O portão
Copyright V.Ângelo
O portão da minha casa em N'Djaména. Os contrastes. Os tons da manhã.
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O portão da minha casa em N'Djaména. Os contrastes. Os tons da manhã.
Portugal está coberto por um nevoeiro espesso. Como não dá para enxergar muito, a maioria dos políticos, dos jornalistas, dos juízes, dos funcionários das causas rotineiras, e outros, andam com as vistas curtas. É como na Escócia, onde o frio húmido e fechado faz aparecer fantasmas. No nosso caso, os fantasmas entram mesmo nas salas apagadas das comissões parlamentares. Instalam-se nas nossas casas, pelas televisões que nos tornam ainda mais rasteiros. Geram todo o tipo de medos e uma variedade de lendas.
Como tudo é muito irreal, a palavra mais frequente, nas bocas desses seres que a névoa cerrada torna cinzentos, é: Mentira! Sim, mentira! Passam o tempo a chamar-se mentirosos uns aos outros, por considerarem que só a sua versão da miragem é que deveria fazer fé.
Mas a verdade, para além das brumas fabricadas nas várias centrais conspirativas, é que há corrupção no ar. Abusos de poder. Arrogância. Falta de moral cívica. Ausência de sentido nacional. Desprezo pelos mais fracos, os anónimos da vida. E muita incompetência. A governação e a sociedade estão em crise. Estes são factos reais. Não são meras construções mentais, nem almas de um outro mundo. São problemas bem portugueses.
Quando os tribunais deixam de funcionar, em sociedades como a portuguesa, abre-se a porta para os julgamentos na praça pública. Os jornalistas, os comentadores, a opinião, todos nos transformamos em juízes. Os autos da fé, nas manchetes dos jornais ou nas imagens das televisões, passam a fazer parte da justiça popular. Os jornalistas passam a ser os novos heróis.
É uma situação de caos. De grande fraqueza institucional. Que acaba por ter grandes repercussões na economia, no investimento, no emprego. Gente séria não pode funcionar num clima em que a justiça está subvertida.
Em sociedades onde a opinião pública não pesa, como é o caso em muitos sítios de África, a porta que se abre é a do refúgio nas identidades, na segurança que a etnia parece fornecer, nas milícias armadas, na violência privatizada. Fractura-se o Estado. Desmembra-se a nação.
Em ambos os casos, não convém esquecer que a justiça é um dos princípios básicos da vida, um dos pilares da civilização e do progresso. Um poder político que não põe a justiça a funcionar é um fracasso.
Um dia em cheio, para quem segue os assuntos internacionais. Dia Mundial de Luta contra a Sida. Nunca é demais falar na Sida. Conheço muita gente que vive os seus efeitos ao quotidiano. É um inferno. E um assunto de grande complexidade. Entrada em vigor do Tratado de Lisboa, com celebrações que ficaram marcadas pela ausência dos principais governantes europeus. Fim da Cimeira Ibero-Americana, com muita divisão sobre as Honduras e pouca substância, uma espécie de reunião só para a fotografia. A decisão de enviar mais 30 000 soldados americanos para o Afeganistão. Uma decisão difícil e de custos elevados. Uma guerra com uma estratégia que precisa urgentemente de ser revista.
Depois, vieram os números mais recentes sobre o desemprego na UE. Um drama. Portugal continua a ver o desemprego aumentar. Os jovens europeus de menos de 25 anos são as principais vítimas do desemprego. A saída da crise a continuar sem saída. Uma crise de sistema que os senhores dirigentes apelidam pudicamente de crise financeira. Se fosse apenas uma questão de finanças...
E por falar nisso, o Euro está cada vez mais sobrevalorizado. Não se compreende que ninguém fale no assunto, mostre preocupação. Ora, é uma questão bem séria, com profundas implicações no futuro da economia da Europa.
O que continua por valorizar é o caso Face Oculta. Ou melhor, há quem o queira desvalorizar. Mas é um assunto de muito peso. Muito grave.
Finalmente, uma palavra caseira, com os pés assentes na terra. Descobri hoje o Jornal de Leiria, um semanário de valor e conteúdo. Que reproduz bem a riqueza da região. Faz bem à alma ver que certas regiões do país mantêm, apesar de tudo e de não estarem nas graças de quem manda, um dinamismo exemplar.
A "Operação Face Oculta" revela muita coisa. Acima de tudo, que o poder está cheio de gente estranha e que a justiça tem medo, está subordinada à força política.
Também revela que é tempo de começar a mudar as coisas.
Não vá o sapateiro além da sandália, como também não convém, a quem anda a coser as botas de cano alto do mundo, descer ao nível do chinelo...Mas, de vez em quando, tenho que fazer um pequeno comentário sobre a vida política portuguesa.
A "Face Oculta" é um mistério jurídico e uma desgraça política.
Do ponto de vista da justiça, temos aquele senhor pequenino, cheio de penugem nas orelhas e no nariz, uma prova viva que certos portugueses em situação de poder descendem directamente dos homens das cavernas, a opinar de uma maneira desastrosa sobre matérias em relação às quais deveria ser de uma competência exemplar. Um primitivo sem pêlo na venta. Do outro lado, muitos de entre nós, ao ver este tipo de desastres, de que o pinto da procuradoria é outro exemplo, de gente que mesmo sem chegar a galo consegue estar no poleiro, muitos que somos levados a pensar que esta justiça está toda minada.
Politicamente, que buraco! Um primeiro que deveria perceber que isto não é uma questão técnica de justiça. É uma matéria em que a credibilidade, a pouca que ainda existe, está a ficar pelas ruas da descrença. Numa altura em que milhares de portugueses andam aos farrapos, dá-se mais uma vez a impressão que quem está na mó de cima canta sempre vitória, enquanto os nascimentos forem dando pintos e outros augustos trapalhões.
Tal como o tempo, é altura de alerta amarelo nas costas bravas da política portuguesa.
Até que mude o vento. Mudará.
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