Este é o link para o meu texto de hoje no Diário de Notícias. O facto de ser o último texto deste ano, deu-me a oportunidade de fazer um balanço muito sumário do que foi 2022, um ano particularmente difícil em várias partes do mundo.
Cito de seguida umas linhas deste meu texto.
"O ditador de hoje pode achar oportuno acalmar o jogo durante uns tempos. Mas um ditador é como a onça, não muda as suas pintas, e voltará amanhã a portar-se de acordo com a sua natureza. O escorpião, na velha fábula da travessia do rio às costas de um sapo, faz o mesmo: a certo ponto da viagem, acaba por picar o sapo e deitar tudo a perder por água abaixo, incluindo a sua própria vida. Por isso, sempre fui contra a negociação com os pequenos e grandes sósias de Hitler que fui encontrando pelo caminho. Não há acomodação possível com essa gente. Devem ser afastados do poder e julgados em tribunais competentes."
Facebook e Instagram, e a companhia que detém essas plataformas, foram designados pelos ditadores que estão a levar a Rússia ao abismo como sendo organizações terroristas e extremistas. Assim quem utilizar estas redes sociais na Rússia pode ser condenado por apoiar ou participar num agrupamento terrorista. De facto, a repressão da clique dirigente não tem limites. É sempre em frente, até à derrocada final.
Numa democracia, é um erro pensar que se pode enganar o eleitorado, com conversa fiada, habilidades linguísticas e medidas manhosas. As sociedades actuais devem ser tratadas com todo o respeito e franqueza.
Numa ditadura, é um erro pensar que se pode controlar eternamente os cidadãos. Essa é, aliás, a principal fraqueza dos regimes autocráticos. As ditaduras não caem por causa de intervenções exteriores. Caem porque são minadas por dentro, numa procura crescente de liberdade.
A NOS, a companhia de telecomunicações a que muitos de nós estamos “fidelizados”, resolveu comportar-se como Vladimir Putin ou Xi Jinping ou um qualquer outro ditador fascista ou comunista. Retirou a BBC World da sua grelha de canais. Sim, a BBC, que é dos raros canais de televisão internacionais que procura manter uma posição objectiva e que não poupa esforços para nos informar do que vai acontecendo no mundo.
Conto-vos a minha aventura de ontem com a NOS.
De manhã, quando notei que do canal 205 se passava directamente ao 207, saltando o 206, que correspondia à BBC World, telefonei aos serviços técnicos da NOS. Para me queixar que estava sem o 206. Do outro lado da linha, a técnica tentou ajudar-me a resolver o problema. Durante uns 15 minutos segui todos os passos que ela me indicou. Mas o problema não foi resolvido. A técnica programou de imediato uma visita domiciliária, para que a questão pudesse ser resolvida na minha casa.
Uma hora depois, abri a porta a um especialista da NOS. O homem tentou tudo e mais alguma coisa para restabelecer a minha conexão com a BBC World. Em desespero de causa, acabou por mudar a minha box e instalar uma nova. Depois, procedeu à programação da coisa. E, no final, nada de BBC World. Resolveu então telefonar para uma secção especial da NOS. E pronto. Ficou a saber que a NOS, tal como um Putin qualquer, havia apagado a BBC World da sua grelha. Mantivera Cubavisión e mais umas ligações chinesas ou venezuelanas, à la Chavez, e uns canais obscuros que ninguém vê, mas a velha e respeitável BBC tinha ido para o caixote do lixo da história da NOS.
Sim, a BBC que sobreviveu guerras e todo o tipo de censuras, em várias partes do mundo, deixou de contar para os contabilistas da NOS. Cortada.
Não quero pensar no que seria o nosso país se fosse governado pelos que apoiam – ou simplesmente desculpam – a agressão russa contra a Ucrânia. Para que isso nunca possa acontecer, é preciso denunciar o perigo para a democracia que essa gente representa – são os estalinistas e os fascistas dos nossos dias – e criar um cordão sanitário político à sua volta. Qualquer aliança política com eles deve ser firmemente combatida. Quem aparecer a propor esse tipo de aliança é um mero tolo ou então, um oportunista que não olha a meios para controlar o poder.
Na Rússia profunda, completamente dominada pela propaganda imposta pelo Kremlin, é fácil perceber que a etiqueta ou a acusação de se ser “nazi” é algo muito mau. É a memória histórica a funcionar. Não se sabe o que significa exactamente, para além da associação com o regime de Hitler e os milhões de mortos que este provocou.
