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Vistas largas

Crescemos quando abrimos horizontes

Vistas largas

Crescemos quando abrimos horizontes

A imprevisibilidade dos dias que correm

Curiosamente, este ano os melros voltaram, depois de vários anos de ausência. Tenho um casal no meu jardim, que passou o dia a construir um ninho. Muito atarefados, mas sempre com um olho posto nos gatos da vizinhança, que vêem os nossos jardins como um terreno de prática da caça.

Não sei se chegarei a conhecer os futuros ocupantes desse ninho. Em princípio, deveria mudar-me definitivamente nos primeiros dias de Abril. Uma mudança radical de vida, mais uma a juntar a muitas outras. Agora, nestes tempos de incerteza, nada é claro.

Uma das dimensões da crise é a indefinição, a impossibilidade de imaginar os dias futuros com um mínimo de probabilidade. Para quem tem as suas rotinas definidas, isso não constitui um grande problema. Mas quem anda por outros horizontes fica com a impressão que está num jogo de roleta. Apostar no imprevisível é coisa de loucos.

A vida do meus melros é diferente. Está cheia de esperanças. Mas também aí, é o acaso que pesa mais. Para aumentar as suas chances, constroem o ninho num galho mais alto. A altura traz mais segurança, quando se trata dos felinos, mas cria instabilidade, o ramo abana mais com o vento, aumentando assim o risco de queda dos pintainhos. Espero, por isso, que as próximas semanas sejam amenas. É uma aposta no factor sorte.

Tudo depende de quem conta a historieta

Um clube de raposas muito conhecido está a entrar em aflições: os galinheiros que habitualmente frequentam estão agora povoados de pele e osso. Para um predador vezeiro de bichos gordos, mesmo se engordados artificialmente, a crédito e à base de ilusões, a situação é preocupante.

 

O pior é que o futuro não parece oferecer melhores hipóteses. Só haverá mais pele e osso.

 

Assim começaria uma historieta clássica, contada, como de costume, a partir da perspectiva dos mais fortes, ardilosos e membros da confraria. 

 

E as gentes galináceas, não têm também uma fábula para contar? Uma em que não seja devoradas pelos bichos matreiros?


Gatos pardos

O blogosfera política portuguesa é um saco de gatos assanhados. Diz quem sabe que o cérebro destes animais apresenta estruturas complexas que lhes possibilita expressarem-se numa espécie de linguagem, em que dominam os miados, os ronronares, os bufos ou sopros fortes, os gritos e certas linguagens corporais, com um simbolismo simples e auto-centrado.

 

Acima de tudo, substituem a discussão de ideias por arranhadelas e sapatadas à esquerda e à direita. 

Homenagem aos políticos e às bananas

 

Copyright V. Ângelo

 

Numa aldeia com vista para o mar, a leveza dos políticos faz com que andemos todos às bananas. E ainda por cima, as cá do síto são de tamanho pequeno. Os políticos, esses, são gigantes.

Pombo mas não inteiramente parvo

O pombo da historieta do Marcel leu o meu blog sobre o fim trágico do gato e protestou. Disse-me que eu, como todos os outros, só escrevemos sobre os bichos assanhados e predadores, nunca contamos a lenda da vida do ponto de vista dos pombos. É, acrescentou, o nosso fascínio medíocre e bacoco pelo poder que nos faz viver a vida a olhar para os grandes e a esquecer as opiniões dos que esvoaçam de grão em grão, para tentar sobreviver.

 

O Zé - o pombal é feito de Zés e Marias - nunca confiou nas manhas suaves do Marcel. No passado, quando ambos eram mais novos, até lhe achava uma certa graça. Mas, confiança em gatos, como em políticos, nunca. Passou a confiar ainda menos, nos últimos tempos, quando sentiu que Marcel andava irritado e tentava abocanhar tudo o que lhe passava pela frente. Sentia que o peludo estava a atravessar uma crise, que com o tempo havia perdido o sentido das proporções e do bom senso. Era um gato cada vez mais isolado, que confundia o ensimesmamento e o valor do seu umbigo com qualidades de felino acima da média. Via-se numa classe à parte, capaz de puxar sozinho pela vida e pela sorte.

