O Conselho de Segurança da ONU reúne-se hoje novamente para debater a situação em Gaza, Palestina. É muito provável que aprove uma nova resolução para condenar o ataque terrorista do Hamas de 7/10 em território de Israel e para pedir a libertação dos reféns. Mais, que apele ao fim do bloqueio de Gaza por Israel no que respeita aos produtos essenciais para a vida das populações civis. Também deverá recomendar que Israel anule a ordem dada sobre o movimento para sul dos habitantes de Gaza. E que se instaure um cessar-fogo humanitário e se proceda à abertura de corredores humanitários. Duas outras preocupações do Conselho: a protecção das instalações e do pessoal na ONU e de outras agências humanitárias que ainda estão a assistir as populações de Gaza; contenção máxima, de modo a evitar o alastramento do conflito para outras partes da região.
Despachei para Bangui o meu director de gabinete e o o conselheiro político sénior. No seguimento das minhas conversas telefónicas de ontem com o Primeiro-Ministro Toadera, os enviados especiais reuniram-se, esta tarde, com o PM e uma equipa de crise. Estiveram também com a embaixador francês e com as ONGs que operam em Birao. Lancei, entretanto, um apelo para que os reféns sejam libertos sem demoras. São jovens de bem, dedicados e com reconhecido trabalho social de apoio às comunidades de Birao.
Entretanto, a notícia dos raptos foi título grande nos meios de comunicação social franceses. O facto de os raptores procurarem vítimas dessa nacionalidade foi o tema central.
Enquanto tratava deste assunto, a tripulação do helicóptero que havia sido enviado para Birao, como apoio à procura dos criminosos, teve ontem uma noite muito dramática. Um dos pilotos faleceu, três outros estão em estado grave. Em coma. Beberam um líquido adquirido sabe-se lá onde, mas que tinha um rótulo de uma bebida espirituosa normal.
Foi o segundo incidente do género em duas semanas. Com pessoas da mesma nacionalidade. Embora estivesse em Vevey, por outros motivos profissionais, passei uma parte da manhã a falar com Moscovo. Mais tarde, com Nova Iorque e com a minha área de operações. A pedir que as autoridades do país dos pilotos sensibilizem as suas gentes, para que estes casos tão trágicos não voltem a acontecer.
O tema do meu escrito de hoje na revista Visão centra-se nas questões de segurança nas terras hostis do Sahel, incluindo na fronteira com o Darfur.
A minha tese é que certas organizações não-governamentais não estão a perceber a natureza dos riscos que existem nessa região. Agem como se a insegurança tivesse motivação política. E falam, a torto e a direito, da neutralidade que é preciso manter.
Mas a verdade é que não se trata de conflitos políticos. São actos de banditismo, de criminalidade pura e dura. Ameaças concretas contra as populações e contra os agentes humanitários. As Nações Unidas têm duas grandes operações de segurança na zona, a MINUAD. no Darfur, e a MINURCAT, no Chade e na República Centro-africana. Ambas têm como mandato proteger as organizações humanitárias, os refugiados e deslocados, bem como as populações locais, que são presas fáceis dos homens armados.
Ser protegido pela ONU não faz perder a neutralidade nem a independência das organizações. E permite continuar o trabalho de assistência, salvando muitas vidas em perigo.
Voltámos a ter uma emboscada, na estrada entre Abéché e Guéréda, no Leste do Chade. Este Sábado, pela manhã, homens com armas de guerra atacaram uma coluna de humanitários. Perto do campo de refugiados de Kounoungou, um sítio que alberga 19 mil pessoas que fugiram do Darfur.
O delegado do Governo, que sempre lutou ao lado das organizações humanitárias, ia na viatura da frente. Perdeu a vida. O corpo chegou ao fim do dia a N'Djaména, num voo especial do PAM, o Programa Alimentar Mundial.
Ontem à noite estive em contacto com a Delegada para o Chade do Comité Internacional da Cruz Vermelha. Discutimos a escalada da violência contra as organizações que operam na zona de fronteira, no Darfur e no Chade. A Cruz Vermelha não aceita escoltas de polícia ou militares. Mas face ao banditismo violento que agora se vive, que remédio...
Nas duas próximas semanas, a violência dos gangs criminosos e as relações entre o Chade e o Sudão vão ocupar todo o meu tempo.
Não vai haver muito espaço livre. Tenho a certeza que ninguém tem inveja de uma vida assim.
A minha escrita diária tem sido prejudicada pelas muitas viagens em que ando metido.
