Uma pessoa conhecida, cidadã americana, comprou uma propriedade no Algarve, gastou mais de um par de milhões e pediu uma Autorização de Residência para Investimento (ARI). Anda há meses a tentar fazer uma marcação de atendimento no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Não consegue, os serviços online do SEF dizem não haver vagas para atendimentos ARI. Entretanto, a interessada começa a ficar convencida que essa história do ARI é uma armadilha do Estado português, destinada a captar investimentos e a fazer cair os investidores na ratoeira de uma burocracia que não funciona. E agora, com o desmembramento do SEF à porta, a cidadã americana está a entrar na fase da desilusão.
Entretanto, pensei recomendar-lhe que escreva ao Cabrita. O homem já não é ministro da coisa, mas talvez seja capaz de meter uma cunha.
Este é o link para a minha crónica de hoje no Diário de Notícias. O texto tem fundamentalmente duas mensagens. Primeiro, que a política seguida pelos ultraconservadores que estão no poder em Varsóvia deve ser vista como uma ameaça muito séria para o futuro da União Europeia. Segundo, que é fundamental dar força à Comissão Europeia no seu combate contra os tentados ao estado de Direito, na Polónia, para já, mas também noutros países europeus.
Cito de seguida umas breves linhas do meu texto.
"Tudo isto põe em risco o futuro do projeto comum. Os polacos querem continuar na UE – 90% dos cidadãos são a favor, incluindo 87% dos apoiantes do PiS. O próprio governo diz e repete que não se trata de preparar uma saída, um Polexit. Seria, segundo dizem, apenas uma afirmação de que a Europa assenta num conjunto de nações e não numa integração cada vez mais profunda. É um argumento falacioso, pois o que está em causa é o respeito pelos valores básicos que unem os povos europeus e que foram consagrados nos Artigos 2º e 3º do Tratado da UE. Deixar que um Estado-membro viole esses valores e continue na União é oferecer ao adversário a possibilidade de nos destruir continuando sentado à nossa mesa."
Angela Merkel diz-nos que é preciso negociar com o governo polaco. A mensagem era dirigida à sua compatriota Ursula von der Leyen. Foi imediatamente aproveitada pelo primeiro-ministro polaco, um político matreiro e duro de roer. Mateusz Morawiecki, assim se chama o fulano, veio logo falar de diálogo, que estava pronto para encetar uma discussão com a Presidente da Comissão.
Mas aqui há pouca matéria para diálogo. O que deve ser feito é seguir os valores democráticos europeus, nomeadamente os referentes à independência do sistema de justiça. E deixar de utilizar a televisão do Estado, o canal nacional mais visto pela população, para atacar todos os dias as instituições e as personalidades europeias.
Esta matéria é muito importante para a sobrevivência do projecto comum europeu.
Este é o link para a minha crónica de hoje, publicada no Diário de Notícias. O título é uma chamada de atenção para a necessidade de firmeza quando se trata de defender e fazer aplicar os valores em que assenta a União Europeia. O texto concentra-se numa análise de duas grandes ameaças internas para a estabilidade e a credibilidade da União - o húngaro Orbán e o polaco Kaczynski - e da enorme ameaça externa que Erdogan representa.
Cito uma extracto do meu texto, como é habitual.
"A luta contra a corrupção e pelo bom funcionamento da justiça, sobretudo a sua independência, são dois aspetos fundamentais do projeto europeu."
Um país que não consegue administrar justiça a tempo e horas é um país que não funciona como deveria. Se esse país se encontra na União Europeia, o problema é bem mais grave. A UE deve ser um exemplo em matéria de funcionamento das instituições que são os pilares da sociedade e do poder. Onde isso não acontece, é fundamental responder a duas questões de base. Primeiro, quais são as razões que impedem o bom funcionamento do sistema de justiça? Segundo, quem ganha com as deficiências existentes, com os prazos que não são cumpridos, com a injustiça?
Um sistema político que não consigo fazer funcionar a justiça é um sistema que precisa de ser substituído. A classe dirigente não está à altura e deve ser corrida do poder em resultado da indignação popular. Os cidadãos não podem cair na ratoeira de dizer apenas que são todos uns bandidos. Há que procurar alternativas.
A minha coluna de ontem no Diário de Notícias tinha como destinatários todos aqueles que na União Europeia querem desligar ajuda financeira da prática de um estado de Direito. As principais críticas que fiz diziam respeito aos dirigentes da Polónia, da Hungria e da Eslovénia. Mas nas entrelinhas ia mais longe. O primeiro-ministro português tem sido ambíguo nesta matéria. Quando se trata do consumo interno, não hesita em afirmar que orçamentos e valores democráticos devem ir a par e passo. Nas reuniões em Bruxelas, é muito menos taxativo. Dá mesmo a impressão, às vezes, que está mais próximo da posição defendida por Viktor Orbán, o primeiro-ministro húngaro, do que daqueles que vêem o futuro da Europa como uma comunidade de valores.
O meu texto tinha isso em linha de conta.
