O pacote anti-inflação aprovado pelo governo está a cair muito mal na opinião pública. O Primeiro-ministro fez uma bela jogada de espelhos e miragens. Passado o momento, os cidadãos começaram a perceber que o pouco que vão ganhar em outubro é mesmo pouco e será perdido em 2023 e nos anos seguintes. Os pensionistas estão especialmente preocupados com os cortes previstos já a partir de janeiro de 2023.
E o que era de facto importante para as famílias – cortar e reduzir as taxas e o IVA relativos ao consumo de gás e de electricidade, que neste momento pesam mais de 35% do valor total das facturas – não foi feito. Era aí que, sem mais complicações, que as medidas deveriam ter incidido. Seria claro, fácil de entender e teria um impacto imediato nos orçamentos familiares e no bem-estar dos cidadãos. Considero um erro político e uma injustiça social que tal não tenha sido decidido.
Do lado das empresas, era fundamental prever um esquema que ajudasse as que dependem fortemente do consumo de energia. Sem essa ajuda, a viabilidade de muitas dessas empresas estará em risco, já que o aumento dos custos de produção e de funcionamento não poderá ser absorvido pelo preço junto dos consumidores, por muito elevada que seja a inflação. Também teria sido relevante criar um imposto excepcional sobre os lucros inesperados das companhias petrolíferas e energéticas.
O pacote veio também mostrar que o ministro das Finanças não passa bem junto da população. Não tem credibilidade suficiente para o cargo que exerce. Projecta a imagem de quem anda às aranhas. Só existe politicamente por ter o apadrinhamento pessoal de António Costa.
A crise que se avoluma na Europa – e por cá também – exige medidas à altura. Para a enfrentar, não chega ser muito hábil em malabarismos políticos.
Um erro frequente em política é o de subestimar os adversários. Dir-se-ia que Fernando Medina cometeu esse erro, nestas eleições autárquicas. Ter-se-á deixado embalar pelas sondagens, que o davam largamente vencedor.
Não se percebe bem como foi possível ter sondagens com resultados tão enganadores, mas aconteceu. E o presidente cessante deve ter acreditado nelas, como aliás seria de esperar.
Temos aqui uma segunda lição, para além da que se refere ao erro de subestimar a competição. Essa segunda lição é que não se deve dar demasiado crédito às sondagens. Mesmo sabendo que a maioria das sondagens são hoje feitas com base em técnicas comprovadas, é fundamental continuar a lutar por cada voto, procurar convencer cada eleitor, mostrar que não se acredita em favas contadas.
Uma terceira lição diz respeito à arrogância. Cada candidato deve mostrar que se sente à vontade, que não se deixa levar em ondas de entusiasmo, que está ali para ser eleito e não para ser consagrado. A arrogância, verdadeira ou vista como tal, faz perder votos. É muito mal-aceite pelos cidadãos. Nos tempos da sociedade digital e do individualismo que daí nasce, cada eleitor vê-se como igual aos outros, incluindo aos candidatos. Não quer ver e não apoia quem se sente acima do cidadão lambda, do cidadão comum, do meio da escala.
As eleições autárquicas têm uma dinâmica própria. Dependem de vários factores locais, das personalidades dos candidatos e da imagem que projectam em termos de eficiência. Essas são dimensões importantes, pelo menos tão relevantes como a identificação partidária. Nalguns casos, são mesmo mais determinantes. Por isso as pessoas votam por Santana Lopes, Isaltino Morais, Fernando Ruas, Rui Moreira e tantos outros.
Lisboa é, no entanto, um caso diferente. Trata-se do município mais visível. A eleição ganha facilmente um significado que extravasa a dimensão local. Foi o que agora aconteceu. O presidente cessante está muito identificado com o primeiro-ministro, António Costa. Por isso, houve quem votasse contra a renovação do seu mandato para mostrar desagrado em relação ao primeiro-ministro. Ou para garantir um certo equilíbrio de poderes, numa visão que preferiria ver como presidente da capital alguém da oposição, para que não fosse tudo da mesma panela.
Mas essa é apenas uma parte da verdade.
De qualquer modo, o resultado da eleição em Lisboa é difícil de ler. Trata-se certamente de uma grande surpresa. Dizer que Lisboa é terra de ricos e por isso vota como votou, é uma maneira simplória de apresentar a coisa. Seria mais fácil falar da personalidade dos dois candidatos, que são na realidade diferentes e contrastantes.
Agora o que interessa é que os eleitos, provenientes de vários partidos, possam trabalhar em conjunto, de modo construtivo. É aí que se verá a maturidade de cada um. A cidade tem imensos problemas, alguns próprios, outros semelhantes ao que acontece actualmente nas grandes urbes. Perante isso, só posso desejar que os eleitos se mostrem à altura. Tentar bloquear o novo presidente, ou uma parte da equipa, acabaria por prejudicar os habitantes de Lisboa. Espero que isso não aconteça.
Estou inteiramente de acordo em considerar demagógica a decisão do presidente da Câmara de Lisboa relativa aos brasões que se encontram na Praça do Império, frente ao Mosteiro dos Jerónimos. Para além da demagogia, a retirada desses brasões só pode ser vista como uma manifestação de radicalismo desmiolado.
Se Fernando Medina está de facto preocupado com essa praça a primeira coisa que deveria fazer seria a de mandar limpar e arranjar as escadarias e o túnel que a liga à esplanada do Padrão dos Descobrimentos. Essa infra-estrutura está frequentemente nauseabunda e também precisa de uma remodelação. Tem, por exemplo, dois ascensores para cadeiras de rodas. Nenhum deles funciona há meses e meses.