No meu texto de opinião de ontem, sobre a falta de coerência da política europeia de migrações, https://www.dn.pt/opiniao/a-europa-a-deriva-no-mar-das-migracoes--13473410.html, digo claramente que os países europeus não querem, de modo algum, passar novamente pela experiência que viveram em 2015, quando mais de um milhão de imigrantes e candidatos ao estatuto de refugiado chegaram em massa. Este é o grande receio europeu, no que diz respeito à imigração. Todas as medidas avulsas que vão sendo tomadas têm como objectivo evitar uma nova onda migratória. E cada país olha para a questão com base nas suas preocupações nacionais. Não há Europa, ou há muito pouco em comum, quando se trata de travar as migrações vindas de diversas partes do mundo. Por isso, a aposta continua a ser a de uma guarda costeira e fronteiriça forte bem como a ajuda às forças de polícia e militares nos países de origem dos migrantes e nos de trânsito. Aqui, a realidade é igualmente muito complexa. Os países fazem o jogo, como se estivessem a colaborar no controlo migratório, mas, na verdade, ficam satisfeitos quando vêem uma parte dos seus jovens sair à procura de um futuro melhor. As migrações são vistas por esses países como algo de positivo para as suas economias e para a estabilidade política. Assim se explica que, em geral, não colaborem com a União Europeia quando esta procura devolver aos países de origem os imigrantes que não são aceites, que não obtêm a legalização na Europa.
Um editorial do diário Le Monde apelava, no início da semana, para que a União Europeia se mostrasse “solidária, firme, realista e humanitária”. O tema do editorial tinha que ver com a situação que existe na fronteira terrestre entre a Grécia e a Turquia.
As palavras escritas soavam bem. Todavia, em termos reais, eram vagas e contraditórias. Como tantas vezes acontece, foram produzidas para esconder as imensas contradições que existem ao nível da realidade no terreno e, ao mesmo tempo, para dar a impressão que os valores da moral e do humanismo não estão postos de parte.
No fundo, é mera conversa de intelectuais, que nada acrescenta à solução do problema concreto. É frequente ver-se muita parra e pouca uva. Esse era apenas um exemplo mais.
Entretanto, quem tem que tomar decisões e fazê-las aplicar decidiu mobilizar meios adicionais de polícia e de controlo fronteiriço para a zona em causa. A isso, juntar-se-á uma deslocação a Ancara do Presidente Macron e da Chanceler Merkel na próxima semana. Perante isso, fica a pergunta de essa iniciativa de ambos está ou não a ser coordenada com os dirigentes das instituições europeias.
As imagens que nos chegam, vindas da fronteira da Grécia com a Turquia, perturbam. Por muitas razões. São as pessoas e o seu desespero. A manipulação a que estão sujeitas, por causa do jogo político do Presidente Erdogan. As guerras e as violações dos direitos fundamentais, que estão na origem destes movimentos de massas. Os cidadãos gregos, que reagem abertamente contra as novas chegadas e que se sentem abandonados por Atenas e Bruxelas. A política europeia, que não quer novas ondas de imigração e que prefere pagar para que outros tomem conta dos deslocados e dos refugiados.
Numa palavra, a violência. Assim resumiria essas imagens. A violência com que a vida e certos políticos tratam as pessoas, os mais fracos e sem voz.