Ontem, caminhei pelo centro histórico de Évora, coisa que não fazia há muitos anos. Na verdade, nos anos passados, sempre que voltava à terra natal era para visitar um ou outro familiar e ia diretamente para as suas casas. E como já ninguém da família mora dentro das muralhas, acabava por não entrar nas ruas que foram as minhas, passo a passo, durante as duas primeiras décadas da minha vida.
Entrei ontem e fiquei triste. A cidade estava sem movimento, várias lojas haviam fechado definitivamente as suas portas e muitos prédios apresentavam um ar cansado e miserável. Outros gritavam aos passantes o estado de abandono em que se encontram. As máquinas para o pagamento do estacionamento tinham todas o mesmo letreiro: fora de serviço.
Mesmo no exterior das muralhas havia um ar estranho, uma mistura de abandono, desleixo e de falta de meios. A estrada da Chainha, por exemplo, que era um dos meus destinos, deixou-me a impressão que há por ali quem abandone ao longo das bermas objectos que deixaram de ter valor, meio escondidos nas ervas que não são cortadas e que não são alvo de cuidados.
Digo isto, mas espero que os meus conterrâneos e amigos me venham dizer que vi mal, que me enganei na minha percepção do estado da urbe. Ficaria menos preocupado
Seria um erro não tratar do dia de hoje como domingo. Um dia para tratar da família e das nossas coisas pessoais. Nestes tempos de grande espanto, é fundamental não perder as referências habituais. Embora os dias possam parecer todos iguais, para quem está confinado, convém fazer a destrinça. Por exemplo, ao domingo, de um modo geral, não se trabalha. Com a prática do teletrabalho, há quem acabe por pegar nos assuntos todos os dias, sábados e domingos incluídos. Uma amiga minha, que há muitos anos que trabalha em casa, sempre me disse que o segredo, quando assim é, passa por se respeitar uma horário de trabalho normal e metódico. Ela tem dois números de telefone. O do trabalho vai para voice mail às 18:00 horas. Qualquer mensagem que caia depois dessa hora é ouvida e tratada na manhã seguinte. E ao fim de semana, está desligado. Se assim não fosse, acrescenta, já teria dado em doida há muito tempo. Ora, é exactamente isso que se procura evitar, para além da fuga ao vírus. Manter a cabeça normal. Não é assim tão fácil como parece. Mas é essencial. Precisamos de todos, para recuperar o país e o resto.
David Neeleman, o grande accionista privado da TAP, dá hoje uma grande entrevista ao Expresso. Entre outras coisas, fala dos atrasos sistemáticos que são a marca da casa TAP. Amigos meus, que viajam frequentemente com essa companhia aérea, queixam-se repetidamente dos atrasos dos voos.
Existem razões internas à TAP que provocam essa indisciplina em termos de respeito pelos horários. Não é apenas uma questão do funcionamento melhor ou pior do aeroporto de Lisboa. É um problema de cultura interna da companhia, que precisa de ser resolvido. Neeleman fala do assunto mas não acrescenta nenhuma solução que esteja em vista.
Da minha varanda, neste serão fresco de Domingo, o Tejo parece correr com tranquilidade. Não há grande movimento. Mesmo as ruas, entre o grande rio e a minha casa, estão relativamente silenciosas.
É altura de escrever a minha peça regular, para a revista que me acolhe. Depois de um fim-de-semana de férias em família, coisa rara, as palavras escritas têm dificuldades em encontrar o caudal habitual. As frases, depois das pessoas, parecem coisa vagas, pesadas e impenetráveis.
Tudo muito a contrastar com a calma das águas e deste lado da cidade.
Foi hoje inaugurado o hospital militar Norueguês, na nossa base militar de Abéché. Em menos de três meses, nasceu das areias do deserto de Abéché uma maravilha tecnológica.
Os militares da Noruega trabalharam de noite, para que os trabalhos de construção fossem feitos durante as horas mais frescas. Durante o dia, a temperatura ronda os 50 graus. De noite, desce para os 28. Com uma disciplina, um sentido de serviço, e uma capacidade de fazer coisas que até os Austríacos deixou pasmados.
Um povo com um forte sentido de responsabilidade faz surgir milagres das terras mais inóspitas que se possam imaginar.