De vez em quando é preciso sair da Europa, do nosso cantinho, para que não nos esqueçamos que o mundo é bem maior do que as nossas preocupações. Ir à Índia, por exemplo, é como passar uns tempos noutro planeta. Mas um planeta que tem uns seres vivos parecidos connosco.
Os aeroportos regionais belgas têm capacidades reduzidas. Servem apenas para voos europeus e para as companhias de custo reduzido.
Nestes dias pós-crise, o aeroporto de Dusseldorf é uma das alternativas para quem vive em Bruxelas e tem que viajar longo curso. E nem está muito longe, é como ir de Lisboa comer um leitão à Bairrada.
Dusseldorf é uma placa giratória importante. É o terceiro aeroporto da Alemanha, em termos de movimento de aviões e passageiros. Mas é antes de tudo, um aeroporto alemão. Digo isto, depois de ter andado à briga com a página internet do aeroporto, que se recusava a reagir se os dados não eram entrados na versão em alemão. Havia uma página em inglês, é verdade, mas com pouca interactividade. E também depois de passar algum tempo a tentar mudar uma reserva no estacionamento do aeroporto. Tive que telefonar duas ou três vezes, até conseguir apanhar alguém que me pudesse responder em inglês. E partir daí, foi tudo tratado com celeridade.
Fiquei a pensar que quando o país é grande, a economia, mesmo quando se trata de uma empresa ou instituição com uma componente externa forte, está antes de tudo virada para o mercado interno.
Bruxelas continua a viver ao ralenti. O choque foi extremamente violento. Recuperar leva algum tempo. Mas os cidadãos têm sabido manter a serenidade.
Ontem, por exemplo, fui ao teatro, como estava previsto há bastante tempo. A sala estava quase cheia, poucos foram os que tiveram receio e preferiram ficar em casa.
Ora, o teatro, uma instituição muito conhecida, com três peças a correrem cada serão, está situado num bairro marcadamente “estrangeiro”, quase inteiramente muçulmano, Saint Josse, para quem conhece Bruxelas.
Uma boa parte dos espectadores são pessoas de “uma certa idade”, gente que já tem muita experiência da reforma, muitos anos de pensionista. Lá estavam, ontem, como das outras vezes. E os mais jovens também.
Eu olhava para aquela grande sala, e pensava na tragédia que seria se alguém resolvesse lançar alguma coisa no meio daquela gente. É difícil não pensar assim. Estamos todos obcecados pelas hipóteses de mais atentados.
Mas, no final, a vida continua e o espectáculo não pode parar.
Esta sim, esta é que é a normalidade. O terrorismo não é nem nunca será a normalidade, nem nova nem velha. É uma aberração de doentes e criminosos.
Esta semana, o meu plano era escrever sobre as ameaças terroristas. Parecia-me lógico, no seguimento das operações policiais de há dias, aqui em Bruxelas, que levaram à detenção do homem mais procurado na Europa, Salah Abdeslam, o bombista de Paris que resolvera não fazer detonar a sua cintura de explosivos. E ainda ontem, no meu programa semanal sobre assuntos europeus, produzido para a Rádio TDM de Macau, tive a oportunidade de referir que seriam de prever novos atentados, nos próximos tempos. Não apenas por causa da captura de Salah, que parece disposto a abrir a boca e a contar umas coisas, que serão certamente de grande interesse para a polícia, mas também porque o famigerado Estado Islâmico está cada vez mais acossado. Quando isso acontece, a sua liderança gosta de lançar a confusão noutras terras, nomeadamente na Europa.
Não imaginava eu que essa possibilidade de mais atos de terror iria materializar-se tão cedo, ou seja, hoje, ao começo do dia de trabalho nesta cidade que se tornou uma pequena loucura de movimento de gentes e de viaturas nas horas de ponta. O aeroporto nacional, por volta das oito da manhã, de semana, está sempre num rodopio, gente que chega e que sai, muitos em viagens curtas, com regresso ao fim do dia, para ir assistir a uma reunião aqui e acolá. Também o faço muitas vezes. Bruxelas está geograficamente, e não apenas politicamente, no centro da Europa, e o aeroporto é uma placa giratória importante, muita gente jovem e outros no auge da vida ativa a chegar e a partir ao começo do dia.
