O ferro em brasa
Continuo sem entender as greves na CP.
Mas entendo quem paga os prejuízos de centenas de milhões de euros que os caminhos de ferro portugueses acumulam cada ano que passa.
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Continuo sem entender as greves na CP.
Mas entendo quem paga os prejuízos de centenas de milhões de euros que os caminhos de ferro portugueses acumulam cada ano que passa.
Esta manhã, na BBC e noutros boletins informativos internacionais, Portugal é notícia de caixa alta. Por razões da "greve geral", ou seja, pelas más razões. Apesar da greve ser apenas de alguns, a imagem que fica é que se trata da segunda grande paralisação em cerca de quatro meses.
Imagens destas não ajudam o país. Não atraem investimentos externos, que é uma das coisas que mais precisamos, nesta altura em que o capital e a poupança nacionais estão pelas ruas dos bolsos vazios.
Portugal não pode adquirir a imagem de país a evitar.
A nova direcção da CGTP-Intersindical decidiu hoje convocar uma greve geral para 22 de Marco. A outra central sindical não foi consultada nem está de acordo.
Na minha opinião, a decisão da CGTP é um erro táctico, com repercussões económicas e de imagem para o nosso país importantes. Parece, no entanto, fazer parte de uma estratégia de instrumentalização da Intersindical, como uma mera extensão de um partido político que tenta obter na rua o poder que não consegue nas urnas.
Se enveredarmos por essa via, não chegamos longe.
Discutia esta tarde o tema central que é a crise grega.
Alguém me dizia que a situação está tão má que dificilmente poderá piorar. Respondi que não é assim. Infelizmente, a queda não tem limites. Num caso como este, existe o risco de ver entrar em colapso sectores importantes da economia: a produção de energia, por exemplo, por falta de dinheiro para as peças de substituição, os sobresselentes; ou os transportes públicos, por não haver dinheiro para o combustível; a saúde, sem meios para funcionar e prestar o mínimo de cuidados; e assim sucessivamente.
Nestas situações, aprendi eu noutras terras, nunca se bate no fundo. Continuamos a perder recursos, a ver os serviços essenciais desaparecer e a miséria a agravar-se. É o caminho para a falência do Estado e da economia. Uma crise nacional.
Ontem escrevi que o país se estava a transformar num manicómio. Paulo Rangel, o eurodeputado do PSD, deve ter pensado que deveria ilustrar a minha conclusão e saiu a público, para propor a criação, veja-se bem, de um instituto que ajude os portugueses a emigrar. Claro que não estranhei a proposta, já que o homem, como sempre, já é habito, pensou que não devia ficar atrás de outros loucos que por aí andam.
O mesmo acontece agora com os maquinistas da CP. A companhia está na falência. Os ditos trabalhadores resolvem fazer três dias de greve, em cima do Natal, mais um dia de greve no Ano Novo. Vai ser preciso abrir uma ala suplementar no hospício, para acomodar esta gente toda.
Quem não anda desnorteado é o Banco Central Europeu. Fez o que deveria ter feito há tempos, mas mais vale tarde do que nunca. Colocou 489 mil milhões de euros nos bancos europeus, com um juro de 1%, para começar, por um período de três anos. Ou seja, veio dar resposta a uma questão fundamental que é a falta de liquidez nos bancos comerciais.
É de esperar que esse dinheiro seja utilizado para financiar a economia real. Seria um erro gastá-lo em obrigações do tesouro. Há que estar atento, pois esse risco existe.
Ontem não escrevi a nota diária neste blog.
Houve quem pensasse que eu tinha iniciado a greve geral, por antecipação, como aconteceu nos aeroportos.
Queria sossegar quem me lê. Não foi por motivos de paralisação ou por ter entrado em serviços mínimos. Respeito quem decide fazer greve, mas esta luta que é a minha não pára. Também não sou como aquele professor mediático que, por despeito por não ter sido escolhido para nada, pelo seu PSD, diz agora em toda a parte e a quem ainda o quer ouvir, que é a favor da greve.
