Portas e a cabeça do pargo
Jantei uma sopa de cabeça de pargo. Isto, só por si, não seria notícia. Mas aqui em casa, em Bruxelas, no contexto luso-belga da minha família, tratou-se de um grande acontecimento. A metade belga ficou a olhar com horror para a minha preparação do repasto e, depois, para o saborear da coisa. Em dezenas de anos, nunca tinha havido um cozinhado assim.
Estava um regalo.
Após o jantar, ao ver os títulos da imprensa portuguesa, fiquei a pensar no meu peixe.
Aconteceu quando li que uns senhoritos do CDS estão a lançar a isca para que o caudilho do seu partido seja visto como presidenciável, um candidato a sério à alta magistratura. Não sei porquê, mas pouco a pouco vi o Paulo Portas transformar-se em cabeça de pargo, com uns olhos grandes e meio embaciados, como qualquer peixe que já foi fresco, uma testa alta e um ar de quem ataca tudo o que lhe passa perto da toca. Pargo Portas.
No buraco que é a política portuguesa de agora, pensar que um peixe desses tem um mínimo de autoridade para poder vir a ser, um dia, um candidato credível à presidência da república, acaba por parecer normal. Mas não é. Portas é um peixote de águas turvas. Não tem, por isso, a visão que se requer. Nem a seriedade. É, isso sim, um perito em manhas e emboscadas, como os peixes que vivem nas cavidades dos rochedos.
Depois de escrever tudo isto, fico com a impressão que irão passar mais umas décadas antes da minha próxima sopa de cabeça de pargo.