver com um nível de desemprego estrutural elevado. Acrescentava que a competição entre os países europeus e entre a Europa e o resto do mundo implica mais deslocalizações de unidades económicas e mais perdas de postos de trabalho pouco ou nada especializados. E rematava dizendo que os novos níveis de desemprego serão insustentáveis, do ponto de vista da segurança social e dos subsídios.
Ou seja, a mensagem era que estamos a viver um processo de transformação radical e não damos suficiente atenção aos indicadores de tendência, nem somos capazes de repensar o nosso modelo económico de maneira a poder responder aos desafios de um mundo cada vez mais global.
Retorqui apenas o que já tenho dito várias vezes: se estivesse no poder, a minha preocupação número um seria a do emprego. Sem cair na asneira de dizer que cabe aos governos criar emprego, diria, no entanto, que é da responsabilidade primeira de quem governa criar as condições para que sejam criados postos de trabalho. Acrescentando, em seguida, que o emprego é um desafio que diz respeito a todos. E que começa por um sistema educativo moderno, eficiente e disciplinado.
Se houvesse um Prémio Europeu da Estupidez, o ministro das Finanças da Holanda, que é igualmente presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, seria um candidato destacado, com imensas condições para o ganhar.
Membro do Partido Trabalhista (Socialista) da Holanda, ministro há quatro meses, pouco percebe de finanças públicas e nada de assuntos europeus. Mas é um moralista radical à moda holandesa, que foi alimentado nos preconceitos tradicionais, particularmente contra os “latinos da Europa”.
Também não entende que dizer que o programa imposto a Chipre passa a ser o modelo para o futuro é uma afirmação de graves consequências para a confiança dos mercados nos sistemas bancários dos países europeus que atravessam dificuldades financeiras. Disse-o, numa entrevista de hoje à Reuters e ao Financial Times. Depois, e com os mercados a vir por aí abaixo, alguém lhe deve ter puxado as orelhas – terá sido a Tia Ângela? – e o cretino foi obrigado a emitir, através dos serviços de imprensa do Conselho Europeu, um comunicado a dizer que cada país é um caso e que Chipre não abriu nenhum precedente.
Ele também não abriu qualquer precedente, pois imbecis é gente que não falta nos corredores de Bruxelas.
Se eu fosse o Presidente da república de um Portugal a sério não admitiria que membros do Conselho de Estado tivessem loja aberta como comentadores políticos avençados nas televisões e nos jornais. Veria nisso uma contradição inaceitável entre o estatuto de Conselheiro e o de caceteiro político.
Basta percorrer a lista dos Conselheiros actuais e ver quantos são comentadores políticos para se perceber que as instituições da República não são levadas a sério em Portugal.
Os canais televisivos portugueses encontraram uma maneira barata de encher espaço: o recurso em série a comentadores políticos, cujos programas enchem horas de programação, a um preço muito em conta. Não creio que haja na Europa uma situação similar.
E como existe muita concorrência entre os opinantes do ecrã, a melhor maneira de se afirmarem e ancorarem nas televisões que os albergam passa pelo recurso ao exagero e ao sentencioso.