O que passou nos últimos dias em Boston, nos EUA, veio mostrar, uma vez mais, a importância dos circuitos de videovigilância em locais públicos. As câmaras são um instrumento fundamental no sistema de segurança nacional. Fazem hoje parte da paisagem urbana em países desenvolvidos. No continente europeu, o Reino Unido é, provavelmente, o país com maior densidade de câmaras de videovigilância.
Por outro lado, o debate que alguns procuram alimentar, opondo videovigilância a direitos fundamentais dos cidadãos, é um falso debate. Quem pode dizer que os direitos e as liberdades dos cidadãos ingleses, por exemplo, estão a ser ameaçados pelas numerosas máquinas de captação de imagens que vemos em cada canto dos lugares públicos mais frequentados?
No seminário da P.S.P. da semana passada propus a seguinte definição de Segurança Nacional:
Capacidade sistémica de protecção dos cidadãos, incluindo os seus direitos e liberdades, bem como da integridade do território, dos interesses vitais da nação, das instituições democráticas e da posição estratégica do país na comunidade das nações.
Acrescentei que a definição que proponho:
• Deve ser encarada com um sistema de capacidades, implicando vários instrumentos de poder: militares e civis, incluindo a diplomacia.
• Diz essencialmente respeito aos residentes no território nacional.
• Admite um certo grau de responsabilidade – partilhada – quanto aos cidadãos nacionais que vivem no estrangeiro.
• Necessita de um acordo amplo sobre como entender os nossos interesses vitais.
• É uma obrigação constitutiva do Estado, uma prioridade suprema.
• É um conceito “vivo”, que evolui com o tempo e que por isso precisa de ser revisto periodicamente.
Fiz uma intervenção no seminário da PSP sobre os Desafios da Segurança em Portugal. Procurei explicar o meu ponto de vista, tendo em conta a experiência de outros países europeus e as novas tendências em matéria de Segurança Nacional. A minha responsabilidade era a de apresentar um conjunto de ideias que não fossem uma mera repetição do pensamento dominante em Portugal sobre as relações entre Defesa e Segurança bem como sobre o futuro das polícias nacionais.
Como não represento nenhum interesse institucional nesta área, a minha tarefa era mais fácil. Mas há sempre quem pense que se digo isto ou aquilo é porque sou a favor de A contra B. Não será assim, no meu caso. No entanto, como essa é a prática corrente, os meus críticos pensam que eu sou como eles.
Ora, o que é preciso é proceder a uma análise serena das questões e escolher o que possa parecer a melhor opção em termos de custo - eficiência e de respeito pela legalidade constitucional. Quanto à execução dessa opção a melhor maneira é proceder a uma transição gradual da situação actual para uma nova situação, seguindo um calendário temporal razoável.
O que não se pode aceitar é a posição de que o que temos está bem e não deve ser mudado. Seria não reconhecer que as ameaças de hoje são muito diferentes das que existiam quando o sistema actual foi criado. Seria, igualmente, esquecer que o principal traço da arquitectura interna de segurança no Portugal de hoje se define por uma pluralidade de forças e serviços que ficam caros sem ganhar em eficiência. Ou seja, é uma arquitectura de capelinhas.
Voltando às questões de segurança, parece-me fundamental sublinhar que seria um erro pensar que, num país como o nosso, as respostas devem ser acima de tudo militares. A parte militar é uma componente da resposta. Tem que estar preparada, é verdade, para três dimensões fundamentais, que indico de modo resumido: a de soberania, que, no nosso caso, tem muito a ver com o mar e, também, em certa medida, com o espaço aéreo; a de protecção contra as ameaças de tipo militar, que devem ser claramente definidas; e a dimensão internacional, de projecção de Portugal no exterior. A reforma do sector da defesa deve ser feita nessas bases.
Por outro lado, existem as facetas não-militares da segurança nacional. No nosso caso, passam pela definição do papel e organização dos serviços de inteligência, pela coordenação e reorganização das polícias, pela articulação entre as polícias e os militares, bem como por uma definição clara das parcerias de segurança com os países estrangeiros do espaço político a que pertencemos. Sem esquecer, claro, que só estaremos verdadeiramente numa posição de força se a economia crescer, se modernizar e gerar as mais-valias necessárias. Com uma economia insuficiente e subdesenvolvida a nossa capacidade de financiar a segurança nacional, incluindo a defesa, ficará sempre aquém do que seria ideal. Chama-se a isso “fragilidade nacional”.
Ou seja, a problemática da nossa segurança é bem mais complexa do que parece. Não se compadece com simplificações nem com vistas unidimensionais. Preciso, isso sim, de uma reflexão diferente da que tem estado a ser efectuada. Mais compreensiva. E actual.
Acho estranho que a produção de ideias sobre questões de segurança esteja dominada, no nosso país, por um grupo de velhos militares na situação de reforma.
Não fico preocupado por se tratar de um número muito reduzido de pessoas, sempre as mesmas, embora ache que essa maneira de fazer as coisas não favorece nem torna possível o aparecimento de novas ideias, de perspectivas diferentes, que estes generais, almirantes e outras altas patentes andaram todos na mesma escola e rezam apenas por uma cartilha. Também não me aflige a mediatização que alguns desses velhos senhores procuram dar às suas intervenções públicas. Nem os jantares, como o de hoje, que organizam. Penso, até, que se trata de cidadãos com um elevado sentido de patriotismo, no sentido tradicional do conceito. Portugueses que merecem todo o respeito.
O que acho estranho é que sejam pessoas vindas da defesa, que é apenas uma faceta da segurança nacional, a ditar a agenda. E o resto?