O Conselho de Estado reuniu-se pela segunda vez, neste novo mandato presidencial, na segunda-feira ao fim do dia. Na terça-feira, já um ou mais dos seus membros havia relatado a jornalistas amigos os pormenores do que fora discutido e quem disse o quê.
Na minha opinião, esta falta de respeito pela confidencialidade das discussões retira valor ao Conselho de Estado, que aliás já tem pouca valia. Deixa de ser um órgão onde se exprimem opiniões independentes, para benefício do Presidente da República. Assim, vai-se para o Conselho com a intenção de dizer o que convier em termos da opinião pública e da política partidária do momento. Não se estará a falar com a objectividade necessária, mas sim de pé atrás ou então a pensar na oportunidade e no impacto dos títulos que irão aparecer nos jornais.
Falta sentido de Estado, neste país.
Já pensaram no que se transformaria o Conselho de Ministros, se a moda do contar tudo pegasse também por essas bandas?
O Conselho de Estado é um mero orgão formal, que nada acrescenta de significativo à ordem constitucional existente. Um dia, quando houver condições para um debate a sério sobre uma Constituição virada para o Século XXI, esta terá que ser uma das matérias em cima da mesa. Entretanto, haverá de vez em quando uma reunião do dito Conselho, como a que agora acaba de ter lugar, sem que esses encontros acrescentem o que quer que seja à resolução dos desafios que temos pela frente.
Se eu fosse o Presidente da república de um Portugal a sério não admitiria que membros do Conselho de Estado tivessem loja aberta como comentadores políticos avençados nas televisões e nos jornais. Veria nisso uma contradição inaceitável entre o estatuto de Conselheiro e o de caceteiro político.
Basta percorrer a lista dos Conselheiros actuais e ver quantos são comentadores políticos para se perceber que as instituições da República não são levadas a sério em Portugal.
A imagem de Portugal no Norte da Europa precisa de levar um safanão.
Ainda hoje, numa breve estada na Holanda, tive oportunidade de me aperceber, uma vez mais, que a opinião sobre o nosso país não é boa. Com meias palavras, era como se se dissesse que países como Portugal deveriam abandonar o clube europeu. Seriam países que estariam a jogar numa liga que está acima das suas possibilidades.
Há aqui um papel para os nossos embaixadores nas capitais europeias. Têm que se tornar mais activos junto da opinião pública dos países onde estão afectados. Devem mostrar um Portugal diferente. Como também devem lembrar aos europeus do Norte que todos ganham com o projecto comum.
É evidente que só por si, uma campanha de informação não é suficiente. Os portugueses têm que dar provas de sentido cívico, de abertura de espírito, de empenho, seriedade e disciplina, de trabalho árduo e útil. Devem, acima de tudo, escolher líderes de melhor qualidade, capazes e dignos, gente de visão, interessada no bem comum.
Falando de escolhas, a anúncio da designação, pelo Presidente da República de um novo Conselheiro de Estado deixa-me perplexo. Por que razão terá ido Cavaco Silva buscar um homem que se tem estado a posicionar como um ideólogo da direita caceteira, um sonso que mais não é que um revanchista dum Portugal retrógrado e amargurado, um fulano de uma outra época, um político sem brilho, pirómano da política dos ataques pessoais?
Com esse tipo nomeações vamos continuar a cultivar a imagem de um Portugal baixinho e vingativo.
A VISÃO que está nas bancas escreve uma longa narrativa sobre Dias Loureiro.
A leitura atenta desse texto dá uma pequena ideia da corrupção que existe em certos círculos políticos de Portugal. E das ligações de interesses e falcatruas que existem entre a política, as secretas, as polícias de investigação criminal, os negócios e o sistema de justiça.
Tudo isto se passa com impunidade. Estamos no reino da impunidade. As instituições que deveriam investigar e julgar a corrupção na área da política não funcionam, ou por que as não deixam, ou por compadrios de interesses, ou ainda por que andam todos ao mesmo, por sítios escuros, com uma mão no saco e a outra nas curvas do prazer.
A opinião pública, por outro lado, deixa andar. Não se mobiliza. Não reage para além do cinismo individual que nos caracteriza. Temos uma opinião cívica fraca, pobre e preocupada apenas com o pão de cada dia, que cada vez é mais problemático, em verdade se diga.
Portugal faz-me pensar nalguns países do terceiro mundo onde trabalhei. Não só pela fraqueza das instituições. Também pela cultura de poder. Nesses países, passar pela cabeça de um ministério, estar no poder, era a oportunidade que o ditador dava para que se tivesse acesso a um período de enriquecimento pessoal. Quem havia sido ministro e continuava pobre, levava com um atestado de parvoíce em cima. Perdera a chance.
O diploma sobre o estatuto dos Açores é não só de constitucionalidade duvidosa, mas também politicamente leviano. A ruptura a que conduz, no que respeita à relação institucional entre o Governo e a Presidência, destabiliza o equilíbrio entre duas importantes sedes de poder.
O equilíbrio de poderes e a cooperação estratégica são indispensáveis para a convivência democrática. Mais ainda, são fundamentais numa altura em que Portugal entra numa crise económica de grande gravidade e em que a classe política está cada vez mais desacreditada pelos escândalos de corrupção, de golpes baixos e de falta de liderança capaz de responder aos desafios de uma sociedade à procura de um destino melhor.
É altura de mostrar um pouco mais de juízo e um pouco menos de arrogância das brenhas.
Cada vez é mais claro que a continuação de um certo senhor no Conselho de Estado causa profundos embaraços à instituição e ao Presidente da República. Pelo menos, entre a gente que leva estas coisas a sério, como aliás o merecem
Um comentário do antigo director da Exame, publicado no Público electrónico de hoje (Ultima hora , `as 18:40) traz à luz do dia as ligações que o senhor Conselheiro mantinha com o BPN. Como se aproveitava dos seus contactos político - partidários para tentar silenciar qualquer referência menos positiva ao banco dos seus interesses. Sentia-se bem no seu papel de guardião do bom nome de um banco que afinal estava podre, por detrás da fachada.
O Presidente não pode exonerar um Conselheiro de Estado, mesmo um que tenha sido nomeado, como este o foi, por ter a confiança política do Chefe do Estado. Nem é isso que se pede.
Seria, no entanto, da maior conveniência, para conservar um mínimo de credibilidade nos órgãos de soberania que devem funcionar como as traves mestras do regime constitucional português, que o senhor Conselheiro desse o passo que se impõe numa situação tão complexa como a presente. Ou seja, um passo para o lado, à espera que a verdade venha à tona da água.