Sobre os desafios de segurança
Segurança: mais um teste à unidade europeia
Victor Ângelo
Em Bruxelas, depois de vários dias de alerta máximo, a segurança é o tema que predomina. Quase não se fala noutra coisa, nas ruas e nos gabinetes das instituições. A presença de polícias e militares um pouco por toda a parte dá ainda maior visibilidade à questão. E a evidência é que há menos gente nas ruas e nos lugares públicos, sem contar que vários centros comerciais da capital continuam fechados, quatro dias depois do anúncio do estado de alerta máximo. No metropolitano, reina o silêncio. As pessoas olham-se e fecham-se no seu canto. O receio pode ter dado lugar à apreensão. A atmosfera da capital da Europa ficou mais cinzenta.
Do outro lado da fronteira, em França, temos agora uma situação de exceção, por um período incrivelmente longo de três meses. É, em certa medida, uma situação estranha, em que o excecional passou a ser a nova normalidade. Para além do excesso de exceção, fica a interrogação se três meses não querem dizer que o assunto é mais grave do que aquilo que nós, que não temos as informações todas, possamos imaginar. Ou será um golpe político, para mostrar que se é um bom cabo-de-guerra, um chefe que poderá assim ter mais hipóteses de ser reeleito? A verdade é que há homens armados por todos os lados. Dir-se-ia, se os tempos estivessem para ironias, que os uniformes de combate parecem ser o novo grito da moda francesa.
Mais a norte, no Reino Unido, acaba de ser aprovado um novo orçamento de defesa, que permitirá às forças armadas gastar em equipamento, nos próximos dez anos, 178 mil milhões de libras, uma enorme quantidade de dinheiro. A justificação dada pelo primeiro-ministro britânico assentou nos recentes acontecimentos em Paris e em Bruxelas, bem como nos atentados que têm ocorrido aqui e acolá, fora da Europa, enfim, na necessidade de reforçar a segurança nacional. Mas estará certo investir preferencialmente na defesa, quando o desafio parece ser, acima de tudo, uma matéria de polícia?
E um pouco por toda a parte, os extremistas xenófobos tentam ligar o islão e os fluxos migratórios ao clima atual de insegurança. Trata-se, como o leitor sabe, de uma ligação incorreta. Mas que dá frutos. Todos os analistas que estudam a opinião pública, sobretudo no centro e no norte da Europa, nos dizem que a rejeição dos cidadãos de fé islâmica e a recusa da aceitação de refugiados estão a ganhar terreno. Veremos que resultados sairão das próximas sondagens aos europeus. Em meados do ano, à volta de 40% dos cidadãos da Alemanha, Dinamarca, Finlândia, França, Noruega, Reino Unido e Suécia tinham uma opinião negativa sobre os muçulmanos, um valor que só era ultrapassado pela perceção sobre os ciganos, que ultrapassava os 50% de negatividade.
A verdade é que a UE está agora confrontada com novos desafios de segurança. E que é preciso que haja um debate coletivo sobre o assunto, e uma resposta comum. A segurança é uma das obrigações essenciais dos Estados de direito. Mas, no caso europeu e tendo em conta a interdependência entre os países, as respostas nacionais, país por país, só resultarão se estiverem integradas num conjunto coerente e aceite por todos os Estados membros. É preciso uma liderança europeia para uma questão que atinge a todos.
A liderança deve começar pela afirmação da primazia dos valores da liberdade, da tolerância, dos direitos humanos e da inclusão social. Salvaguardar esses valores, bem como a integridade física dos cidadãos e os seus bens, são os objetivos fundamentais de uma política integrada de segurança.
Haverá quem, no interior da UE e fora dela, procure sabotar esses objetivos e destruir a coesão europeia. Se o tentar fazer de modo violento, terá que se confrontar com a ação das forças e serviços que têm como função garantir a tranquilidade das pessoas. Mas esses serviços, para poderem ser mais eficazes, precisam de trabalhar num quadro de colaboração mais estreito e mais franco que o atual. É fundamental passar a um nível superior de cooperação entre os serviços nacionais de inteligência e de polícia. Em simultâneo, há que rever as funções da EUROPOL. Se assim acontecer, o que neste momento infelizmente ainda não é uma certeza, estaremos então a caminhar no sentido certo.
(Publicado hoje na Visão online)
.