O texto que hoje publico na Visão volta a reflectir sobre o divórcio que existe entre os dirigentes políticos da Europa e os cidadãos.
Escrevo, também, sobre a falta de coragem de quem é pago, e bem, para a ter e que, no topo das instituições europeias, prefere ficar calado. Essa "timidez" tem levado a uma marginalização progressiva das principais figuras comunitárias. A sua relevância politica é cada vez menor.
Estou em fim de viagem, mas, mesmo assim, quero dizer, alto e bom som, que a Comissão Europeia e os ministros dos Negócios Estrangeiros europeus estão todos, face à crise humanitária na fronteira entre a Líbia e a Tunísia, a dar a impressão de andarem a apanhar bonés.
Aquela conversa bonita, muito intelectual, cheia de referências a estratégias, que de vez em quando ouvimos, é só para disfarçar a incompetência.
Uma vergonha.
Uma grande falta de sentido de responsabilidades e de coragem política.
Passei o dia a andar de um lado para o outro, em Bruxelas. A cidade está cada vez mais internacional, diriam os que vivem à volta das instituições europeias. Mais pubs, mais europeus do Norte, mais inglês a ser falado nas ruas, nos restaurantes, nos escritórios, até mesmo nas consultas hospitalares. Mais recursos financeiros, poder de compra. Mas quem vive nos bairros mais afastados da zona UE vê as coisas de outra maneira. Pensa em termos de véu integral, de bairros imigrantes, do Islão que se torna cada dia mais visível, dos africanos que fazem barulho nas ruas, das gentes que não têm um ar local. Descurtina pobreza, violência e insegurança. O cidadão sente que a cidade se transformou numa torre de Babel, numa selva estranha. A cidade passa a ser uma aglomeração de ghetos, em que cada identidade procura refúgio no seu bairro e aí encontra força para recusar os outros. É uma caracteristica nova, que se está a tornar frequente em certas urbes desta parte da Europa.
A crise global internacional levou ao apagamento da Comissão Europeia. Bruxelas não tem voz na matéria, cada estado membro faz as coisas 'a sua maneira, e o senhor que se considera muito importante passou a ser apenas uma sombra do Presidente Nicolas Sarkozy, uma espécie de acompanhante de luxo, apenas uma figura cheia de corpo presente.
Tudo isto augura dias maus para a construção europeia e pode levar a uma crise séria do Euro.
Depois da cimeira dos dirigentes da zona Euro, que foi dominada pelas ideias de um político que não pertence 'a zona e que ate' agora estava em processo de evaporação política no seu próprio país -- Gordon Brown --, as bolsas voltaram a entrar em terreno positivo.
As questões fundamentais da crise não foram resolvidas. Os bancos não recuperaram a credibilidade de que necessitam, os seus dirigentes continuam a ser os mesmos que levaram o sistema 'a falência, as famílias não adquiriram novos meios para combater o endividamento excessivo em que se encontram, o ciclo produtivo continua a abrandar em virtude do excesso de oferta, mas os doidos da bolsa aproveitaram o ar quente que veio de Paris para despender dinheiro na bolsa.
Espero muito sinceramente que não se arrependam, nos próximos dias.
O Presidente da França, ao convocar hoje uma cimeira sobre a crise financeira, e apenas convidar quatro países europeus, deu uma estocada muita profunda na unidade da União Europeia.
Numa altura em que era preciso evitar tentativas de solução unilaterais, país por país, o encontro de Paris começou por excluir a maior parte dos estados da União e acabou sem nenhum acordo significativo entre o pequeno número de presentes.
Já a Irlanda, uns dias antes, havia tomado uma decisão nacional contrária ao espírito que deve presidir 'a construção da Europa. Decidira proteger os bancos irlandeses em oposição aos outros bancos europeus que operam no seu território.
Agora, o homem de Paris deu aquilo que poderá ser uma machadada final na política financeira comum da União. O Presidente da Comissão estava presente. Ficou mais uma vez a saber quem manda na Europa.