Ficou-se agora a saber que os serviços secretos de inteligência das forças armadas dinamarquesas ajudaram os americanos, até 2014, a ter acesso e a espiar todo o tipo de comunicações de Angela Merkel e de outros dirigentes alemães, franceses, noruegueses e suecos. Ou seja, um país da União Europeia conspirou contra outros Estados-membros, incluindo os vizinhos nórdicos e os dois países mais poderosos da UE.
Dirão que se trata de factos já antigos, que agora é tudo limpo. Acredito que o governo dinamarquês tenha posto um termo a isto. Mas fico com dúvidas sobre o que os serviços americanos andam a fazer em relação aos dirigentes europeus.
Isto mostra, mais ainda, que quem controla os cabos e os sistemas de comunicação consegue saber tudo sobre os alvos que tenha escolhido. Assim, a discussão sobre a segurança cibernética e, em particular, sobre quem vai fornecer os sistemas 5G, é mais necessária do que nunca.
Muitas das informações recolhidas nunca são devidamente ou mesmo, minimamente, exploradas. Mas as relacionadas com gente chave são passadas a pente fino.
Entretanto lembrei-me dos meus tempos na Tanzânia, quando andava a tratar da falsificação dos resultados das eleições presidenciais em Zanzibar. Um dos meus interlocutores quase diários era o Vice-Presidente da República. Quando me reunia com ele, o VP fazia sempre questão de responder a questões que eu havia discutido, “confidencialmente”, com os embaixadores ocidentais. O VP estava a par de tudo, embora nada tivesse transpirado. O sistema de escutas e de espionagem funcionava bem. Depois da resposta que me dava, eu pegava na matéria e argumentava com ele, como se o assunto tivesse sido posto em cima da mesa durante o nosso encontro. Nunca lhe perguntei como sabia de conversas em que não havia participado. Mas fui tirando proveito da espionagem, para lhe dar a conhecer o que preocupava os principais parceiros da Tanzânia. Assim, não precisava de o confrontar directamente com factos muito sérios. Ele é que os punha em cima da mesa.
O meu texto desta sexta-feira, no Diário de Notícias, despertou muita atenção, não apenas porque Lukashenko continua a ser um vilão actual, mas também por ter mostrado que vários regimes têm uma política de perseguição dos seus oponentes residentes no estrangeiro. Um dos casos pouco conhecidos é o do Ruanda. O Presidente Paul Kagame, a quem reconheço o mérito de haver unificado e desenvolvido o país, persegue activamente os seus inimigos, dentro e fora de portas. Incluindo os pobres refugiados ruandeses que vivem em campos no vizinho Uganda.
O texto também fez surgir algumas objecções. Particularmente dos meus amigos que olham para Lukashenko e vêem nele o que ele não é, uma espécie de sobrevivente dos ideais comunistas. Parece impossível, mas é verdade, um crente é um crente e vê aparições da sua fé mesmo nos bigodes de Lukashenko. Por isso, uma crónica como a minha é vista com umas lentes especiais, que fazem ler o que lá não está escrito. A prosa era sobre a democracia e sobre os direitos e as liberdades fundamentais. Também sobre o respeito pelas normas internacionais. Ou seja, uma série de coisas que o ditador viola sistematicamente, para a grande infelicidade do povo da Bielorrússia.
Entretanto, o neofascista da velha guarda foi passar o fim-de-semana a Sochi, na estância balnear que é tanto do agrado do seu amigo Vladimir Putin. E seguiu-se uma série de imagens de ambos, a andar de barco, a conviver, a mostrar a paixão que os anima. A mensagem fundamental de tudo isso é clara: Lukashenko tem a protecção de Putin, não pensem em tocar-lhe.
Neste dia internacional das operações de paz, é justo fazer referência à contribuição dos militares, polícias e civis para a resolução de conflitos, sob a égide do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Certos países têm contribuído e continuam a contribuir com numerosos contingentes. E alguns deles, prestam um serviço excepcional à causa da paz, aceitando missões extremamente arriscadas e sem imporem à ONU condições de operacionalidade que outros exigem e que, na realidade, dificultam a execução das operações.
As operações de paz clamam há anos por um novo quadro de princípios. Ban Ki-moon tentou, ainda em 2015, fazer a reforma do sector. Mas, por várias razões, a reforma não avançou. Desde então, países como a França impuseram uma certa maneira de encarar as operações de paz, que está em contradição com várias lições aprendidas e com a visão dos países que mais tropas e polícias põem à disposição da ONU.
