Aposto com quem queira apostar que as regras orçamentais do Tratado de Maastricht – dívida pública abaixo dos 60% do PIB nacional e défice orçamental anual inferior a 3% − voltarão a estar em cima da mesa das discussões. E que a austeridade será um tema que os países apelidados de “frugais” irão de novo inscrever na agenda económica europeia. A chamada “bazuca” é uma oportunidade única para diminuir a distância entre os níveis de vida dos diferentes países europeus. Quem não a souber aproveitar terá perdido uma oportunidade que não voltará a surgir, a não ser que apareça uma crise tão profunda como a da pandemia.
Os indícios que começam a aparecer mostram que, em matéria económica, entraremos, depois da pandemia, numa fase nacionalista.
Na Grécia, o Partido Syriza ganhou a batalha da austeridade mas perdeu hoje na luta pelos votos dos eleitores. Amanhã haverá um novo Primeiro Ministro, o líder da Nova Democracia, Kyriakos Mitsotakis.
A Nova Democracia é o rótulo do partido do centro-direita. Veremos o que consegue fazer, num país que precisa urgentemente de investimentos e de criação de emprego, enquanto prossegue o programa financeiro que Tsipras assinou com a União Europeia. Não vai ser fácil cumprir as promessas feitas durante a campanha eleitoral. A esperança que surgiu hoje poderá murchar muito rapidamente.
Entretanto, seria apropriado deixar um palavra de apreço pelo trabalho feito por Tsipras. Alguns dirão que traiu a causa popular que o levara ao poder. A verdade é que mostrou uma boa dose de realismo político. A política é a arte do possível, como todos sabemos. Foi o que ele tentou mostrar.
Países foram tratados de modo diferente, segundo uma auditoria do tribunal de Contas Europeu, que analisou os os programas de resgaste da Hungria, Letónia, Roménia, Irlanda e Portugal
O programa de Portugal foi o mais exigente em termos de reformas e condições: 7 áreas; no caso irlandês, 2 áreas
Caso português: reformas do de Mercado de trabalho; Liberalização da economia; Sector da saúde; Clima de negócios e competição; Justiça; Habitação
Mais o sector bancário: Regulação, Supervisão, Consolidação
Portugal com €78 mil milhões teve o maior programa de ajuda financeira
Equivalente a 46% do nosso PIB
O da Irlanda, com €67.5 mil milhões ou seja, o equivalente a 29% do PIB
Temos uma dívida quase insustentável no médio prazo; vai ser necessário muita prudência orçamental
A segunda grande preocupação da CE e dos mercados e agências de rating tem que ver com o investimento produtivo que continua a ser baixo em Portugal e sem prespectivas a prazo de vir a crescer
OGE 2016: Gov Portugal quer cortar o défice em 0,2%; Bruxelas quer 0,6% e já há meses obrigou a Espanha a fazer o mesmo
A CE não estava preparada para este tipo de programas; não tinha experiência
O mesmo com o BCE, mas o seu papel era muito mais especializado, virado para o sector bancário
Só o FMI estava tecnicamente preparado
FMI era além disso o mais objectivo e em certa medida o menos flexível
Dirigentes políticos nacionais, com voz nos secretariados partidários e na comunicação social, continuam a acreditar que existe uma “doutrina “ europeia que defende o “empobrecimento colectivo” de cidadãos dos Estados membros. Nessa versão, o que aconteceu em Portugal nos últimos anos foi a “aplicação” dessa referida “doutrina”.
Tudo isso é mera fantasia. Os países mais ricos da Europa querem, isso sim, que os restantes tenham um poder de compra mais elevado. Precisam que haja prosperidade um pouco por toda a parte da EU.
Primeiro, porque um poder de compra mais elevado faz aumentar o consumo. Ou seja, é benéfico para todos, incluindo para os países como a Alemanha que produzem muitos bens que outros compram. Quanto maior for a capacidade média aquisitiva dos portugueses, espanhóis e outros, mais bens alemães e de outros cantos da Europa se vendem.
Segundo, porque a estabilidade da União assenta na prosperidade do conjunto dos cidadãos europeus. Esta verdade é uma evidência aceite pelos principais líderes do nosso continente. Uma Europa de disparidades muito acentuadas não tem futuro, acabará por se desagregar.
Há quem responda, então, que os países mais poderosos querem que haja uma mão-de-obra barata, noutros cantos da Europa. Já terá sido assim. Agora, com a deslocalização das indústrias e dos serviços para outras partes do mundo, onde o trabalho é de facto mais mal remunerado, e onde os impostos sobre as empresas são relativamente suaves, a questão do preço da mão-de-obra europeia já não pesa o que pesava.
O que a Europa quer é trabalhadores altamente qualificados e produtivos. São as qualificações profissionais e os níveis de produtividade que fazem a diferença.
Quem anda por aí a apregoar a tal “doutrina” não sabe do que está a falar. Intervém e vê o mundo com base em slogans. É tão burro que até acredita no que repetidamente diz.
A questão grega parece ter chegado à hora da verdade. O dia foi de frenesim, o governo de Atenas apresentou novas propostas, que estão a ser analisadas. Muito depende da conclusão a que chegarem quem as está a analisar, gente da Comissão Europeia, do BCE e do FMI.
Vai ser difícil, no meu entender, que as novas proposições passem no crivo técnico. Porém, o momento é altamente político. E é possível que a política diga que sim, que abra uma janela temporária. Não sei se assim será, pois o governo da Grécia queimou muitas pontes. Diplomaticamente, a coisa tem sido um desastre. Ora, os políticos precisam de gestos diplomáticos para poder justificar, perante os seus eleitorados, qualquer decisão mais favorável. É que uma boa parte da opinião pública europeia está pouco inclinada para o lado grego.