Quem decidiu colocar as três bombas no aeroporto, a essa hora, sabia que essa ação teria um efeito máximo. Uma vez mais, o inimigo mostrou capacidade de planeamento e de escolha dos alvos de maior impacto político, mediático e, desta vez, económico.
E mostrou mais. Ao decidir fazer explodir, uma hora e picos depois, uma outra bomba na estação do metropolitano de Maelbeek, em pleno coração do distrito europeu e numa altura de muita passagem de pessoas, fez-nos lembrar que a união dos europeus, o projeto comum, é um alvo. Enfraquecer a UE, pôr em causa a sua imagem e, acima de tudo, a sua capacidade de resposta em matéria de segurança, interessa a muita gente, e seguramente aos terroristas do Estado Islâmico.
E alguns idiotas do Brexit também. É verdade e fiquei chocado. Houve logo quem aproveitasse, no Reino Unido, e tentasse tirar partido dos trágicos acontecimentos de Bruxelas para fazer uma vez mais campanha pelo Não, pela saída da UE, dizendo que Bruxelas e a Europa não são terras seguras.
São, sim senhor. Foi aliás isso que disse a muitos dos meus amigos, espalhados por vários cantos do mundo, que me telefonaram para perguntar se eu estava são e salvo. Estou, sim. Abalado, preocupado, triste perante o sofrimento de tantos, mas determinado e confiante.
E estaremos todos assim, apesar do terrorismo, se mantivermos um rumo firme na cooperação europeia em matéria de segurança e de política internacional. Há aqui um desafio de liderança, mas é uma batalha que com o tempo pode ser ganha. Nestas coisas, quem perde, mais tarde ou mais cedo, são os terroristas e todos os radicais extremistas e violentos. E seríamos nós, também, se entrássemos em pânico.
(Texto que acabo de publicar na Visão on line sobre os dramáticos acontecimentos de hoje em Bruxelas)
A banca portuguesa está em crise. Já várias vezes aqui o disse. Há demasiados bancos, poucas oportunidades de negócios, e muito compadrio. O compadrio tem favorecido uma elite que gira à volta das personalidades que controlam o sector e levado a más decisões comerciais, a um volume elevado de créditos malparados, e, nalguns casos bem conhecidos, à falência de bancos, a falcatruas e à corrupção.
O sector precisa de uma reforma profunda, incluindo consolidação e profissionalismo, com base nas regras do mercado e da competitividade. Não se salva com falsos arremedos patrioteiros, com os manifestos do pessoal de Aljubarrota, como agora parece ser o caso, ou as profissões de fé de outros retrógrados, nem com a manutenção dos mesmos indivíduos à frente das instituições.
Teria tudo a ganhar com uma maior internacionalização dos seus capitais e dos quadros. Por isso, o interesse de bancos estrangeiros deve ser aceite de bom agrado. Faz parte do dinamismo dos mercados.
Estamos na Europa e integrados numa certa maneira de ver as relações económicas.
É verdade que uma boa parte do interesse pelos bancos portugueses vem do vizinho do lado. Também isso é normal. Conhece melhor o nosso tecido económico que outros, vindos de mais longe.
E não nos podemos esquecer do que é evidente: se o capital espanhol investir em Portugal é para ganhar dinheiro. Só o ganhará se conseguir fazer trabalhar os nossos bancos a sério. Ou seja, se conseguir que a nossa actividade bancária esteja na verdade ao serviço da economia e das famílias portuguesas.
A solução proposta pelos ministros dos Negócios Estrangeiros da CPLP, em resposta à surpresa causada por Portugal, é má.
