O Presidente da República, apesar de ter um aconselhamento diplomático de primeira ordem, decidiu visitar um candidato às próximas eleições presidenciais brasileiras. Em qualquer parte do mundo, uma decisão desse tipo seria sempre vista como uma interferência no processo eleitoral do país visitado. E não poderia ser aceite. Provocaria um sério incidente diplomático.
Tratar de modo jocoso um assunto desses só pode mostrar superficialidade política e falta de sensibilidade diplomática. No caso de se tratar de um país que faz parte da nossa história colonial, como é o caso do Brasil, demonstra igualmente arrogância e uns restos de mentalidade do passado. É uma enorme falta de respeito pelas instituições do país visitado.
Também não pode ser considerada uma jogada política virada para o futuro, que parte do princípio de que o candidato da oposição irá ganhar as eleições. Quando isso acontecer, falar-se-á com ele, como o novo presidente. Entretanto, deve ser visto apenas como um candidato e como parte da política interna do Brasil. Política essa que não é da nossa conta.
A comunicação social portuguesa segue com atenção, desde sempre, o que se passa no Brasil. E os produtores de artigos de opinião gostam de comentar sobre a política brasileira. Agora, mais do que nunca, no seguimento da eleição de um político extremista à presidência do país. Muitos desses comentários seguem uma linha profundamente emotiva, como se os seus autores fossem brasileiros de gema e o país, seu.
A minha posição é diferente. Parto do princípio que cabe aos brasileiros tratar do seu futuro. Também, que existe gente nesse país com capacidade mais do que suficiente para entender o que é bom e mau para o Brasil. E que estado de direito tem um mínimo de condições para funcionar.
Mas isso não me impede de lhes lembrar que o Brasil conta na cena internacional. Que as escolhas que são feitas têm impacto além fronteiras. Seja ele de ordem política, dos direitos e dos valores humanos, ou, ainda, do tipo ambiental. Nessas áreas, não podemos ficar calados. Essas são as portas de entrada para falar, de fora, sobre o Brasil. Sobre o Brasil, na cena internacional.
Quanto ao resto, lembro apenas que o Brasil é um país extremamente diverso, desigual e com várias fracturas sociais. Cabe à sua liderança política, mas também à cultural e social, promover o diálogo nacional e procurar, de modo constante, os equilíbrios que respeitem os interesses fundamentais dos distintos segmentos da sociedade.
A liderança da sociedade brasileira será boa se promover a inclusão social. Não apenas um crescimento económico desigual. Será péssima se não respeitar os direitos de cada sector da sociedade, incluindo os das comunidades indígenas, se acentuar os conflitos de interesses e tentar resolver pela força o que deve ser resolvido pelas instituições democráticas.
Esse é o grande teste que o Brasil continua a ter pela frente.