 

Não era, afinal, mais do que um pobre animal doméstico, como todos os que por aí aparecem, por muito que se julgasse um leão das savanas sem fim. 

 

O Zé fugiu ao assalto e viu, de longe, a queda para o vazio que havia de fazer sair o Marcel da narração. Pensou que, por vezes, não são os pombinhos quem paga os custos das lendas que por aí se contam.

Tragicamente optimista e confiante

Marcel sempre foi muito determinado. Quando punha os olhos num objectivo, fazia tudo e inventava o resto, para não deixar escapar a ocasião. Tinha energia e argúcia para dar e vender, o que o colocava sempre à frente dos outros. Se tivesse enveredado pela política, seria um chefe assanhado, como os que por aí andam.

 

Quando viu o pombo no bordo da varanda, não hesitou. Foi um salto bem preparado, com o optimismo de quem sabe que a presa é sua. O optimismo de quem vê um ponto mas esquece o conto. Tacticamente correcto, estrategicamente trágico.

 

O pombo já lidara com outros da mesma pinta. Salvou-se a tempo. Marcel viu-se, de repente, no vazio, cheio de força mas sem apoios.

 

Veio por aí abaixo.

 

Dizem que os gatos têm sete vidas, mas esta varanda era de um oitavo andar. Quando chegou à altura do primeiro piso, depois de embater no estendal de roupa que a vizinha do terceiro mandara instalar contra a vontade do condomínio, tinha esgotado as sete oportunidades. Havia altura a mais. São sempre os últimos metros que acabam por ser fatais.

 

Já todo desfeito por dentro, ainda teve ânimo suficiente para se arrastar até à porta da entrada do prédio. Quando se tem espírito de combatente, vai-se até ao fim, mesmo sabendo que está tudo escaqueirado. Não se dá o braço a torcer.

 

Quando o Mário, que tanta estima tinha pelo bicho, chegou ao rés-do-chão, com o coração na boca e sabedor do que iria encontrar, foi para recolher o último olhar.

 

Embora Marcel fosse um gato muito orgulhoso, não creio que o olhar tivesse as cores da vitória.

Ilusões animais

 

No dia em que o rato subiu ao poder, devido ao acaso das circunstâncias, começou a comportar-se como um leão. Ou pelo menos, a pensar que estava a agir como um verdadeiro rei da selva. Cada palavra que resmungava soava-lhe como um rugido, quando na realidade era a apenas uma irritação verbal para os outros animais das redondezas. Cada exigência que berrava, e que lhe parecia ser um direito decorrente da posição agora ocupada, era vista como mais um indicador que um roedor nunca se poderá medir com um felino puro sangue. Acentuava o ridículo da situação. E para que todas se convencessem da sua real importância, passava horas a discursar palavras impossíveis de penetrar.

A zebra, na sua sabedoria de animal que já havia escapado a leões de verdade, passava-lhe ao lado, com a calma de quem sabe que um rato, por mais ratão que queira ser, não é mais do que um pobre diabo que gostaria de ser levado a sério.

Venenos

 

O lacrau apareceu na minha casa de banho sem marcação. Foi um frente a frente inesperado. Podia ter dado para o torto. Estava a cinco minutos de me dirigir para o aeroporto, a fim de apanhar o voo dos mochos para Paris.


 

O escorpião estava imóvel, no terreno descampado que é o espaço entre a banheira e o lavatório. Convenci-me que estava morto. Um erro de apreciação grave. Tentei apanhá-lo, com um pedaço de papel, para lhe proporcionar um banho na sanita. Deu um pulo. De rabo espetado na direcção da mão que ousara tentar o contacto. Se me tivesse picado, o avião teria um lugar vago, o que teria tornado mais confortável a viagem do passageiro que estava destinado a ser o meu vizinho da noite aérea.


 

Os acidentes com este tipo de aracnídeos são frequentes nas regiões onde me movimento. As picadas causam dores intensas, febre, paralisação da área mordida. Exigem cuidados médicos especializados. São uma boa chatice. Por algum tempo.


