Na conferência “Rotas de Abril”, que teve lugar ontem e hoje por iniciativa do Presidente da República, Cavaco Silva disse que, em democracia, “a cultura do compromisso é essencial”. Essa frase segue-se à constatação que fizera que “ a cultura do compromisso, que predomina na maioria dos países da União Europeia, tem tido dificuldade em instalar-se na nossa democracia”.
Não estarei muitas vezes de acordo com o desempenho político do Presidente. Acho, no entanto, que fez bem em frisar a importância do compromisso na vida política democrática. Sem compromissos não há acordos entre as diferentes correntes de opinião e sem acordos não há governação possível.
Convém também acrescentar que os compromissos nem sempre se fazem com os amigos políticos. Muitas vezes, sobretudo em alturas de crise nacional, os pactos têm que ser feitos entre adversários e, por vezes, entre inimigos.
Mas, para que isso aconteça temos que ter actores políticos à altura. Gente que seja capaz de ultrapassar os seus receios e interesses individuais e colocar o interesse nacional acima de tudo.
É isso que parece faltar hoje em Portugal.
Temos muitos que são óptimos na promoção das hostilidades entre sectores de opinião, entre correntes partidárias. Fizeram disso o seu ganha-pão. E a comunicação social dá-lhes projecção, porque o barulho e a violência vendem mais. Assim se transforme pequenez em fama, ruído em tomadas de posição sem fundamento.
Este canto do deserto, o leito de um wadi, ou seja, de um rio que só tem água umas horas ou uns dias por ano, na estação das chuvas, lembra a quem anda nestes combates que há sempre maneira de encontrar um pouco de sombra e de frescura, mesmo nos espaços mais recuados.
A vida que me conduz, sim é a vida que dita o meu dia a dia, é feita de momentos muito tensos e áridos. Trabalhar com governos em terras da lei da força é uma tarefa desgastante e, quantas vezes, ingrata. Por isso, um pouco de sombra, um pensamento mais suave, um imaginar a doçura do viver, tudo isso tem que ser saboreado sem pressas.
Fora isso, foi um dia de estratégia. Formular uma estratégia com gente esperta é um encanto. Uma campanha nos media. Um plano de transição. Uma maneira de sair do impasse. Talvez não vá muito longe. Mas mantém as portas abertas. Que é o fundamental, numa situação de conflito. Como também é fundamental não dar a entender que se perdeu a calma. A serenidade é uma arma de combate.
Voltei a escrever sobre o Afeganistão, na Visão desta semana. Contra a política do modelo único, importado do Ocidente. Contra a filosofia da força e da confrontação. A favor da mediação, dos acordos políticos, de um outro tipo de legitimidade em matéria de governação.