Portugal queria ter um cidadão seu como Secretário-Executivo da CPLP, a partir de Julho deste ano. E invocava o princípio da rotatividade. Depois de Moçambique, que ocupa actualmente o cargo, seria a vez de ter um luso à frente da comunidade.
Os países africanos – e não só, pois o Brasil também via a coisa dessa maneira – achavam que Portugal deveria prescindir do lugar, porque a sede da CPLP está em Lisboa. É uma maneira de ver defensável. Assim acontece com o Commonwealth e com a Francophonie, entre outras. É, além disso, boa política quando o país que colonizou não reivindica a direcção de uma estrutura que tem sabores do passado.
Nesse caso, o futuro patrão deveria vir de São Tomé e Príncipe. São Tomé até já tinha um candidato na calha. E beneficiava do apoio de Angola, nomeadamente.
A reivindicação portuguesa veio criar confusão na CPLP, numa altura em que a organização precisa de consenso, para acertar numa visão estratégica que faça sentido, e que Portugal pede apoio para outras coisas, inclusivamente para a candidatura de António Guterres às Nações Unidas.
E a confusão aumentou com a solução encontrada. Normalmente, o Secretário-Executivo é eleito por dois mandatos, de dois anos cada. Ou seja, espera poder estar à frente da instituição o tempo suficiente para levar a cabo uma agenda proactiva e renovadora. Quatro anos é um mínimo, neste tipo de situações, para obter resultados consistentes. Agora, com o acordo manco e aparvalhadamente salomónico que foi aprovado pelos ministros, vamos ter um líder por dois anos apenas. É um período de tempo manifestamente insuficiente. Em dois anos pouco se pode fazer. É apenas uma passagem. A curta duração do mandato, por outro lado, enfraquece o Secretário-Executivo. Isto quando tudo recomenda que a posição seja fortalecida.
Enfim, trapalhadas de amadores e desinteresses de gente que não acredita na CPLP.
As incríveis trapalhadas da Presidente Dilma Rousseff e de Lula da Silva têm um impacto muito negativo sobre a imagem internacional do Brasil. E, por tabela, sobre a da América Latina.
A verdade é que vários países do Sul do continente americano conhecem convulsões políticas de monta. As profundas divisões sociais têm-se traduzido em sérias crises políticas e em muita demagogia. E na América Central impera a violência e as violações dos direitos humanos. Entretanto, a pobreza e a falta de esperança ficam por resolver.
A decisão de Vladimir Putin, que põe termo a uma boa parte das operações militares russas na Síria, deve ser vista com bons olhos. É verdade que surpreendeu mesmo os que sempre estão bem informados, como é o caso da Administração dos EUA. É igualmente um facto que pode suscitar diferentes interpretações sobre os seus motivos. Nesta fase, ainda é cedo para entender as razões mais profundas. A experiência aconselha-nos uma certa prudência, quando se trata de procurar interpretar as ações deste líder.
E não vale a pena estar a especular. Para já, deve-se proceder a uma leitura mais linear, que se focalize nos factos e nas consequências mais aparentes. Vejo os seguintes, que enumero de modo resumido.
O Presidente russo mostrou uma vez mais que sabe de estratégia. A surpresa, a oportunidade do momento e a rapidez da execução são elementos fundamentais de uma decisão de grande impacto. Putin fez o inesperado, pela positiva, justificou a sua tomada de posição com base no sucesso da campanha militar, teve em conta a data – o dia do início das negociações de Genebra e do quinto aniversário do conflito – e mandou proceder à retirada das forças com efeitos imediatos e de modo visível.
Ao revelar, uma vez mais, que sabe de estratégia, lembrou-nos igualmente que é um líder indispensável na cena internacional. A sua posição, enquanto interlocutor na resolução de crises, sai reforçada. O estatuto de grande potência, que é uma preocupação maior em Moscovo, ficou confirmado. E deve deixar-nos a matutar, neste lado da Europa, sobre a necessidade de rever o nosso relacionamento com Moscovo, e sem mais demoras.
