Uma leitura rápida do meu texto de ontem no Diário de Notícias retém apenas as informações que forneço sobre as missões de paz das Nações Unidas. Um ou outro amigo meu enviou-me uma mensagem para agradecer essas informações, tendo um deles acrescentado que esse tipo de informação é muito pouco conhecido pelo grande público. Curiosamente, esse correio foi-me transmitido por alguém que, por razões profissionais, deveria saber mais do que a média dos leitores sobre as missões de paz.
Mas a minha crónica pretendia ir muito mais longe. Tinha um par de mensagens políticas. Não parecem ter sido captadas por alguns. Creio que da próxima vez terei que ser mais claro. Há tanta informação disponível, tanta coisa escrita, que se fica sem tempo para subtilezas, para ler para além das palavras escritas e navegar nas entrelinhas.
A maior parte das colunas de opinião que aparecem publicadas nos nossos jornais são escritas de forma superficial, atabalhoada e tosca. São uma maçada intragável. Perante essa conclusão, fico a interrogar-me se não será o mesmo com o que escrevo? E se vale a pena continuar a escrever para meia dúzia de fiéis leitores.
Hoje foi dia de escrever a minha crónica semanal para o Diário de Notícias. Será publicada amanhã, como tem acontecido todas as sextas-feiras. Depois do exercício de escrita, perguntei a mim próprio se faz sentido estar a escrever algo que depois poucos lêem?
A pergunta tem em conta uma realidade bem evidente. Todos os dias há muita oferta de textos para ler. O mercado está cheio de opiniões e de informação. Assim, que valor acrescenta uma crónica como a minha? Ainda por cima, sobre temas estrangeiros ao quotidiano da maioria das pessoas comuns.
Discuti o assunto com um par de amigos muito próximos. Eles, eu sei, gostam dos meus textos. Mas pedi-lhes que fossem objectivos. E foram.
Por isso, enquanto estes e outros acharem que vale a pena, irei continuar. Mas reconheço que ser escriba nos dias de hoje é estar a falar para o vento que passa. Com algumas excepções, claro.
Tenho um amigo chegado que é um verdadeiro caçador de vírgulas. Passa o tempo a tratar de minudências. Somos muito diferentes, mas gosto de estar com ele de vez em quando. Nessas alturas, volto a lembrar-me que na vida e na política, a falta de uma vírgula altera o sentido e a forma. Ora, o sentido e a forma são fundamentais para que não surjam equívocos. E para manter o respeito.
Quando se procura fazer intervenção social, a mensagem com 140 ou menos caracteres é a maneira de comunicar que mais impacto tem. Nestes tempos de abundância de informação ninguém tem tempo e paciência para ler longos textos. Os nossos jornais ainda não o perceberam. O mesmo acontece com vários blogs de autores muito sérios. Continua a publicar-se escritos cheios de floreados e de meandros infindáveis. Muita conversa e pouca carne.
Donald Trump foi dos que já percebeu a força que um tweet pode ter.
A minha própria conta no Twitter tem milhares de leitores diários, algo que não acontece, nem de muito longe, no que respeita aos meus blogs. Assim, pouco a pouco, o meu investimento vai ser sobretudo ao nível dessa conta. Seria um erro não reconhecer as mudanças que estão a ocorrer em matéria de comunicação social.
Entretanto, ficam aqui os votos de um bom ano de 2017. Um ano que irá certamente ser um desafio muito interessante em termos de intervenção social. O meu papel será o de alimentar a crítica construtiva.
Há cada vez mais informação disponível. As fontes são múltiplas e o material produzido vai muito além da nossa capacidade de o ter em conta.
Este facto deve fazer-nos reflectir sobre o que deve ser a nossa intervenção escrita. E também sobre o estilo dessa mesma escrita. Não se pode escrever hoje como se escrevia quando o livro era rei e o jornal diário o seu mais fiel servidor.
Mas também nem tudo pode ser redigido como se redige um texto de 140 caracteres para o twitter. Mesmo reconhecendo a importância dos tweets. Uma importância que Donald Trump e os seus souberam aproveitar com um grande sentido de oportunidade. Divulgaram dezenas de milhares de textos curtos, frases acutilantes, embora muitas vezes fora do espaço da verdade. Mas a verdade é que ganharam a guerra da informação e da intoxicação.
A quem me pergunta, respondo que escrever sobre coisas pequenas, de somenos importância ou triviais, acaba por nos condicionar o pensamento. Começamos, então, a dar relevância ao que não deveríamos. A perder tempo com pormenores, exagerando-lhe o valor. É verdade que por vezes é bom falar da árvore. Mas, na maioria dos casos, há que ir mais longe e ter a floresta como centro da atenção.
Dizem-me, como resposta, que a malta gosta dos pormenores e compreende melhor a árvore que o bosque. Talvez assim seja. Talvez assim se ganhe ou perca audiência. E os números da audiência é que contam, acrescentam.
Verdade, claro que sim.
Mas a minha opção continua a ser a outra. Sem, no entanto, chegar à ideia absurda de um personagem que conheci, que escrevia para um leitor apenas: para ele!