Os mercados também não param.
Hoje, desvalorizaram, uma vez mais, a notação portuguesa. Deram um sinal inequívoco: a crise da economia portuguesa vai continuar a aprofundar-se. Essa é a grande questão.
Ontem, haviam dito que não a uma oferta pública de obrigações alemãs. O alarido à volta deste facto também não tem parado.
Exageros, digo eu. Os investidores não compraram dívida à Alemanha por três razões: a taxa de juro é muito baixa, quando comparada com obrigações de qualidade semelhante (AAA), disponíveis no mercado; o prazo de 10 anos é demasiado longo, num período de grandes incertezas e de mutações rápidas; finalmente, quem tem capital investe a muito curto prazo, em Espanha ou na Itália, a juros muito elevados, entrando e saindo dos mercados sem grandes demoras.
A confiança nos líderes políticos europeus também não pára de cair. Com gravíssimas repercussões económicas e sociais. Criando ondas de instabilidade e de xenofobia
Há quem diga que parar é morrer. Mas há certas paragens que nos dariam um novo alento.
No texto de ontem, deveria ter acrescentado que uma das faces da sabedoria é a de um homem velho, prudente e com experiência, e a outra, a de uma mulher jovem, cheia de esperança e de vontade de criar um mundo novo. Ficava um escrito mais completo.
Ambos teria perguntado, se há uma greve geral marcada para 24 de Novembro, por que razão houve greves parcelares, sectoriais, esta semana, aqui e acolá?
A greve geral de amanhã tem lugar no momento em que a crise na Irlanda chama a atenção internacional para Portugal e Espanha. É uma daquelas coincidências que mais valia não terem acontecido. Saber que Portugal precisa de produzir e ver o país parado, em revolta profunda, não deve ajudar muito os que, por esse mundo fora, estariam dispostos a investir algum capital nestas bandas.
Por outro lado, certas empresas, já em grandes dificuldades, vão perder mais uns cobres com a paralisação. No caso da TAP, dizem-nos que a acção laboral vai trazer um prejuízo de 4 milhões. Não sei se este número não estará exagerado. Mas, que a greve vai agravar o défice da transportadora aérea, não tenho dúvidas. E depois, quem tapa mais este buraco? Os contribuintes, claro.
Compreendo, sem qualquer tipo de ambivalência, o mal-estar e descontentamento dos cidadãos. A crise da economia portuguesa e das finanças públicas empobrece, nalguns casos, de modo drástico, uma população já pobre à partida. Sempre me considerei do lado dos que trabalham e dos que lutam contra a pobreza. A minha história de vida assim o mostra.
Mas, a greve geral, serve para quê, exactamente? Cerca de 80% dos inquiridos por um jornal diário - o Público - pensa que a greve não vai contribuir para a melhoria das condições de vida dos portugueses. É verdade que não se trata de um inquérito científico. Mas, dá um resultado curioso.
Parte da Europa está paralisada. Em greve. O desemprego, as ameaças contra os direitos sociais adquiridos, o custo de vida, os impostos, o mal-estar e o sentimento de incerteza trouxeram para a rua muita gente. É um pico, no gráfico da desgovernação, que mostra a crise em que certos países se encontram. Por culpa de quem?
Infelizmente, o horizonte está manchado por mais incertezas e mais dificuldades.
A espiral da austeridade, crise, precariedade e instabilidade social está longe de haver completado o seu ciclo. Os governos prometem cortes orçamentais e novos impostos, sem conseguirem sair do círculo fechado das ideias feitas. É preciso reestruturar as economias, apostar nas novas tecnologias, formar e reciclar os trabalhadores, melhorar os seus conhecimentos informáticos, incentivar os sectores que apostam na inovação, na criatividade, na qualidade e nos serviços à comunidade. Em vez disso, aumentam-se o impostos e corta-se o valor de certas regalias de base, que, à partida, já eram bem magras.