A encenação foi entretanto obra de mestre. Nestas jogadas, a teatralização conta muito. E funcionou. A mensagem não podia ser mais clara. Ao convocar os ministros dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, e o da Defesa, Sergei Shoigu, e ao pretender que lhes estava a dar a conhecer a ordem, tudo em direto, perante as câmaras de televisão, Putin quis não só mostrar quem manda na Rússia, como também que se entendesse que a partir de agora a ênfase deverá ser posta nos esforços diplomáticos. As armas fizeram o que tinham que fazer, passemos então à fase do diálogo.
Assim ficou claro que Genebra é para levar a sério. E que foi a Rússia, mais do que qualquer outro estado, quem criou as condições para que isso aconteça e para que o processo se passe agora no quadro das Nações Unidas. O apoio da Rússia à ONU marca pontos, dá peso, incluindo no que respeita à escolha do próximo Secretário-geral.
Enviou também uma mensagem política muito forte a Bashar al-Assad. O Presidente sírio poderá estar hoje numa posição mais sólida, em termos das discussões sobre o futuro, mas tem que aceitar uma solução de compromisso. Putin faz-lhe ver que não há outra alternativa. É verdade que as diferentes oposições estão enfraquecidas, sobretudo depois de vários meses de bombardeamentos russos. Têm, no entanto, que ser reconhecidas e aceites pelas autoridades de Damasco como interlocutores legítimos e atores fundamentais num processo de estabilização e de transformação política. Os únicos que devem ficar de fora e continuar a ser combatidos são os terroristas do Daesh, que gostam de se intitular Estado Islâmico, e os ligados à Al-Qaeda.
Nada disto nos garante que se chegue a um acordo em Genebra. Abre, todavia, uma réstia de esperança, que tanta falta faz depois de cinco anos de guerra e sofrimento.
Vladimir Putin voltou a surpreender mesmo os mais atentos. Escrevi hoje sobre isso e espero que o texto esteja disponível amanhã. Uma das conclusões que tiro é que uma vez mais o Presidente russo mostrou ser um estratega de primeira linha. Outra, é que temos que repensar muito a sério a nossa relação política com Putin. O homem não é um amador e nós não podemos tratá-lo com base em análises superficiais. Ora, é isso que tem estado a acontecer, nomeadamente em Bruxelas.
BCE : a bazuca de Draghi; as medidas anunciadas a 10 de março de 2016
QE (Quantative Easing) mensal que passa de 60 para 80 mil milhões de euros.
Taxas de juro negativas para incentivar os bancos a emprestar dinheiro para investimentos e consumo.
Compra por parte do BCE de obrigações emitidas pelas empresas com um rating de crédito alto; uma medida inesperada.
O BCE está preocupado em estimular o crescimento económico, em financiar a economia.
Mas o problema é que o quadro macroeconómico de negócios não é favorável:
os impostos e a pressão fiscal são altos
a regulamentação das empresas é demasiado apertada e afecta a sua competividade em relação a actores económicos baseados fora da UE
com a globalização, os grandes grupos económicos preferem investir fora da UE
os bancos têm muito crédito malparado e poucas oportunidades de negócios; há demasiados bancos na UE, no conjunto da UE; continuamos a pensar em termos nacionais, na “nossa banca” que é preciso proteger; os nossos políticos, um pouco por toda a parte, deveriam adquirir uma visão europeia do sistema bancário e ser capazes de a defender
falta emprego e estabilidade o que tem um impacto sobre o consumo das famílias; as famílias adoptam uma aitude de prudência em relação a novos consumos, sobretudo por muitas delas já estarem com um nível de dívidas pesado
Mais ainda, o Euro precisa de baixar de valor, a taxa de câmbio deveria estar entre USD 1,05-1,08 por cada Euro.