Divagações pascais
As caminhadas quase diárias no parque perto de casa põem-me frequentemente em contacto com uma categoria especial de funcionários da comuna onde vivo. Trata-se de um corpo de vigilantes (“gardiens de la paix”) que percorre, em grupos de três ou quatro, os caminhos do parque e as ruas da localidade. Fazem-no a pé, fardados com umas vestimentas roxas, mas sem armas nem outro meio de comunicação que não seja o telemóvel.
A sua utilidade levanta muitas dúvidas. Servem para assinalar aos serviços de recolha competentes casos de lixo abandonado em lugares públicos e colocar uns folhetos nos carros dos moradores, com uns conselhos básicos sobre a segurança pública, as precauções a tomar para evitar roubos e arrombamentos, e pouco mais.
O factor dissuasor, que é um argumento utilizado pelas autoridades municipais, é insignificante. Quando muito, leva os donos dos cães que passeiam no parque, quando se apercebem ao longe que esses guardas andam pelas paragens, a prender os animais com a trela, uma regra obrigatória mas pouco cumprida.
No total, são 75 postos de trabalho, para uma população residente de cerca de 130 mil pessoas.
De início, costumava criticar o esquema, que mais não seria que uma forma hábil de dar emprego a pessoas que o não tinham. Agora, com o tempo, habituei-me a aceitar esse grupo de funcionários. Parte da minha tolerância vem do reconhecimento que muito daquilo que fazemos tem pouca utilidade social e é apenas uma maneira mais de ganhar a vida. Com alguma dignidade, que é isso que importa.
A idade também me ajuda a aceitar melhor o faz-de-conta, desde que ele se aplique apenas aos que não têm poder nem meios de sobrevivência.