Acabo de passar uns dias ao Sol, nas terras quentes da fronteira com o Sudão. Levei comigo um pequeno grupo de embaixadores. Pessoas importantes, representando os grandes da cena internacional. Gostaram da volta. Estiveram em campos de refugiados e em áreas ocupadas por deslocados internos, viram as ONG em acção, as Nações Unidas e os nossos soldados e polícias. Aperceberam-se de que o ano agrícola foi mau. A maior parte das espigas ficaram secas, a meio caminho da germinação. Nem vale a pena proceder à sua colheita. Vamos ter um período de fome, dentro de pouco tempo. Uma crise humanitária que se irá juntar à de segurança.
Viram muita miséria. O embaixador chinês, que acaba de chegar a África, nem queria acreditar.
Os problemas, aqui por estas terras, nunca faltam.
Ontem foi um dia agitado. Primeiro, foi a viagem para Abéché. O jacto é rápido, mas estreito e com sete passageiros fica muito cheio. 'A chegada, primeiro telefonema na linha de urgência: um dos nossos aviões sem piloto acabara de se estatelar em Goz Beida. Trata-se de um modelo militar, com cerca de um metro ou pouco mais de comprimento, umas câmaras. Mas a primeira notícia foi que "...um avião havia caído."
Felizmente que é bem mais pequeno e muito mais barato do que um 747...
Mesmo assim, custa caro e causou agitação, chamadas telefónicas da presidência da república, do governador, do chefe que é general, de jornalistas...Podia ter caído em cima de muita coisa. Pessoas, casas, vacas, cabras, mesmo ums meras galinhas. Tivémos sorte. Foi esmagar-se perto do quintal do governador local, mas sem outros estragos. Embora pequeno, faz mossa. Mas a maior mossa foi a perda deste aparelho que tanto jeito nos faz, quando se trata de tirar umas fotos dos rapazes maus...
Depois, um dos nossos veículos foi atacado à mão armada em Farchana, no mercado da localidade, nas barbas de toda a gente. Passavam cinco minutos das 11 horas. Como era um carro da equipa de desminagem, tinha explosivos e outras pequenas maravilhas a bordo. Dois homens de metralhadora em punho, bandidos das terras bravas, levaram-no para o Sudão. As autoridades fronteiriças sudanesas colaboraram connosco e o veículo foi recuperado, já do outro lado da raia. O Leonardo, um grande oficial da PSP que é o nosso chefe de segurança na região, organizou uma expedição. Para recuperar a máquina e os bens. Assim acontecerá, mas é preciso ter paciência.
Seguiu-se a reunião com as ONGs internacionais. Para falar do medo que começa a existir, face à possibilidade de raptos. Uma grande nacionalidade ocidental é particularmente visada. Corre o boato, aqui e no Darfur, que esse país paga resgates...Logo, é um bom negócio apanhar gente com esse passaporte...
Continuei o dia tendo um encontro com os guardas prisionais. Ou melhor, com os nossos conselheiros em matéria de prisões. As condições de detenção são abomináveis. Os presos passam o dia acorrentados, para que não se escapem. Mesmo assim, muitos acabam por fugir. Só não precisam de ser guardados os prisioneiros que sabem que se voltarem para a sociedade serão eliminados pelos familiares das suas vítimas. Prisioneiros assim sentem-se em segurança nas prisões desta terra.
Seguiram-se reuniões sobre os direitos humanos, a questão do recrutamento de mulheres para a polícia, os soldados nepaleses que chegaram com armas mas sem munições, os soldados que estão destinados a ser uma força de intervenção rápida e que vieram equipados como se fossem meros sentinelas, o planeamento da transferência de um campo de 28 000 refugiados da zona da fronteira para uma outra localização.
Finalmente, chegou a hora de voltar a N'Djaména. Mais 800 quilómetros de distância a percorrer. No que seria para muitos um fim de dia bem preenchido. Mas não. Na capital, havia outras matérias à espera. Falar com Nova Iorque, enviar o telegrama das actividades do dia, ver em que ponto está a investigação para apanhar uns tipos que gostam de dar uns tiros de metralhadora nos trabalhadores humanitários, falar para Bangui, ver se os embaixadores do Conselho de Segurança sempre podem visitar o Leste em Outubro, etc, etc.
Mais tarde, passar ainda, cinco minutos, por uma recepção, só para marcar presença. E provar o vinho branco.
Chegar finalmente a casa, responder a uns mails, telefonar para o estrangeiro, preparar o blog, ler os jornais do dia.
Hoje perdi um tenente da Polícia chadiana. Tinha organizado uma perseguição nas terras desérticas do Nordeste, no seguimento do roubo de uma viatura 4X4, num campo de refugiados. O tenente e os seus homens foram no rasto dos bandidos. Nas pistas que levam à fronteira com o Sudão, no meio da areia e dos montes comidos por milhares de anos de vento do deserto. Os polícias das Nações Unidas seguiam na segunda viatura, em apoio ao tenente e à sua equipa.