A timidez reinante agora em Nova Iorque decidiu não levantar a questão da reforma desta dimensão fundamental das Nações Unidas. Os Estados mais fortes definem a política e maneira de agir. E as missões prolongam-se no terreno, muitas vezes sem uma análise correcta do que seria necessário fazer.
Claro que nada disto retira, a cada homem e mulher que está no terreno, o seu valor. E é esse valor que hoje deve ser lembrado.
Como fui o único português que comandou operações de paz – na Serra Leoa, no Chade e na República Centro-africana – vejo o dia como uma jornada de homenagem e de luta pela paz. Mas amanhã é preciso voltar a falar da reforma das operações de paz da ONU.
Este é o link que permite ler o meu texto de hoje no Diário de Notícias. E que abre a polémica...
Cito, de seguida, o primeiro parágrafo desse texto.
"Para alguns Estados, a repressão dos dissidentes não conhece nem limites nem fronteiras. Vale tudo, quando alguém é considerado inimigo do regime. Mesmo quando vive no estrangeiro, convencido que está mais seguro. Pode, todavia, não estar, se for considerado pelos criminosos que controlam o poder no seu país de origem como um alvo a abater. Certas ditaduras têm um braço repressivo muito longo. Não têm pejo de agir em terra alheia e de praticar assassinatos, raptos, ou proceder a acusações frívolas ou sem fundamento, de modo a forçar a Interpol a emitir avisos internacionais de captura e repatriamento. Noutros casos, intimidam brutalmente os membros da família que ficaram no país, com o objetivo de calar o opositor que se encontra noutras latitudes."
Alexander Lukashenko, o ditador da Bielorrússia, fez hoje uma série de declarações públicas sobre o acto de pirataria aérea que cometeu no domingo. Claro que, para ele, foi um acto justificado. Só que a justificação que apresenta é uma mentira. Para além disso, mostrou-se furioso em relação à União Europeia. Revelou, assim, que as medidas adoptadas contra ele e o seu regime o preocupam. Espero que continue preocupado.
Por cá, os dias também têm a sua dose de confusão. O Congresso do MEL – Movimento Europa e Liberdade – deu uma valente contribuição ao turvar das águas políticas. Uns, foram lá com o objectivo de reabilitar o Estado Novo. Chegaram, mesmo, a fazer o elogio de Salazar. Outros, foram lá por vaidade pessoal. Não podem dizer que não quando lhe prometem um palco. E depois, apareceu o Rui Rio, a dizer que ele e o seu PSD não são das Direitas.
Fiquei a pensar que a pandemia e o confinamento têm como efeito secundário uma certa divagação política.
Temos novamente uma situação política anómala no Mali, com a detenção pelos militares do Presidente e do Primeiro-Ministro. Ambos haviam decidido, durante o fim-de-semana, proceder a uma remodelação do governo que entrara em funções após o golpe de Estado de Agosto. Ambos os golpes, o de então e de agora, foram organizados pelo mesmo grupo de oficiais.
Esta situação acaba por ter um impacto sobre a presença de várias missões – ONU e UE – no país. Deixa várias questões no ar. Quem não consegue entender-se, ao nível da direcção política nacional, não está preparado para tirar proveito da ajuda internacional. E quem decide, em Bruxelas, Paris, Nova Iorque ou noutras capitais, tem que se interrogar se vale a pena ajudar quem anda perdido numa grande confusão política.
O regime de Alexander Lukashenko é um governo dirigido por um criminoso e administrado pela clique que ainda não saiu da mentalidade soviética. Ontem, Lukashenko deu mais um passo na direcção do abismo, ao organizar uma operação de pirataria aérea contra um voo civil, que viajava entre duas capitais da União Europeia. Foi um passo de gigante, um acto de terrorismo de Estado, inadmissível.
A resposta dos líderes da UE tem de ser tão forte e clara quanto possível. Uma reacção fraca e confusa seria um tiro nos pés, para os europeus, e um incentivo para praticar mais crimes, por parte de Lukashenko. E já começou, este serão, com a proibição de voos para a Europa da companhia oficial da Bielorrússia, e com a interdição, para as companhias aéreas da UE de sobrevoar o espaço desse país.
