A minha filha mais nova enviou-me uma fotografia das suas férias na Inglaterra. A imagem mostra-a toda embalada contra o frio e a chuva, ao lado do meu neto de dois anos, esse de botas de borracha até aos joelhos e com um impermeável que apenas lhe deixava os olhos, grandes que os tem, a descoberto. Ao lado deles, foi apanhada na fotografia, por acaso, uma criança inglesa. Essa aparece na foto com um vestido leve de verão, sem mangas e sem mais agasalhos. Fartei-me de rir e lembrei à filha que quem vive permanentemente, como ela vive, na Andaluzia, tem sempre frio no Norte da Europa.
Depois, mal tinha acabado de brincar com o contraste, resolvi sair do escritório, para ir comprar qualquer coisa para o jantar. Antes de sair, protegi-me bem, que o meu olhar rápido pela janela disse-me que lá fora estava um frio danado e mesmo, chuva. Verão em Stavanger, na costa oeste da Noruega, digo eu. Quando cheguei à rua, havia mais. Um vento forte, vindo do lado do mar. Mas mal tinha dado uns passos encontrei um colega norueguês, a passear despreocupado no centro da cidade. Estava vestido com um polo ligeiro, de manga curta, e umas calças de veraneante. Ao ver-me tão bem aconchegado, com casacão e tudo, não conseguiu fechar a boca. Disse-me: vê-se mesmo que vens de Portugal!
Ainda o ouvi dizer que o tempo até não estava mau, para quem vive em Stavanger…
Na Noruega, os funcionários públicos reformam-se aos 66 anos. E a lei prevê que um aumento progressivo desse limite etário, à medida que a esperança média de vida aumente.
Ninguém acha estranho. Estranho é, isso sim, pedir a reforma antecipada, sem que existam razões de força maior para o fazer.
Não creio que o facto de terem apenas direito a 15 minutos de paragem para o almoço possa ser considerado como razão suficiente para pensar numa antecipação da reforma...
Amanhã e Sexta-feira estarei na Noruega, no quadro da minha colaboração com o Ministério dos Negócios Estrangeiros desse país. É sempre um prazer voltar a Oslo, com a sua atmosfera bon enfant, descontraída, um ambiente em que a palavra crise não tem cabimento.
Para quem vem de Portugal, onde a crise económica é hoje uma crise de desespero e de falta de perspectivas, o contraste não pode ser maior. Estar em Oslo ajuda-nos a perceber que Portugal não pode continuar obcecado consigo próprio nem num estado de revolta permanente. Nada disso ajuda a construir o futuro. Há que acreditar nas nossas capacidades, ser tolerante em relação aos que pensam de modo diferente do nosso e ser honesto e generoso na relação com os outros. E, acima de tudo, ter uma elite que pensa no progresso colectivo e não apenas no seu proveito pessoal.
Tudo isto parece ingénuo. Mas é possível, com um outro tipo de gente à frente da política e da opinião pública. Com gente com sentido da história e não do proveito pessoal que possam tirar de uma efémera passagem pelo poder.
Hoje volto a terminar o dia falando de África. Uma amiga minha, antiga pupila do velho tutor, acaba de ser nomeada directora da cooperação com as organizações regionais africanas, no Ministério (Norueguês) dos Negócios Estrangeiros. Telefonou agora a agradecer a preparação que fiz com ela, antes da entrevista de selecção por que teve passar. A preparação foi boa e a entrevista foi decisiva. Ainda bem.
A Noruega é dos países que mais coopera com África, a título bilateral. Quer agora desenvolver a sua cooperação com a União Africana, e com as outras organizações sub-regionais, como a CEDEAO, na África Ocidental, a SADC, na África Austral, e a East African Community, à volta do Quénia e da Tanzânia. Ainda bem.
Talvez fosse altura de mandar o nosso Secretário de Estado da Cooperação dar uma volta por Oslo...Seria útil.
O fiorde em Stavanger cria um porto natural mesmo no centro da cidade. Esta fotografia, tirada este fim de tarde, mostra um barco ao lado da rua principal, a dois passos da catedral.
A água e o petróleo são as duas riquezas naturais desta terra.
Fim de dia horrível na costa da Noruega. Frio, ventoso e chuvoso, Maio ou não, a verdade é que a temperatura nos entra pelos ossos dentro.
Dizem-me que é sexta-feira à noite e que a juventude está de saída, que aqui o fim-de-semana é tempo de dar asas à liberdade e ao corpo. A verdade é que a jovem sentada à minha frente, no autocarro de regresso ao centro da cidade, estava vestida a preceito, tudo muito ligeiro e curtinho. A matar. Ai de quem lhe cair nas mãos, este serão!
