Nesta data em que o Reino Unido comemora os setenta anos de reinado de Isabel II, lembrei a um amigo português que não nos cabe julgar a questão monárquica de um país que não é o nosso. São os britânicos que têm uma palavra a dizer sobre o assunto. E a verdade é que a grande maioria tem a Rainha em grande apreço. Sendo assim, Isabel II tem toda a legitimidade democrática, mesmo sem ter sido eleita, para exercer as funções de Chefe de Estado.
A monarquia no Reino Unido é um elemento definidor da identidade nacional. Enquanto estrangeiros, não podemos de modo algum criticar essa opção do povo britânico. E ao dizer isso, não ficamos menos republicanos.
O link acima abre o meu texto desta semana no Diário de Notícias. Publicada ontem, esta crónica olha para os possíveis movimentos migratórios que a nova situação afegã pode originar, tendo sempre presente a perspectiva europeia e a acção política.
Cito, de seguida, um extracto da minha crónica. É um parágrafo final, que resume uma parte importante da questão.
"Os diferentes estados europeus estão dispostos a acolher quem trabalhou diretamente com as suas forças militares. Mas não têm a intenção de ir mais além. Aos habituais Viktor Orbán e companhia, junta-se agora uma nova vedeta, o Chanceler austríaco Sebastian Kurz. E as redes sociais já estão cheias de teorias catastróficas sobre o impacto que adviria de um aumento da proporção de muçulmanos em terras europeias. Sem esquecer, dizem, os possíveis perigos de atentados terroristas. A realidade é que aqui, na UE, como noutras partes do mundo, as questões de identidade cultural estão cada vez mais no centro da agenda política."
O meu amigo passa os dias a dizer que somos os melhores do mundo. Respondo-lhe que isso é populismo barato. Não contribui um grama ou milímetro que seja para a resolução dos nossos problemas. Também não nos ajuda a ter uma visão mais equilibrada da nossa intervenção fora de casa. No fundo, andar a espalhar essa pretensão faz de nós uns meros bacocos. Badalamos o sino, olhamos para a nossa capela e acreditamos que estamos a competir com a Sistina.
A verdade é que uma aldeia de simplórios não voa muito alto. Sobretudo nestes tempos, que exigem muita argúcia.
O meu amigo presta-nos um mau serviço. Sendo quem é, poderia puxar-nos para a frente em vez de nos entreter com uma ilusão parola. Mas acha que fica melhor na fotografia se pintar um céu azul.
A União Europeia é acima de tudo um projecto político. Muito complexo, na medida em que engloba vários Estados, que têm particularidades próprias, diferentes identidades culturais e um sentimento nacionalista com profundas raízes históricas. Têm, igualmente, níveis de desenvolvimento económico distintos. Mas o projecto político existe e deverá continuar vivo, com o apoio de uma grande parte das populações europeias.
O objectivo fundamental é o de consolidar um espaço comum de segurança, direitos e prosperidade. É nessas três áreas que cabem muitas das iniciativas que têm sido levadas a cabo, ao longo dos tempos. Será, ainda, sobre essas áreas que se tem que dar exemplos do que já foi conseguido e do que se procura fazer no futuro.
Perante a complexidade e ambição do que se pretende construir em conjunto, seria um erro reduzir o discurso político sobre a União Europeia a uma dimensão só. Continua-se, no entanto, a assistir a esse tipo de reduções, que limitam o projecto à Europa Social, ou à Europa do Capital, ou à transferência de poderes das capitais nacionais para as instituições europeias.
Esses discursos só podem ter como explicação uma de duas coisas: ou se trata de uma simplificação ingénua do que é a UE ou estamos perante uma perspectiva de combate ideológico, um ataque que na realidade se destina a minar a prossecução do plano que nos une e faz mais fortes.