Mas é preciso mais e sem demoras. Devem ser adoptadas medidas políticas, diplomáticas e económicas. E a companhia aérea visada deve introduzir uma queixa formal, num tribunal europeu – em Vilnius, por exemplo – contra Lukashenko e o chefe das operações de controlo aéreo da Bielorrússia. É fundamental que eles saibam que são considerados suspeitos de crimes contra a segurança de um avião civil e de desvio – hijacking – de uma aeronave.
O criminoso que manda na Bielorrússia desafiou os líderes europeus. Estes têm de saber responder ao desafio.
Hoje, ao longo do Tejo, entre o Padrão dos Descobrimentos e a Torre de Belém, já se viam mais turistas. Não são muitos, mas para quem não descortinava ninguém, há duas ou três semanas, o pequeno número nota-se e é bem bem-vindo. Alguns dos vendedores de rua, os habituais, também já voltaram a entrar em acção. Vendem pouco mais do que nada, segundo me dizem, mas voltaram optimistas, depois de uma longa pausa sem poderem meter as bugigangas nas mãos dos turistas. O seu grande receio é que Lisboa venha a conhecer um novo pico, que seria desastroso por coincidir com a época do verão.
Também houve filas, este fim-de-semana, à porta dos pastéis de Belém. Isso não acontecia há meses.
De um modo geral, os visitantes estrangeiros que aparecem são casais jovens. O turista da terceira idade, muito frequente nesta altura do ano, ainda não dá sinais de vida.
E o parque de autocarros frente ao Mosteiro dos Jerónimos continua tão vazio como durante toda a pandemia. Não há grupos nem visitas guiadas. Os motoristas de autocarros e os guias devem estar a viver grandes dificuldades.
Os condutores Uber estão novamente activos. A grande maioria dos seus clientes é agora o cidadão nacional. Quem continua parado são os taxistas. A crise aí é muito profunda e parece não ter fim à vista.
De resto, foi um domingo de vento. E neste momento, ninguém sabe o que o vento nos traz.
Hoje, a Alemanha decidiu impor uma quarentena de duas semanas aos viajantes provenientes do Reino Unido. Está preocupada com a incidência da nova estirpe indiana no seio da população britânica.
Entretanto, Portugal começou a receber de braços abertos turistas vindos do Reino Unido. Mostra, mais uma vez, que não há, no seio da União Europeia, um tratamento unificado da pandemia.
E a coisa pode ficar complicada, de novo, em Portugal. Depois das festas desportivas e outras comemorações, e agora com a abertura das viagens turísticas, os números estão a aumentar. Se o nível de contágios atingir o patamar critico, os países começarão a colocar o nosso na lista vermelha. Isso iria comprometer seriamente o período de férias de verão.
Nas ruas, é cada vez mais frequente ver gente sem máscara. Andam com ela no braço. Esta atitude deve ser combatida por quem tem a responsabilidade de o fazer. A ideia de que a pandemia está a ficar vencida é uma ideia que ainda pode custar caro. A nossa economia não pode fazer frente a uma nova vaga. Prudência e comportamentos cívicos deveriam continua a ser as palavras de ordem.
O link acima abre o meu texto de hoje no Diário de Notícias. E o texto abre com uma referência à cidade de Tianjin, uma metrópole portuária a 120 quilómetros a sudeste de Beijing. Há dez anos, Tianjin tinha um PIB que era pouco mais de metade do PIB português. Em 2025, terá um PIB duas vezes e meia superior ao de Portugal.
Dados assim devem fazer pensar.
A minha crónica também procura contribuir para que se pense nestas coisas.
Como de costume, cito de seguida um parágrafo do meu texto.
"O exemplo de Tianjin mostra como é importante ver o mundo com realismo. A China é um gigante imparável. Tem a seu favor a dimensão populacional, o centralismo autoritário do poder, a vontade política e o investimento maciço na ciência, na tecnologia e na aquisição de matérias-primas. Nesse contexto, que futuro pode ter Portugal, ou cada um de entre a maioria dos países europeus, na relação de forças mundial? Felizmente, existe a União Europeia. A integração produtiva e a conjugação de esforços políticos permitem aos Estados-membros ter algum peso nas relações económicas internacionais e no xadrez geopolítico. Se não houvesse mais nenhuma razão para justificar o aprofundamento da UE, esta, por si só, já seria suficiente."