Combater o terrorismo nas nossas terras
Uma comissão parlamentar francesa submeteu hoje à aprovação da Assembleia Nacional um relatório sobre as circunstâncias e as respostas dos serviços de segurança e outros aos atentados que ocorreram no ano passado em Paris. O relatório, fruto de seis meses de trabalho a sério, constitui acima de tudo uma reflexão aprofundada sobre as polícias, os sistemas de informações, os serviços de urgência médica, a radicalização nas prisões e também sobre o papel da comunicação social e das redes, durante o decorrer das operações. Quando estiver disponível ao público tornar-se-á um documento de referência indispensável para quem anda por estas matérias.
Uma das constatações mais importantes tem que ver com uma debilidade que já tive a ocasião de mencionar aqui, neste blog, e noutros locais: quando existem vários serviços autónomos de polícia os problemas de comunicação e de coordenação entre eles são uma realidade com graves consequências operacionais. Prima a rivalidade e o a falta de cooperação efectiva. A centralização dos diferentes órgãos de polícia debaixo de uma autoridade única é essencial, quer na fase de prevenção do terrorismo quer ainda quando se trata das acções tácticas, da planificação operacional, ou ainda no período subsequente de investigação.
No caso concreto da França, para além da concorrência entre as unidades especiais de polícia e de gendarmaria existem vários serviços de inteligência, altamente apetrechados mas nem sempre eficazes. Na verdade, procuram, cada um no seu campo, salvaguardar os seus interesses próprios, justificar a sua razão de ser, os seus efectivos, orçamentos e prerrogativas. Quando há trabalho a sério, o protagonismo é mais importante do que a cooperação.
O relatório também aponta para as falhas de coerência operacional entre as polícias e as forças militares. Aliás, tornou-se uma vez mais evidente que o papel das forças armadas em funções de segurança interna levanta várias interrogações que continuam por esclarecer.
Outros aspectos dizem respeito ao treino de tiro, que é insuficiente, e à necessidade de reforçar muito seriamente as capacidades de análise da ameaça, de separação do trigo do joio, no diz respeito à informação recolhida, bem como as competências em matéria de definição estratégica dos riscos e de coordenação operacional. É igualmente urgente estabelecer uma nova capacidade nos serviços prisionais: a inteligência relativa às actividades dos prisioneiros próximos do pensamento e da acção radicais.
Quanto aos serviços de emergência médica, ficou claro que os profissionais que são responsáveis pela assistência de primeira linha não têm a preparação necessária para tratar de feridos com armas de guerra e para agir em situações de violência terrorista. Haverá que rever a formação e pensar em moldes que são os próprios da medicina aplicada a situações de guerra.
O relatório dedica todo um capítulo ao trabalho da comunicação social durante a cobertura dos incidentes. E faz uma série de recomendações que terão certamente que ser discutidas entre as autoridades políticas e os órgãos representativos dos jornalistas. A ética da profissão de jornalista precisa de ser revista face à seriedade dos actos terroristas e ao uso que os criminosos poderão fazer de informações em directo.
Finalmente, uma palavra sobre a cooperação entre as polícias europeias. Há aqui muito por fazer. Para começar, será preciso reforçar o papel da Europol bem como promover uma articulação muito mais apertada entre essa organização e Frontex, assim como com os serviços nacionais de fronteiras.