Ontem estive em Alvito, no distrito de Beja. É um concelho perdido na imensidão dos campos do Baixo Alentejo, pouco povoado – nas presidenciais de 2020, tinha pouco mais de 1.900 eleitores inscritos, tendo votado menos de 900. E como muitas localidades do interior do Alentejo, é uma terra que parou no tempo. Várias das casas grandes estão fechadas ou mesmo abandonadas e as actividades económicas não-agrícolas não existem. No domínio da agricultura, a água do Alqueva tem feito a diferença. Quem passa, vê muitas plantações novas, sobretudo de oliveiras, mas não só. Mas não se enxerga vivalma. E as estradas que levam ou fogem de Alvito estão em mau estado. Essa é, aliás, uma constante pelo distrito fora. A nacional que vem da A2 para Beja tem alturas que mais parece uma aliada das casas que vendem pneus para automóveis e das oficinas aperta-parafusos. A tão falada N2, que vem do Norte para o Sul de Portugal tem troços na zona de Ferreira do Alentejo que clamam por uma nova cobertura de alcatrão.
O lado positivo é ser-se obrigado a conduzir devagar. Devagar como a vida nestas terras.
A expansão do olival, sobretudo no Baixo-Alentejo, levanta várias questões de fundo, nomeadamente no que respeita à pressão que exerce sobre os recursos em água do Alqueva e à rentabilidade futura das explorações agrícolas, sem esquecer que a monocultura extensiva tem um impacto ambiental que não pode ser ignorado .
Entretanto, soube-se agora que o preço do azeite extra-virgem nos mercados mundiais está em baixa, este ano. Uma descida significativa. No caso de Espanha, que produz à volta de 53% do azeite mundial, a quebra no preço (medida no valor por unidades de 100 kg) é de cerca de 25%. Quanto à Itália, outro grande nome nos mercados internacionais, o decréscimo no preço ronda os 33%.
Dois factores explicam a perda de valor. Existe, em 2019, excesso de produção. Por outro lado, o mercado americano – que poderá ficar mais difícil de aceder se o Presidente avançar com a aplicação de tarifas aduaneiras ao azeite europeu, como já o ameaçou fazer – não cresce. O consumo de azeite per capita nos Estados Unidos é baixo – cerca de 10 vezes inferior ao de Portugal – e não está a crescer. Na verdade, há aqui um problema de hábitos alimentares, que pediriam uma campanha de marketing muito bem pensada.
Ou seja, este é um sector que precisa de orientação.
Passei um par de dias a conduzir pelas zonas fronteiriças que separam o Baixo Alentejo e o Algarve da província espanhola de Huelva. Ambos os lados estão a fazer um uso intensivo das reservas de água disponíveis. Não parece haver regras, nem uma visão sustentável da gestão do recurso. Primam os olivais, os laranjais, os diversos pomares, as vinhas e outras culturas, bem como uma utilização desenfreada da água para alimentar uma proliferação de piscinas e de jardins privados. As reservas freáticas e os lençóis em profundidade, que se formaram ao longo de milhões de anos, estão sob pressão frenética, por motivos comerciais e porque os novos-ricos querem que as suas residências secundárias se assemelhem às vivendas das estrelas de Hollywood. O próprio Alqueva está a ser chupado a toda a velocidade, para regar centenas de milhares de pés de oliveiras, campos de milho a perder de vista – sim, em pleno Verão, milho nas securas do Baixo Alentejo, mas que aberração – e uvas e mais uvas. A floresta tradicional, menos exigente em água, mais adaptada ao clima e às condições do solo, só sobrevive nas zonas de serra e onde se cria o porco ibérico.
A água será, nestas regiões, e noutras da Península, uma das grandes questões do futuro. E poderá vir a ser, à volta do Guadiana, uma fonte de tensão entre os dois países vizinhos. É um tema essencialmente político, que é totalmente ignorado pelos anões políticos que por aí andam.
Estou, por uns dias, numa pequena localidade do Baixo Alentejo. Sede de concelho, numa zona agrícola que se modernizou muito nos últimos anos, deixa-me uma primeiro impressão: não há sinais de crescimento populacional, de aumento do tecido urbano. Não vejo bairros novos, mas sim, casas à venda e outras que devem estar fechadas há muito. A Câmara tenta cativar os residentes mas, à primeira vista, os mais novos saíram e a pirâmide de idades inclina-se para os de maior idade. Dizem-me que não há falta de trabalho nos campos, nas novas culturas comerciais, mas quem, nos grupos etários jovens, quer trabalhar na agricultura? Aparentemente, uma parte desses trabalhadores serão imigrantes.
Este é um Alentejo que se transforma, mas que, ao mesmo tempo, fica igual para muitos dos habitantes mais avançados na idade. Tem-se escrito e falado pouco ou quase nada sobre as mudanças que estão a ocorrer. Os sociólogos passam pelo Alentejo sem o ver.