O link acima abre o meu texto de hoje no Diário de Notícias.
A mensagem fundamental é que o combate à pandemia deve ser global, incluir todos os que tenham meios para nele participar. Os países do G7, ao tentarem excluir a China e a Rússia de um processo coordenado de vacinação nos países mais pobres, estão a cometer um grande erro. Um erro que tem duas frentes: torna mais lenta e menos eficaz a imunização de todos; e não aproveita uma oportunidade de estabelecer uma plataforma de cooperação com essas duas potências.
No final, perdem os povos que precisam e perderão os ocidentais,em termos de presença no mundo. A China, em particular, não vai esperar por nós. Irá fazer, sozinha, a sua diplomacia com base em campanhas de vacinação em África e noutras partes do globo.
Em frente à minha varanda, do outro lado da avenida, existe uma praça de táxis. No passado, as viaturas permaneciam pouco no estacionamento. Chegavam, juntavam-se mais uma ou duas, e rapidamente seguiam viagem. O tempo de paragem era curto. Agora, forma-se uma fila que nunca mais acaba e passam horas à espera do serviço que não aparece. É difícil, ao ver tantas viaturas sem movimento, não concluir que a cidade está mais ou menos parada. É igualmente impossível não pensar nas consequências económicas e sociais de tudo isto.
Para cúmulo, os meus amigos de Évora publicam fotos do centro da cidade, sem que se veja vivalma. E quem fala comigo ao telefone, diz-me que na sua zona pouco ou nada mexe. E acrescentam que muitos andam deprimidos, à espera da vacina e dos dias de sol. Infelizmente, não posso prometer nem uma nem a outra.
Deve ser do confinamento prolongado, mas noto que várias pessoas conhecidas estão a ficar mais intolerantes. Quando falam de política ou de personalidades públicas, nas áreas da política e da intervenção social, perdem facilmente o equilíbrio. Os comentários que emitem são mais radicais, mais definitivos, mais ofensivos também.
Creio que é altura de lembrar a todos que os passeios higiénicos não estão proibidos. É bom apanhar vento no rosto e refrescar os olhos e a cabeça.
Não podemos deixar que a pandemia nos torne mais extremistas. Um país de extremistas e de gentes de ideias feitas é um país que não está bem consigo próprio.
O Primeiro-Ministro fez hoje uma intervenção, por videoconferência, na cimeira dos cinco países do Sahel que procuram, juntos, responder aos problemas do terrorismo e da violência na região. Falou porque Portugal ocupa a presidência rotativa da União Europeia. Foi uma comunicação breve, de pouco mais de sete minutos, diplomaticamente acertada. Foi uma oportunidade de pôr em evidência o interesse que Portugal tem pela região.
O problema é que estas cimeiras públicas não vão direitas aos problemas. Mesmo quando se faz referência às questões de contexto, que estão na base destas crises, a referência é feita de passagem, sem as interrogações que deveriam provocar um debate a sério. Cada discurso é apenas isso, um discurso, e depois cada um vai à sua vida e tudo continua na mesma. Ou seja, no caso do Sahel, muito mal, quer para os que sofrem os ataques quer ainda para os seis milhões de pessoas que foram empurradas para a pobreza e os dois milhões de deslocados, tudo por causa da insegurança, da falta de respeito pelos direitos humanos e pela indiferença que os líderes manifestam em relação aos cidadãos mais fracos.
Elon Musk investiu 1,5 mil milhões de dólares americanos em Bitcoins. Contrariamente ao que muitos pensam, o dinheiro não era dele, mas sim da empresa Tesla. É verdade que ele é o rosto da empresa. Fundou-a com mais quatro associados e tem presidido ao seu desenvolvimento, de uma maneira espectacular. O dinheiro fazia parte do cash de Tesla, que poderia ter sido distribuído aos accionistas e, em parte, utilizado para novos projectos. Ao comprar Bitcoins, e apesar do anúncio que um dia será possível comprar uma viatura Tesla com essa cripto moeda – um dia não é amanhã – Musk contribuiu para aumentar o carácter essencialmente especulativo do Bitcoin e nada mais. Poderá vir a ganhar alguns bons cobres com essa decisão, ou talvez não, que as criptos são extremamente voláteis. Mas veio acima de tudo levantar outras questões, como por exemplo qual será o futuro das moedas cripto. A questão mais importante é, no entanto e na minha opinião, sobre o poder imenso que estes ultra ricos têm. Uma decisão deles, por muito estranha e incompreensível que possa parecer, pesa de modo excepcional na realidade que vivemos cada dia que passa.