E a escrita completa é igualmente transcrita de seguida.
Jogar forte e feio no Egipto
Victor Ângelo
A crise egípcia veio demonstrar, uma vez mais, que em matéria de política externa, o que conta são os interesses e a salvaguarda das alianças. Os objectivos estratégicos têm precedência absoluta. Os princípios e a lei internacional, que deveriam orientar as relações entre os Estados, acabam por servir apenas como cortina de fumo. Quando se torna escandaloso ficar calado perante violações extremas dos direitos e liberdades fundamentais, inventam-se então umas declarações políticas, que metem os pés pelas mãos e nada acrescentam nem contribuem para a resolução do problema. Servem, apenas, para fingir algum respeito pelos princípios e para ocultar o que de facto está em jogo.
No caso do Egipto, a aposta é enorme. A preocupação fundamental das potências ocidentais é a de evitar o caos. Trata-se, no mundo árabe, do país com a maior relevância estratégica. Não pode ficar nem ingovernável nem imprevisível. Com 84 milhões de habitantes, e um crescimento demográfico que fará aumentar a população para a casa dos 125 milhões, no ano 2030, tudo isto no quadro de uma economia em declínio, o Egipto tem desafios estruturais gigantescos. A que se junta uma estabilidade social precária, entre a esmagadora maioria muçulmana e a minoria cristã. Acrescentar a estes factores o caos político seria inaceitável. Não só desestabilizaria totalmente o país, como poria em causa a segurança da navegação no Canal do Suez, traria novas ameaças às zonas fronteiriças com Israel e Gaza, tornaria o Sinai num paraíso para o banditismo armado e transformaria toda região num viveiro de extremistas violentos.
Este é o cenário que Washington e certos círculos dirigentes europeus não querem que aconteça. Foi por isso que os militares egípcios, apesar do golpe de Estado de 3 de Julho, conseguiram passar entre os pingos da chuva e não ser publicamente condenados por Obama e outros, mesmo após a decisão da União Africana de suspender o novo regime do Cairo. E é ainda por isso que hoje os Estados Unidos e a UE hesitam na resposta a dar aos acontecimentos recentes, que têm causado centenas de mortos. Vistas as coisas a partir deste lado do mundo, os militares são a única instituição que pode garantir um poder forte e previsível. São, igualmente, aliados de confiança – a cooperação de defesa entre Washington e o Cairo tem uma longa história.
A Irmandade Muçulmana, por seu turno, após muitas décadas de subalternização, deixou-se arrebatar pela legitimidade eleitoral e pelo controlo do poder formal. Financiada pelo Qatar, que nos últimos doze meses doou recursos financeiros incalculáveis ao governo de Morsi, perdeu de vista a correlação de forças no tabuleiro interno e a sua posição no xadrez regional. Quis forçar a parada em ambas as frentes, quer através da adopção de uma constituição a contracorrente dos equilíbrios domésticos quer ainda ao apoiar o Hamas em Gaza e ao menorizar a relação com a Arábia Saudita. Foi, no entanto, o relacionamento cada vez mais íntimo de Morsi com a Turquia de Erdogan que fez içar a bandeira vermelha. O que aconteceu aos generais turcos, julgados com mão pesada e em atropelo das regras processuais, foi visto como um prenúncio pela cúpula militar egípcia. Deixar as coisas continuar por essa via seria um erro fatal, na perspectiva do general Abdel Fattah al-Sisi e dos seus camaradas de armas. Ao tomar a iniciativa de derrubar Morsi sabiam que podiam contar com a condescendência do Ocidente.
Assim saibam, agora, que sem compromissos entre todos os sectores da sociedade egípcia não haverá futuro para o seu grande país nem estabilidade na região.
Este blog não faz praia. Mas gosta de ver os portugueses de férias. Incluindo os que se encontram em Manta Rota e noutras paragens. E a todos deseja bom descanso, que uma das características do "vistas largas" é a de não ser, ao contrário do que é frequente na nossa terra, clubista, sectário. Aqui prega-se a abertura de espírito e a tolerância. Antes e depois das férias.
Entretanto, noto que o meu último texto na edição impressa da Visão atingiu o topo dos escritos mais comentados. E também friso que a escrita não é sobre o futebol nem sobre o tal Relvas. Mesmo assim, o artigo passou à frente dos outros. Afinal, ainda há quem se interesse, em Portugal, por questões internacionais mais amplas.
Dia de escrita. O rascunho inicial tinha 4850 caracteres. O meu editor só aceita 3500. Isto significa horas a retocar o estilo, a burilar as palavras, a procurar palavras mais curtas, a construir frases mais directas, a eliminar o que primeiro pareceu importante e, depois de várias leituras, se afigura como acessório e dispensável. Enfim, uma labuta.
Escrever é uma tarefa dura.
Pensei, então, no mérito dos tweets. Aí só cabem 140 caracteres. São, quando bem feitos, o cúmulo da frase concentrada. Só músculo, nada de gorduras. Estão a tornar-se, cada vez mais, um meio privilegiado de informação e de comunicação. Cobrem muito terreno. Muita uva e pouca parra, diriam os antigos.