O meu texto na Visão
Enquanto a Visão não disponibiliza o texto no site on line, aqui vai o meu texto, tal como o escrevi para a revista que está nas bancas desde quinta-feira. Boa leitura.
Com calma e ideias claras
Victor Ângelo
A serenidade é um bem precioso. Na política, como na vida, sobretudo perante uma situação grave. O que se tem dito e escrito, recentemente, sobre a Grécia e o euro mostra que se trata, igualmente, de um dom raro. Gente com responsabilidades de primeiro plano tem vindo a público com ideias que aumentam a confusão e criam a impressão que estamos à beira de um maremoto incontrolável. A crise grega seria uma espécie de apocalipse anunciado, com o desfecho previsto para os dias após 17 de Junho, a data das novas eleições.
Nestas circunstâncias, é preciso acalmar o jogo, combater as opiniões irresponsáveis, os cenários abissais. Repetir, a toda a hora, a predição de desastre abre as portas ao desastre. O desassossego social dá espaço aos demagogos e aos extremistas. Lá como cá, um pouco por toda a parte. Haverá certamente grandes diferenças ideológicas entre os dirigentes da extrema-esquerda europeia e os movimentos que Marine Le Pen personifica. Mas, em ambos os casos, as soluções que propõem seriam o caminho mais curto para o fim da Europa enquanto projecto comum, para o regresso aos conflitos nacionalistas e o descalabro económico.
O papel de um líder responsável é o de criar confiança. É isso que se espera de François Hollande. E de outros, incluindo de Angela Merkel, apesar de tudo, por ser impossível sair do impasse actual se a liderança alemã não estiver integrada no pelotão da frente. Seria, por outro lado, um erro de monta pensar que se pode continuar a adiar os problemas. A confiança ganha-se quando se atacam as questões de frente, de modo claro e com objectivos bem definidos. A começar pela questão da construção europeia: a fénix precisa de renascer e dar esperança aos cidadãos, assim como as instituições da comunidade precisam de reconquistar o poder perdido. Em seguida, há que reconhecer que as ameaças que contam são a estagnação económica e o desemprego, o peso das dívidas públicas e a fragilidade que caracteriza uma parte significativa dos bancos europeus. Essas são as prioridades. Essas, sim, põem em risco o nosso futuro.
Quanto à Grécia, os próximos anos vão ser muito difíceis. Não se alimentem ilusões, por favor. De imediato, independentemente das causas da crise, as opções são claras. Convém lembrá-las, sem deixar espaço para ambiguidades. Por um lado, trata-se de continuar a execução do programa de reformas estruturais aprovado há pouco mais de dois meses. Esta opção reflecte a expressão pragmática e possível da solidariedade europeia. A ambição é a de permitir, a médio prazo, um regresso à estabilidade e ao crescimento. O cumprimento das metas acordadas visa evitar que a Grécia se transforme num poço sem fundo. Cabe aos gregos mostrar, acima de tudo, que querem pôr a casa em ordem. A escolha contrária é a de dar a maioria parlamentar aos partidos que se opõem ao acordo. Nesse caso, o apoio financeiro terá que ser suspenso. Não vejo margem para um consenso político, no resto da Europa, para uma renegociação. Como consequência, a Grécia deixará de poder satisfazer os seus compromissos internacionais. Os recursos que lhe restarem deverão ser utilizados para assegurar as funções mais elementares do estado. Aqui, a preocupação é a de garantir que, mesmo pobre, não nos encontremos perante um estado falhado. Um país pobre não precisa de sair do euro, ao contrário do que por aí se repete. Nem deverá. Se saísse, seria por decisão própria. Complicaria, desta vez, profundamente, o futuro da UE.