O meu texto sobre o Sahel levou alguns leitores a consultar a internet, para perceberem melhor que região é essa. Fico contente por ter despertado essa curiosidade. Mas queria acrescentar algo sobre as populações do Sahel. São, em geral, gentes com um grande sentido de dignidade e uma enorme capacidade para sobreviver em condições bastante adversas. Viver em zonas áridas, no limite do grande deserto do Saará não é fácil. Mas as pessoas desenvolveram, ao longo de muitos séculos, estratégias de sobrevivência. Vivem com imensas dificuldades, mas vivem. Não podem, no entanto, sobreviver se os líderes políticos e militares forem corruptos e se a violência dos bandos armados não for controlada. Essa era uma das mensagens do meu texto.
Uma outra mensagem é para lembrar que temos de ter um conhecimento maior do mundo que está ao pé da nossa porta. Não podemos concentrar a nossa atenção apenas no que se passa na nossa paróquia. Temos interesses que vão muito além desse território limitado que é o que os nossos olhos vêem todos os dias. Outros europeus agem assim. Nós não podemos ficar para trás.
Os comentários e os silêncios que se têm seguido ao falecimento do Tenente-Coronel Marcelino da Mata vieram mostrar que certos líderes portugueses ainda não conseguem ter o distanciamento suficiente que lhes permita olhar para a história colonial portuguesa com um mínimo de serenidade. Isto, apesar de já terem passado quase cinquenta anos sobre o fim do período colonial.
Entretanto, ficou notado que o TCor. Marcelino da Mata recebeu as mais altas condecorações que existem no quadro das honras do Estado concedidas por feitos heróicos praticados por cidadãos portugueses.
Como era de esperar, o Senado norte-americano não reuniu um número suficiente de votos para condenar o antigo presidente, que era obviamente culpado de instigação à violência e à subversão da ordem democrática. Os acontecimentos de 6 de janeiro e todo o cenário de falsidades e i insurreição que fora criado antes tiveram um responsável.
Independentemente do julgamento partidário de hoje, ficará o julgamento da história. Esse não será suave. E fica ainda aberta a possibilidade de procedimentos criminais contra o ex-presidente. Esta última possibilidade é muito real. Creio que acontecerá.
O voto de hoje fecha um capítulo. Mas não encerra um processo de responsabilização. Antes pelo contrário. Creio que deixou a porta claramente aberta para que tal venha a acontecer.
Vamos continuar confinados por mais e mais semanas. E com duas grandes ameaças: a falta de vacinas, com quantidades muito abaixo do que fora esperado; e o aparecimento de novas estirpes da pandemia, que poderão ser mais contagiosas e resistentes às vacinas disponíveis. A estas ameaças junta-se o impacto negativo de tudo isto sobre a economia. Por muito que se
diga, para menorizar a dimensão desse impacto, a verdade é que a economia está a trabalhar a meio gás. Sectores importantes continuam fechados e sem perspectivas de voltar a abrir nos próximos tempos. Por muita folga que a economia possa ter – que não tem – a realidade é que estamos a construir uma crise.
Na verdade, ninguém sabe ainda quando tempo irá durar este período de excepção. Há quem diga que o último trimestre do ano já será melhor, mais próximo do normal. Esta é uma suposição e nada mais, neste momento.
Entretanto, é fundamental aproveitar todas as vacinas disponíveis. A vacina russa, se se confirmar a sua eficácia, não deve ser excluída. Não há nenhuma outra razão para excluir excepto as razões científicas. A única prioridade é vacinar o maior número de pessoas tão rapidamente quanto possível. Ligada a esta prioridade está a questão da credibilidade de cada uma das vacinas disponíveis. É preciso manter a confiança das pessoas nas vacinas. Não se deve esquecer essa dimensão.