Os bandidos, nestas terras, estão equipados de AK-47, metralhadoras ligeiras de grande eficácia. Prepararam uma emboscada, como resposta à perseguição. A viatura da frente foi varrida à bala. O tenente teve morte instantânea. Um outro polícia ficou ferido. O veículo dos Polícias das Nações Unidas guinou à direita, para fugir às balas e foi parar na duna mais próxima.
O Sol estava a pino. Era a hora do meio do dia.
O Tenente Abdallah Ismael foi enterrado em Iriba, no Nordeste do Chade, a 50 quilómetros do local do ataque, ao fim da tarde.
Como homenagem, convido o leitor a ir ao Google Earth e ver onde fica Iriba e o campo de refugiados de Am Nabak.
Ontem a minha equipa e eu dormimos em Koukou Angarana. A equipa dormiu em cima de burros do mato, uma cama de lona muito rudimentar, de conforto ainda mais rústico. Espalharam-se por toda a parte. Uns na varanda do meu quarto, outros na sala de jantar da subdelegação do Alto Comissariado para os Refugiados, outros ainda ao ar livre. Os mosquitos foram simpáticos e não morderam muito.
O leitor sabe onde fica Koukou Angarana? É uma localidade do Sudeste do Chade, a cerca de uma centena de quilómetros da fronteira com o Darfur. Abriga uma vasta população de refugiados sudaneses, bem como muitos deslocados chadianos.É uma zona de passagem das invasões rebeldes. A última foi entre 4 e 9 de Maio.
As populações estão muito traumatizadas. A insegurança faz parte do seu quotidiano. As mulheres só podem sair das aldeias e dos campos em grupos. Mesmo assim, são assaltadas com grande frequência. Violadas.
Os homens passam o dia a jogar e deitados debaixo das árvores. Vive-se uma mentalidade de assistido.
Quem não é muito assistido são os deslocados internos. Não há dinheiro para os que são refugiados no seu próprio país.
Hoje, estive a cerca de quinze quilómetros da fronteira com o Sudão. As gentes do sítio, os refugiados e outros, disseram que quase todos os dias ouvem tiros ao longe. De facto, perguntando bem, não é muito longe...
As ONGs são escassas nesta zona de fronteira. Perigo. Apenas Médicos sem Fronteiras e Action Contre la Faim. Os médicos fazem um excelente trabalho. Action tem poucos recursos.
Talvez o leitor queira visitar a zona, da próxima vez. Precisamos de gente que testemunhe. Mas, por favor, venha preparado para temperaturas de cinquenta graus, muito pó, nenhum conforto, muito desespero, mas gente amiga e hospitaleira. Hoje, em Dogdoré, no fim do mundo do Sahel, o Subprefeito tinha dois borregos assados à nossa espera. Uma delícia, que se come com as mãos, arrancando pedaços de carne do bicho mártir.
Gayle foi hoje sepultada no cemitério britânico de Cabul. Não a conhecia. Assassinada pelos extremistas religiosos associados aos Talibãs, no início da semana, enquanto trabalhadora de uma organização não-governamental humanitária a operar no Afeganistão, simboliza todos os que se dedicam 'as causas da paz e do desenvolvimento, de um modo voluntário, por vezes em condições extremamente difíceis e perigosas.
Nos últimos doze meses, 63 agentes de organizações humanitárias perderam as suas vidas, na Somália, no Afeganistão, no Sudão, no Chade e noutros países. A esse número haverá que acrescentar os 25 funcionários da ONU, que também foram vítimas da violência, em várias partes do mundo, durante o mesmo período.
O que nos perturba ainda mais e' que estas pessoas foram mortas não por acidente, mas sim por serem trabalhadores humanitários. Foram escolhidas propositadamente como alvos. Este e' um facto novo.
In and around Farchana, in the Ouaddai Region of Eastern Chad, there are four refugee camps, with a total of 87,000 people. They came from Darfur, in Sudan, the first batch in 2004 and they are still crossing in.
I spent time today listening to some of their representatives. They all would like to go back home and rebuild their lives. But they know that the Darfur situation is too complex and they might have to wait for a long while.
In the meantime, the resources to take care of them are getting thinner. Less money for food, for instance. The classrooms are too big, to save on teachers and materials, but how much can each one learn, if the class is about 150 children? Then, the women complained that they have not received any soap for the last two months. The malaria season is at its peak and there is not enough medicine.
But all in all, security remains the key issue. Outside the camps, for sure, but also inside. The national gendarmerie is doing its bit, but they lack resources, men, supervision and motivation. The local administration is well informed but there is no supporting structure, no administrative capacity to coordinate, respond or direct.
And nobody is ever brought to justice.
The deployment of the new generation of Police and Gendarmes, trained by MINURCAT, has to take place soon. Certainly before the end of the rainy season. The first group is now ready, but there is still some legal red tape to be addressed.