A OCDE referiu, há dias, quais as medidas que deveriam ser encaradas, no caso português. De uma maneira simplificada, as sugestões então avançadas equivaleriam ao arrancar de mais uns dentes como meio de resolver uma dor intensa nos queixos.
Na realidade, o que é preciso é coragem política para reorganizar a máquina do Estado. Repensar o papel do Estado.
Um caso actual é o da polícia. Ainda hoje os media nos lembravam que há uma duplicação de meios entre a GNR e a PSP. Quanto seria poupado, em termos logísticos, se se pensasse a sério na integração destas duas forças? Sem falar nos ganhos em matéria de eficiência. E não seria preciso, despedir ninguém. Antes pelo contrário: esta via permitiria dar a reforma aos agentes e guardas perto da idade limite.
Outro caso é o da reestruturação de vários ministérios, a começar pelo da agricultura, continuando na economia, passando pelo trabalho e a defesa, no que respeita ao exército, e terminando com uma revisão bem fundamentada de certos institutos públicos. Mais haveria a ganhar, se se acrescentasse a essas opções a simplificação administrativa. A desburocratização traria ganhos de eficiência para a economia e reduziria os custos. Mas estas são medidas que requerem tempo. Não são fáceis de completar no curto prazo.
Tendo em conta urgência da redução dos desequilibrios das contas públicas, para além de uns cortes mais imediatos, a única solução viável tem que ser encontrada nos vencimentos e regalias dos funcionários públicos. Não nos custos de funcionamento da administração, nem tão pouco na área da modernização e dos investimentos. Se o patrão Estado não tem meios suficientes, os empregados têm que ser realistas quanto às posses do patrão. Subsídios de férias e de Natal serão certamente candidatos a reduções excepcionais em 2011. Mas, quem vai ter a ousadia política de o propor?
Terminei agora uma longa conversa telefónica com Moçambique. A cidade de Maputo está em polvorosa, em virtude de uma greve geral contra o aumento do custo de vida. O movimento grevista é sobretudo mais pronunciado nos bairros periféricos, no caniço, como por lá se diz, e nas zonas urbanas mais perto desses bairros. A PRM (Polícia da República de Moçambique) dissera, ontem, que as manifestações não haviam seguido as formalidades de pedido de autorização. Eram, por isso ilegais. Hoje, a PRM está em força nas ruas e praças da capital e tem disparado várias vezes. Não há notícias de vítimas.
Para compreender o que se passa, teremos que ter em conta que a sociedade moçambicana é profundamente desigual. Gente muito rica vive rodeada de pessoas muito pobres. E os muito pobres são muitos. Os políticos no poder estão profundamente ligados ao sector dos negócios, de um modo pouco saudável, na maioria dos casos. Apoiam-se uns aos outros, políticos e negociantes, e vivem com requinte e luxo. Já era assim no começo dos anos 80. Agora, com a liberalização económica, é um aproveitar a olhos vistos. Quem tem poder tem randes e dólares, vive na economia internacional. ( O rand não chega às províncias, é a moeda dos ricos da capital; o dólar circula entre os que podem, no resto do país). Quem tem apenas acesso a uns poucos meticais, vive a tentar sobreviver. Mal.
Uma segunda razão liga-se ao facto de Moçambique importar da África do Sul muitos dos produtos básicos do cabaz alimentar. É incrível, mas é verdade. Batatas, cebolas, farinha de milho, tudo o que é consumido nos lares modestos das cidades, provém do outro lado da fronteira. Com o metical a flutuar em relação ao rand e com o custo de vida a subir na África do Sul, que acontece aos preços destas mercadorias, quando chegam aos mercados moçambicanos?
Tudo isto exige que se pense a sério no modelo de desenvolvimento de Moçambique.
Para já, é fundamental que a PRM se porte como uma polícia de um estado democrático.
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