Este é o link para a minha crónica de 2 de fevereiro de 2024 no Diário de Notícias.
A crónica começa assim: "Salvo exceções, a política é um mundo habitado por oportunistas. Nicolau Maquiavel, há quinhentos anos, entrou para a história da ciência política moderna, ao escrever sobre o assunto, pondo o acento tónico na palavra cinismo. Mas a prática vinha da antiguidade e continua nos nossos dias, nos governos, nos partidos e na habilidade em manipular a opinião dos cidadãos. A ética, ou seja, o respeito pelos princípios, pelo interesse comum, pelos contemporâneos e pelas gerações vindouras, é uma palavra que faz rir, disfarçadamente, muitos dos que andam na política. Para estes, a única coisa que conta é o seu benefício pessoal, garantido pela manutenção no poder graças a uma clientela política."
O Conselho de Segurança da ONU reúne-se hoje novamente para debater a situação em Gaza, Palestina. É muito provável que aprove uma nova resolução para condenar o ataque terrorista do Hamas de 7/10 em território de Israel e para pedir a libertação dos reféns. Mais, que apele ao fim do bloqueio de Gaza por Israel no que respeita aos produtos essenciais para a vida das populações civis. Também deverá recomendar que Israel anule a ordem dada sobre o movimento para sul dos habitantes de Gaza. E que se instaure um cessar-fogo humanitário e se proceda à abertura de corredores humanitários. Duas outras preocupações do Conselho: a protecção das instalações e do pessoal na ONU e de outras agências humanitárias que ainda estão a assistir as populações de Gaza; contenção máxima, de modo a evitar o alastramento do conflito para outras partes da região.
A União Europeia não tem qualquer tipo de influência sobre as partes em conflito. Amanhã, terá lugar uma conferência dos ministros europeus dos Negócios Estrangeiros, sobre a presidência de Josep Borrell. Mas será um exercício em vão, um tiro de pólvora seca. Aprovará uma declaração genérica, copiada de declarações passadas, e nada mais.
No essencial, os Estados-membros apoiam tradicionalmente Israel. É verdade que insistem na “solução” dos dois estados, segundo as fronteiras existentes em 1967, e com Jerusalém como capital de ambos. Mas essa insistência é meramente simbólica. Os políticos europeus sabem que Israel a tornou inviável. Mas essa constatação é varrida para debaixo do tapete. E os programas de cooperação derivados da associação de Israel com a UE continuarão em vigor.
Hamas é uma organização terrorista. Consta da lista europeia como tal. Essa classificação impede os europeus de contactar directamente com o Hamas. Mas isso não tem importância alguma. Tal como Israel, Hamas não está disposto a ouvir o que possa vir de Bruxelas ou por intermédio de Bruxelas.
O impasse e o sofrimento irão continuar. Benjamin Netanyahu decidirá até quando.
Entretanto, cresce, nalgumas cidades europeias, o ódio contra os cidadãos europeus de religião judaica. É evidente que esse tipo de comportamentos é inaceitável. Deve ser tratado de forma enérgica. Não podemos permitir que se importe para a cena europeia o que se passa no Médio Oriente.
A maneira como o Presidente Joe Biden tem estado a actuar no que respeita ao conflito entre Israel e os Palestinianos mostra que o Médio Oriente não está no topo da sua lista de prioridades. Tem seguido uma linha habitual – a de apoiar o governo israelita, embora sem grandes entusiasmos, e andar aos ziguezagues, no que respeita aos direitos dos palestinianos. Fora isso, nada de novo, que as suas preocupações são, para já, essencialmente de ordem interna. A agenda doméstica é onde estão os problemas que considera importantes e também onde estão os votos que irá precisar em 2022, para consolidar o seu controlo do Congresso.
A destruição, que hoje ocorreu por decisão e acção das autoridades israelitas, do edifício que acolhia os escritórios da Al-Jazeera e da Associated Press em Gaza ficará na história da região e de um conflito que não tem tréguas. Independentemente do resto, tratou-se de uma decisão com altos custos políticos. Na guerra da opinião pública internacional, que é uma frente de combate que também conta e muito, foi um imenso tiro nos pés que Benjamin Netanyahu decidiu arriscar. E acertou em cheio. Não teve em conta, além disso, que a mesma opinião pública já não tinha qualquer tipo de simpatia pelo governo de Netanyahu. Nem pelas linhas políticas que o fazem agir como age.
Na Visão de hoje, que está nas bancas, escrevo sobre Gaza e Israel.
Este é um tema muito delicado, sobre o qual muita gente tem opiniões feitas e nem sempre objectivas. Não é de estranhar. O que é estranho é que a União Europeia não consiga ter uma posição mais assertiva que equilibre a inclinação de Washington para apoiar acriticamente Tel Aviv.
Ontem à noite começou a ofensiva terrestre contra o Hamas, na Faixa de Gaza. Tendo em conta que Gaza é um labirinto de ruas e de gentes, um território densamente povoado, é de prever que as operações militares façam crescer de modo exponencial o número de vítimas civis.
O Secretário-geral da ONU emitiu entretanto um comunicado para expressar a sua profunda preocupação, bem como frustração, face ao agravamento da violência. Numa conversa telefónica com o Primeiro-ministro de Israel, Ban Ki-moon pediu que se pusesse termo ofensiva.
É de esperar que outras vozes se juntem à das Nações Unidas. A crise precisa de encontrar soluções políticas e diplomáticas.