Yves Leterme, o PM belga em exercício de funções, num governo de gestão, que dura há quase um ano e meio, pediu à população que subscrevesse uma nova emissão de obrigações do tesouro. Evitar-se-ia, assim , o recurso aos mercados internacionais, que estão a penalizar a Bélgica. Apelou ao patriotismo, num país em que esse sentimento parece estar muito esfrangalhado, pediu pelo menos 200 milhões de euros de subscrições, num empréstimo a cinco anos, com uma taxa de juro de 4%.
Ontem, uma semana após o apelo, os belgas haviam comprado mais de 5 000 milhões de euros dessas novas obrigações. Ou seja, 25 vezes mais do que Leterme esperava que pudesse acontecer.
Um dos aspectos mais concretos que sobressai no discurso de ontem de Nicolas Sarkozy relaciona-se com o papel da Comissão Europeia. O chefe de Estado francês acha que a Comissão não tem estado à altura dos acontecimentos, para além de ter mostrado falta de agilidade. Sarkozy voltou a insistir na ideia de que a direcção da Europa pertence aos chefes de estado e de governo, sendo a CE apenas um secretariado executivo.
Quem não deve gostar muito desta conversa é o presidente da Comissão.
Como não deve ter gostado de ouvir a chanceler Merkel, hoje, repetir que não há espaço para eurobonds, na Europa de agora. A senhora está, aliás, muito desgastada com Durão Barroso sobre a matéria. Na sua opinião, a proposta de Barroso, na semana passada, em relação à criação de um certo tipo de eurobonds, foi totalmente inapropriada.
Sarkozy e Merkel vão avançar com uma série de propostas sobre a revisão do funcionamento da zona euro. Uma delas é relativa ao "travão constitucional", que querem ver incorporado na constituição de cada país membro da zona euro, de modo a limitar, na lei fundamental, o valor máximo do endividamento de cada estado. O patamar deve ser 3% do PIB.
Em Portugal, há muita gente no PS e na área da demagogia que se opõe a esse travão. Veremos como se tratará do assunto na nossa terra.
Entretanto, primitivos políticos de todos os bordos continuam a dizer e escrever coisas incendiárias em relação à Alemanha e a Merkel. É um erro muito grave. Faz regressar os velhos papões do nacionalismo bacoco e perigoso. A coisa está a tornar-se de tal modo séria que François Hollande teve que fazer hoje um apelo ao bom senso, para que esse tipo de reacções primárias cesse sem demoras.
Nos próximos dias vai haver muito ruído à volta da crise europeia. É o tema da actualidade, neste canto do mundo. A Chanceler Merkel vai falar sobre o assunto na Sexta-feira, no Parlamento alemão.
No dia anterior, terá falado N. Sarkozy.
Nessa altura a Visão desta semana estará na rua com um texto meu sobre o assunto. Um escrito polémico, creio.
Muito ao contrário do que diz o Economist na sua edição de agora. Mas que deve ser consultada.
Depois, a 9 de Dezembro, teremos a cimeira final da presidência polaca do Conselho Europeu. A problemática do euro e das reformas institucionais ligadas às questões fiscais serão os temas dominantes.
Entretanto, a Itália, a Espanha, os bancos, estarão todos debaixo de escrutínio muito apertado.
O discurso de Cavaco Silva sobre a governação da UE, hoje proferido em Florença, merece ser lido com muita atenção. Trata-se, na minha opinião, de uma reflexão inteligente e objectiva sobre o estado actual da União.
Seria importante que a imprensa internacional o mencionasse com algum destaque.
A minha análise leva-me a concluir que, para além das críticas habituais a Angela Merkel e a Nicolas Sarkozy, ninguém se mexe a sério, para tentar encontrar uma solução aos problemas existentes. Fazem-se, isso sim, exigências impossíveis, como está a acontecer com os países que enumero no meu artigo, e propostas que, neste momento, são irrealistas, como é a questão dos eurobonds.
Curiosamente, aparece na revista um outro texto, que defende uma posição contrária, no que respeita aos eurobonds. Temos, de um lado, uma leitura romântica da Europa, que terá mérito, do outro, uma visão com ambição mas pragmática.