Por isso, Vladimir Putin diz que a liderança ucraniana é “nazi”. É a pior coisa que poderia ser, na lembrança russa. “Nazi” nada mais significa, neste momento, do que “inimigo a abater”. E justifica-se assim a guerra de agressão contra o povo ucraniano.
Aqui entre nós, os idiotas e os neoestalinistas engoliram a expressão sem dizer ai nem ui! Como têm um vasto acesso à informação, coisa que na Rússia fascista de Putin não é possível, os nossos putinistas dão provas de uma enorme e genuína imbecilidade. Além de mostrarem as suas tendências para apoiar uma ditadura, caso tivessem oportunidade para o fazer.
Temos por cá uns cidadãos que não hesitam, perante a agressão decidida por Vladimir Putin e a falta de liberdade que existe na Rússia. Estão de unhas e dentes com o ditador. Mesmo sendo claro que este é um fascista, um xenófobo e, agora, um criminoso de guerra.
Um ou outro desses cidadãos tem um nível escolar elevado. Mas isso não os impede de se alinhar e engolir todas as patranhas que Putin e os seus inventam. A mim, parece-me incompreensível que tal possa acontecer. As teorias e narrativas criadas para justificar o injustificável saem directamente de falsas e aberrantes invenções conspiratórias. Mesmo assim, essas pessoas vão na cantiga. Na maior parte das vezes, o engodo que as leva a morder o anzol tem de ver com ataques à NATO ou aos norte-americanos. Quando o isco é desse tipo, até os peixes gordos se deixam apanhar.
Alguns desses cidadãos enviam-me textos a justificar os seus pontos de vista, ou seja, em defesa dos crimes praticados por Putin contra os seus e contra os ucranianos. Esse encaminhamento de textos deixa-me boquiaberto. Certas pessoas, que eu considerava esclarecidas, acabam por se revelar assim como amigos do fascista e admiradores dos seus métodos. E fico a pensar o que seria de Portugal se essa gente conseguisse de facto chegar ao poder.
Nada justifica a prática de crimes de guerra. Nem os erros do passado, nem a doutrina de Monroe, nem os crimes praticados por outros, nem uma só vírgula das grandes teorias estratégicas. Só um tolo ou um criminoso podem tentar justificar o injustificável.
Por outro lado, falando de sondagens de opinião e de percentagens de apoio, quero ser claro. Todas as sondagens em regimes ditatoriais traduzem a manipulação da informação, a censura e o medo da repressão. Conheci casos em que os ditadores ganhavam eleições com mais de 80% dos votos, e pouco tempo depois, quando eram derrubados, tinham o país todo na rua a festejar e a pedir a morte do ditador, que pouco tempo antes estava convencido – ou procurava convencer o seu povo – que tinha o apoio de quase todos.
A agressão russa contra o povo da Ucrânia atingiu hoje um nível ainda mais horrendo. Estamos agora na fase dos crimes de guerra em série e da destruição em massa de bairros urbanos. Mariupol ficará na história como a Guernica da era contemporânea. E a destruição urbana será vista como uma repetição dos crimes praticados pelos russos na Síria e na Chechénia.
Esta nova fase exige medidas drásticas, do ponto de vista económico e financeiro, contra a Rússia. Pede igualmente que se insista junto dos grandes países do mundo para que condenem os crimes que estão a ser praticados na Ucrânia.
É possível que medidas económicas e financeiras não sejam suficientes. A exigência absoluta já não é apenas fazer parar a guerra. Os actos praticados pelo regime de Vladimir Putin mostram que é preciso acabar com esse regime, que representa um perigo excepcional, por causa do armamento nuclear, para a paz e a segurança da Europa e de outras nações, bem para além do espaço europeu.
A ditadura comunista cubana condenou hoje 127 pessoas que se haviam manifestado contra o governo e a miséria de vida a 11 de julho de 2021. Muitos desses manifestantes provocaram desacatos, como acontece em quase todas as manifestações de rua, sobretudo quando as condições de vida se tornaram insuportáveis e a falta de liberdade asfixiante. O que não é normal nem de modo algum aceitável é o rigor das penas. Só um regime à beira da falência condena manifestantes a dezenas de anos de prisão efectiva, como agora aconteceu. No total, as penas aplicadas somam 1916 anos de prisão. 19 pessoas foram condenadas a penas que vão dos 15 aos 30 anos de detenção.
Não se pode ficar em silêncio perante um regime assim. Como também não se fica em silêncio quando se trata de condenar o embargo americano a Cuba.