O meu modelo de análise geopolítica inclui o seguimento apurado do comportamento dos investidores. Estudo as decisões de investimento que fazem, nos mercados globais ou nas economias cuja situação política estou a observar. As escolhas que os grandes fundos ou os intervenientes individuais adoptam, em termos de aplicação das suas poupanças e capitais disponíveis, dão-me uma indicação do sentimento colectivo, face às grandes incertezas políticas.
Neste momento, apesar da evolução positiva das principais bolsas, a prudência continua a ser o factor determinante na tomada de decisão de quem tem meios financeiros acima da média. Por isso, nos primeiros meses de 2019, os investimentos em obrigações e títulos semelhantes – instrumentos que oferecem a garantia que o capital inicial não será perdido – continuam a ter a preferência dos mercados. Mesmo sabendo-se que os juros e os rendimentos dessas obrigações são insignificantes. Desde Janeiro, foram aplicados assim, ao nível global, 112 mil milhões de dólares americanos. No mesmo período, os investidores retiraram do mercado de acções cerca de 90 mil milhões de dólares.
Estes números traduzem bem o clima de instabilidade geopolítica que caracteriza as relações internacionais nos dias de hoje. Quer se queira aceitar quer não, um dos factores de instabilidade deriva da imprevisibilidade da governação de Donald Trump. O outro tem que ver com as ameaças económicas que resultariam de um Brexit sem acordo. O Reino Unido é a quinta economia do globo. O grau do terramoto ligado ao Brexit terá um impacto significativo, nesse país e na União Europeia. Uma terceira dimensão tem que ver com a instabilidade existente em várias economias emergentes, produtoras de petróleo – como a Venezuela, a Líbia , a Argélia, ou os países do Golfo da Guiné – ou não. Neste último caso, o que se passa no Brasil, na África do Sul e na Turquia pesa. Como também pesa o modo como a economia chinesa irá evoluir no ano em curso.
Neste Dia Internacional da Mulher, uma referência de homenagem a todos os que lutam, homens e mulheres, para combater a violência doméstica e os mais variados tipos de violência praticados contra as mulheres e as raparigas. Também, uma menção especial para o grande desfile pela democracia que as mulheres da Argélia hoje organizaram. E à decisão do governo britânico de dar protecção diplomática a Nazanin Zaghari-Ratcliffe, uma britânica de origem iraniana, que os clérigos que controlam o poder no Irão mantêm em detenção há cerca de três anos, por razões injustificadas e inaceitáveis.
O ataque contra um campo de extracção de gás na Argélia, propriedade da BP, e o subsequente rapto de um número ainda indeterminado de estrangeiros que trabalhavam nessa base estão a deixar muitos governos profundamente preocupados. É um acontecimento de grande gravidade, que pode ter um impacto enorme no fornecimento de gás ao Sul da Europa e levar também a uma quebra significativa da produção de petróleo na Argélia e na Líbia. Pode igualmente fazer diminuir as receitas do governo da Argélia, numa altura em que a paz social é comprada todos os dias, pelos dirigentes desse país, com o dinheiro proveniente da exploração do petróleo e do gás. Se esses fundos falharem, a probabilidade de uma revolta social nas cidades argelinas é enorme.
Tudo isto precisa de ser monitorizado com muita atenção.
Escrevo na minha coluna de hoje, na Visão, sobre a Primavera Árabe, com um foco muito especial no Norte de África. Escrevo para defender duas ou três teses e combater o pessimismo e a ausência de uma visão estratégica.
Defendo que a prioridade política é, para todos, incluindo no que diz respeito à cooperação da comunidade internacional, consolidar a democracia. Isto passa pelo combate aos extremismos, embora reconheça a identidade cultural específica dos países da região e o peso relativo da religião na vida pública.
Quanto à economia, avanço a ideia que é preciso fomentar a integração económica no Norte de África. Esta será a via mais rápida para o crescimento, o bem-estar e a estabilidade dos países em causa. Defendo o estabelecimento de um mercado comum no Norte de África.
A região vai conhecer altos e baixos. Os desafios são imensos. Mas poderá ultrapassar muitas das dificuldades que existem, se mantiver uma política de respeito pelos direitos humanos e procurar incentivar um crescimento económico equilibrado.
Sei que muitos leitores pensarão que sou demasiado optimista. Talvez não seja bem assim...
Passei uma boa parte do dia a rever a situação no Norte de África.
Uma das conclusões é que Portugal deveria investir mais no seu relacionamento político e económico com Marrocos e a Argélia. Uma boa parte do futuro da região passa por esses dois países e, também, pela cooperação entre eles. Portugal poderia servir como uma plataforma na aproximação entre esses dois estados vizinhos, mas relativamente antagónicos, bem como uma ponte na triangulação dessas economias com o espaço europeu.
Este seria um bom exemplo de uma diplomacia económica mais estratégica.
Abordo, hoje, na Visão, a luta pela dignidade e pela democracia, que está a ter lugar no Norte de África e no Iémen. Faço, ao mesmo tempo, a ligação com a reunião anual de Davos, que ontem abriu as suas portas aos grandes e poderosos deste mundo.
Davos queria discutir o aparecimento de novos centros de poder. Só que os acontecimentos de agora tornam urgente discutir o poder quando a rua diz basta.
Davos pensava analisar as novas dinâmicas da geopolítica, com a crise da Europa como pano de fundo, bem como a emergência de novas potências regionais. As populações da Tunísia, da Argélia, do Egipto e do Iémen estão a transformar as relações políticas com o mundo árabe. Esse também é um novo arranjo da geopolítica, numa região que se encontra às portas da Europa.