 

Há uns quatro anos, um dos polícias portugueses, destacado na capital isolada do Norte da Serra Leoa, no burgo de Makeni, era o orgulhoso dono de um exemplar de boas dimensões. Não me lembro que nome lhe deu. Mas recordo que saía a correr da esquadra onde era conselheiro, para poder chegar a casa antes do Sol pôr, e apanhar um par de insectos, para alimentar o seu companheiro de solidão. Isto de andar em missões, longe dos amores, dos próximos e do Futebol Clube do Porto – o Chefe é um fã cerrado da Nação Portenha – tem algo que se lhe diga.


 

Já perto do fim da missão do nosso polícia, o bicho faleceu. Não sei se foi de morte natural, ou se o Chefe deu uma ajudinha – o amor é assim! Assume, por vezes, formas extremas, quando a outra alternativa é a separação. A verdade é que com a sua transição foi possível proceder ao embalsamento do nativo de Makeni.


 

Hoje, está pendurado na parede da sala de um apartamento do Grande Porto. Um quadro bem feito, digno, que honra a memória de um belo exemplar, que pertenceu a um mundo onde as picadas venenosas, embora façam doer, são feitas sem segundas intenções.

 

Um dia de calor

 

O dia de ontem terminou com uma festa de despedida. Organizada pelo pessoal da MINURCAT, os da Sede, em N´Djaména, com a participação animada de um dos melhores grupos de dança tradicional do Sul do Chade. Uns dançarinos excepcionais, que nos revelaram várias facetas das cerimónias de iniciação, que continuam vivas nestas paragens. Foi também interessante ver alguns dos nossos jovens funcionários nacionais, que normalmente andam de fato e gravata, acompanhar os ritmos, como se a música fizesse parte dos seus génes.

 

Este é um país culturalmente muito diverso. Enquanto os tambores do Sul batem com a energia da África banto, fazendo vibrar todos os poros dos que sabem viver esssas músicas, e acentuando o erotismo das florestas por explorar, os naturais do Centro e Norte mexem o corpo, lentamente, com a graça oriental das cortes dos sultões.

 

Entre os pratos tradicionais, havia uma dobrada de cabra, certamente um animal duramente experiente da vida, preparada pela minha Assistente de muitos anos, uma mulher das terras mais amenas da África Austral. Claro que tive que me servir. O resto, não digo.

 

Foi um fim de tarde quente. Durante o dia a temperatura do ar andou a namorar os 48 graus. Em Março, é assim.

 

A manhã começara com uma reunião com todos os embaixadores residentes em N'djaména. A reunião mensal, que para mim foi a última, era a oportunidade para dizer "Thank you" e passar à frente. Tudo muito correcto, sem mais. Depois, tive um longo tête-à-tête com o Presidente Idriss Deby. O encontro começou em público, com a minha condecoração com o grau de Oficial da Ordem Nacional do Chade. Um gesto raro. Uma Ordem de elite. Depois, ficámos sós, para falar sobre o Sudão, esta parte do Continente Africano, projectos, água, um tema central para as gentes do Sahel, segurança, e o futuro das Nações Unidas nestas areias. Foi um diálogo com elevação, descontraído, que as ideias são para serem confrontadas, não as pessoas.

 

Já mais tarde, à hora das orações de Sexta-feira, o Representante Especial do Presidente ofereceu-me um camelo. Lindo. Com calabaças e tudo, aparelhado a rigor. O RE, que responde pelo nome de General Dagache, quatro estrelas e muitas dunas de combate,  batalhas muitas, a morder o pó dos ventos áridos, homem com ossos e pele, mas nada mais, que o deserto não é para grandes comidas, é natural do Sahara, não muito longe do fim do mundo que é a região de fronteira com a Líbia. O camelo é a fonte da vida, nesses cantos perdidos, onde a beleza das montanhas roídas por milhões de anos de vento nos faz imaginar catedrais do surrealismo mais ousado. O camelo e água, que brota aqui e ali, nos oásis que se escondem para além das miragens.

 

O meu camelo está agora em casa, grande e majestuoso, à espera de um caixote que o leve para as terras molhadas da beira-Tejo. É uma peça de madeira que vale a pena que atravesse o deserto. 

 

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