Quando reparei, fiquei ainda mais gelado. Os Vikings são, de facto, um povo ousado. E prontos a enfrentar os elementos.
Está um luar magnífico, sobre o fiorde de Stavanger. Uma Lua grande, e bem cheia, foi colocada mesmo por cima das montanhas que definem o horizonte a Oeste. Um céu limpo, num dia que teve quatro estacões, Sol e neve, frio e temperaturas amenas. Um dos meus amigos noruegueses dizia que, nestas terras, é difícil acreditar no aquecimento global...Mas, era só a brincar, claro, que os noruegueses são verdadeiros cidadãos das causas mundiais. O que é, por outro lado curioso, pois não deixam de ter um espírito muito caseiro e patrioteiro.
Novamente de viagem, nem sei bem onde. Desde Domingo à noite, tem sido um sem-parar. Hoje, numa reunião com um antigo comandante da polícia da Noruega, falámos do lunático assassino que está a ser julgado em Oslo. Disse-me que o monstro esteve a menos de trinta segundos de ser abatido pela polícia, naquele dia fatídico de Julho do ano passado. Se tivesse demorado uns segundos mais a levantar os braços, teria recebido uma bala na cabeça.
O meu interlocutor acrescentou que o caso teria ficado arrumado por menos de um euro. Mas, como se rendeu e as ordens eram para que fosse capturado vivo, se possível, está agora a custar aos contribuintes noruegueses milhões de euros.
Assim funciona um estado de direito. A necessidade de salvaguardar a vida humana, mais as necessidades da investigação e a administração da justiça, tudo isto custa muito dinheiro num estado democrático. Tudo isto pesa muito, mesmo num país rico, como a Noruega. Mas é apesar de tudo, a solução que se recomenda.
Tentei, por volta das 17:00 horas, disparar umas fotografias, para ficar com umas imagens da zona mais antiga e do porto de Stavanger. Mas, nessa altura, a luminosidade já está fraca e as fotos terão que ficar para uma visita que não seja no pino do Inverno.
Stavanger é, na Noruega, a capital do petróleo. O que fora até há vinte ou trinta anos uma localidade minúscula, perdida num fiorde, apenas importante por causa do porto de águas profundas, é hoje um centro de grande actividade económica. Os arredores cresceram e encheram-se de carros e de engarrafamentos. A cidade, para além do porto, tem os hotéis e os restaurantes que servem os trabalhadores itinerantes, o vai e vem do petróleo. E algum pessoal militar, ligado às actividades da base da Aliança Atlântica.
As águas do fiorde oferecem abrigo a uma série de cisnes, patos e outras aves aquáticas, que migraram, com a chegada do gelo, do lago do centro da cidade para o mar. São cerca de duzentos metros de distância, ou seja, é uma migração que não dá para grandes voos.
De resto, há uma certa tranquilidade por toda a parte, que as receitas do petróleo foram postas num fundo público de longo prazo, a pensar nas gerações futuras. Aqui ninguém vive à custa do futuro. Os de hoje constroem o presente e o futuro.
Como seria bom dizer o mesmo noutras partes da Europa. Sobretudo hoje, com a publicação dos novos dados sobre o desemprego, estatísticas que mostram que 21,3% dos jovens da UE não têm emprego. Na Grécia (47,2%) ou em Espanha (48,7%), na Itália (31,0%), em Portugal (30,8%) e na Irlanda (29,0%), os dados são assustadores. Mas não só. Em França (23,8%), na Bélgica (20,7%), na Finlândia (19,9%), um pouco por muitos sítios, o futuro dos jovens está mal encaminhado. Essa questão deverá ser, na minha opinião, a prioridade das políticas governamentais. Tal como na Noruega, é preciso pensar no futuro transformando o presente.
Hoje teve lugar em Washington uma conferência internacional de apoio ao Sul Sudão. Este novo país, independente há menos de 6 meses, ocupa uma posição estratégica no centro de África. Possui recursos naturais muito importantes, incluindo petróleo. É um país em construção, sem infra-estruturas, sem administração pública, com enormes problemas de desenvolvimento, mas, ao mesmo tempo, com um potencial extraordinário.
A Europa foi a grande ausente da conferência. O Reino Unido, que tem ambições na região, não tem deixado espaço para a UE. Esta é uma constatação importante.
Fora da UE, a Noruega e os EUA são os parceiros por excelência do Sul Sudão. Para além destes três doadores, a Turquia é o outro interveniente de peso. Esta é a segunda constatação importante. A Turquia pesa cada vez mais em certas regiões do globo. A liderança em Ankara tem como objectivo alargar ao máximo as áreas de influência da Turquia. Estão a consegui-lo.