Veremos amanhã à noite qual será o novo capítulo de todo este drama bem confuso em que a Europa e sobretudo a Grécia, se encontram.
Os resultados das eleições gregas não tiveram impacto nos mercados bolsistas europeus. Em termos da economia europeia, a Grécia tem agora um peso marginal. Já não estamos em 2011. Nessa altura, muitos dos grandes bancos privados da Europa tinham níveis de exposição elevados à dívida pública grega. As coisas mudaram.
Ao nível do impacto político, o discurso oficial foi hoje muito prudente, nas principais capitais da UE. Ninguém quer ser acusado de extremismo, perante um resultado eleitoral claro. Mas, mais, ninguém quer abrir o jogo e revelar as cartas, para já. Assim, as palavras que vão surgindo, em Bruxelas e noutras cidades, deixam a porta aberta à iniciativa do novo governo em Atenas. Ou seja, esperam que este mostre até onde quer ir. As velhas raposas europeias sabem que esconder o jogo é meio caminho andado.
Entretanto, irão surgir certas vozes inabituais ou menos conhecidas que terão como tarefa dar uma indicação do sentido que as coisas podem tomar. A Eslováquia, por exemplo, que já disse que não pode aceitar um incremento do salário mínimo na Grécia para os 700 euros, a ser pago com o dinheiro dos outros, quando os eslovacos ganham muito menos que isso.
Vai ser um período interessante. Nada está ganho à partida.
Espero que a vitória da coligação Syriza nas eleições de hoje na Grécia - uma vitória indiscutível - permita clarificar as águas na UE, sem grandes demoras nem hesitações.
Hoje uma parte da Bélgica esteve parada. Nalguns casos, como aconteceu no aeroporto, a paragem foi total. O espaço aéreo havia sido fechado ontem à noite e só voltará a abrir às 22:00 horas de hoje.
Foi um dia de greve geral, que se fez sentir nas diferentes regiões linguísticas do país.
A maneira como foi organizada acarretou a paralisação de quase todos os sectores. Mesmo quem não queria fazer greve optou por ficar em casa, para evitar problemas de barragens de trânsito e outras confusões ligadas aos piquetes de greve. Como se costuma dizer, organização é tudo! E, hoje, a organização permitiu um impacto maior do que a participação efectiva e deliberada na greve.
As duas principais razões do movimento grevista têm que ver com a decisão do governo de não aceitar, em 2015, e apenas nesse ano, para já, que os salários sejam indexados à taxa de inflação – uma prática de indexação que existe há muitos anos e que tem ajudado a manter o poder de compra – e, segunda razão, com o aumento da idade da reforma.
Estas duas medidas transformaram-se nas bandeiras da mobilização social.
Curiosamente, os polícias não pararam hoje. Acharam que seria inoportuno estar em greve quando a ordem pública poderia precisar deles. Vão fazer, amanhã, das 07:00 às 08:30 horas uma acção sindical que é, na realidade, uma greve de zelo. Vão passar, durante essa hora, o trânsito a pente fino: documentos, controlos técnicos, extintores, tudo vai ser pretexto para reduzir a fluidez do trânsito, nesse espaço de tempo, a uma velocidade de caracol.
Depois, irão manifestar-se à frente do ministério, antes de voltar ao serviço habitual.
Entretanto, a questão se coloca é muito clara: é preciso negociar. Em democracia, tudo se deve resolver pelo diálogo.
É sabido que o governo francês – o de Hollande como também fora o caso com Sarkozy – não consegue levar a cabo a racionalização da administração pública. Se o conseguisse, pouparia uns tostões muito valiosos, o que permitiria um maior equilíbrio das muito desequilibradas finanças públicas e umas reduções na carga fiscal. E há muito por racionalizar, desde o fecho do Senado, que não serve para nada mas que consome mais de 500 milhões de euros por ano, até à reforma da administração regional e à integração das polícias num esquema mais unificado, mais eficiente e mais em conta. Estes são apenas alguns exemplos.
Hoje, Pierre-François, um amigo meu, contava-me uma história que mostra uma outra face da mesma moeda francesa. Pierre-François vive numa pequena vila de província, a umas dezenas de quilómetros de Poitiers. A repartição de finanças da terra, apinhada de funcionários que está, deveria fechar, por não se justificar haver tanto fiscal para tão poucos habitantes. Só que os funcionários não querem aviar malas e bagagens e ser transferidos para outra localidade ou mesmo para Poitiers. Assim, para mostrarem que são indispensáveis e que devem continuar na vila, inventam controlos fiscais a torto e a direito. Cada declaração de rendimentos de cada família local, cada entrada contabilística dos pequenos comércios locais está a ser varrida a pente fino e a ser contestada. Assim, as estatísticas dos controlos são empoladas e a continuação dos mangas-de-alpaca na vila parece justificar-se. É que se trata de uma vila de “fraudulentos” e de “espertos fiscais”, que precisam de ser vigiados de perto.
Moral da história: quem se lixa é povo contribuinte, lá como cá.
O México emitiu esta semana dívida pública a 100 anos. Sim, com um prazo de 100 anos. Ou seja, pediu emprestados mil milhões de libras e durante uma eternidade só terá que pagar a taxa de juro, que neste caso foi fixada em 5,75%. Já havia feito o mesmo com obrigações de Estado em dólares americanos. Com um sucesso idêntico.
Aqui está uma maneira hábil de financiar o Estado, com base nos mercados internacionais, sem onerar em demasiado as finanças públicas. É uma espécie de “reestruturação” da dívida, mas que não precisa de dizer o seu nome.