E hoje o jornal Público revela que assim parece ser. Num trabalho intitulado “Portugal criticou no Conselho o mecanismo de defesa do Estado de direito” fica a imagem de um governo com duas caras. No segredo das cimeiras, põe-se ao lado dos polacos, húngaros e companhia.Na praça pública, declara que é a favor da posição da Comissão Europeia, que não quer ver os fundos desligados da boa prática democrática.
Há neste momento uma conjugação de crises que não é de bom augúrio.
Na Europa, temos o plano de resiliência que está em risco. A posição da Polónia, que não quer ver as questões da democracia e do estado de direito incluídas no plano como condicionalidades para a atribuição de fundos, poderá atrasar a aprovação do pacote de emergência e mesmo do orçamento europeu. Para os dirigentes polacos, gente extremamente conservadora, a manutenção do seu controlo das alavancas do poder é mais importante do que o dinheiro que possa vir de Bruxelas.
Temos ainda o impasse com os britânicos. O período de transição está a terminar e não parece ser possível chegar a um acordo que trate das relações futuras entre a União Europeia e o Reino Unido. A questão da pesca é um obstáculo maior. Nessa matéria, o presidente francês não pode dar a impressão que não defende os interesses dos pescadores do seu país. Não sei como vão descalçar esta bota. Sei, no entanto, que a ausência de acordo entre as partes provocará uma quebra significativa nas relações económicas. Isto numa altura em que as economias já estão debaixo de um grande stress.
Temos o covid fora de controlo. Para além das implicações em termos de saúde pública, haverá que fazer frente a uma crise económica e social enorme. As medidas de mitigação que os governos europeus estão a adoptar têm custos financeiros enormes. O endividamento dos estados provocará, mais cedo ou mais tarde, um aumento inédito dos impostos bem como medidas extremas de contenção de outras despesas.
E para culminar, temos a crise política que se está a preparar nos Estados Unidos. Tudo poderá acontecer, uma vez conhecidos os resultados eleitorais. Incluindo uma enorme confrontação entre os dois lados. Alguém me dizia hoje que se sente mais insegura agora, em Nova Iorque, do que quando acompanhava eleições num ou outro país africano.
Ontem escrevi umas breves linhas sobre o impacto da covid na economia, na nossa e na global. Pensei que não seria necessário socorrer-me de muitas palavras para transmitir a mensagem que as perspectivas económicas são dramáticas, de modo directo para uns e por ricochete, com o tempo, para todos. Tudo o que possa contribuir para a expansão da pandemia e o contágio é mau, quer do ponto de vista da saúde quer da economia. Por isso, as medidas que o governo se viu obrigado a adoptar hoje, relativas à grande Lisboa – a Área Metropolitana – são justificadas. Se há algo a dizer, é que pecam pela circunspecção. O governo não quis dar um sinal de alarme, quando na realidade existe uma situação que é potencialmente preocupante. A intenção é a de responder mas sem afastar os possíveis turistas. O problema é que, lá fora, Lisboa já é notícia. Num dos principais diários belgas, aparece mesmo na primeira página.
Isto mostra que está em jogo a possibilidade de alguma recuperação da economia a curto e médio prazo. Também significa que há quem não entenda isso e adopte comportamentos de risco. Festas e multidões nos centros de bricolage, por exemplo. Temos, ainda, os técnicos das leis, que nos falam de procedimentos, quando nos deveriam dizer que estamos numa situação em que o interesse nacional está comprometido e que eles, enquanto letrados nos enredos jurídicos, só podem dar o apoio às medidas – modestas – que o governo decidiu tomar. Enquanto vozes públicas, deveriam ser dos primeiros a contribuir para a educação cívica e não para a confusão procedimental.
Foi isso, aliás, o que disse ao meu afilhado, que é doutor em leis e faz anos este Sábado. A sua intenção era a de organizar, em sua casa, um jantar para a família e alguns amigos. Falámos sobre esse plano. E concluímos que vamos fazer uma festa das grandes, que ele entra na categoria dos 50. Mas, cada um em sua casa e à frente do computador. Não haverá bolo de aniversário, porque servir um fatia pela internet não é fácil. Cada membro da família e convidado arranja um pastel de nata e um copo de qualquer coisa, canta-se os parabéns pelo cabo e estaremos todos juntos, com muita alegria, e certos que o virtual é melhor do que uma cama de cuidados intensivos ou um contágio que nos estrague o pouco de economia que ainda nos resta.
As forças de polícia nos Estados Unidos têm uma base municipal. Não existe uma visão estratégica do policiamento. Tudo é de nível táctico, visto e tratado com base no caso a caso. A formação dos polícias tem como principal objectivo aprender a reprimir com toda a força possível. Violentamente, em resposta à violência que caracteriza a vida quotidiana de muitos. E é fortemente influenciada pelo racismo que existe em certos círculos da sociedade. Para um europeu, habituado às regras da democracia e de um Estado de direito, é difícil compreender a cultura de brutalidade que prevalece em muitas das forças de polícia dos Estados Unidos.