A grave crise provocada por Vladimir Putin tem servido para destapar muitas carecas. Gente que andava na praça pública de capachinho ou com o boné enviado até às orelhas veio agora a público mostrar a sua cabecinha. Não há nada como um mau Putin para nos ajudar a separar as águas.
A experiência ensinou-me que o problema não consiste em o governo ser de esquerda ou de direita. Muitas vezes, as diferenças programáticas entre ambos os lados são apenas ligeiramente perceptíveis. Não há grande diferença entre o Manuel e a Manuela.
O problema da governação existe quando nos defrontamos com uma mistura desastrosa que combina incompetência com oportunismo. À esquerda ou à direita, líderes incompetentes e trapaceiros trazem para o poder afilhados e apaniguados igualmente nulos, gananciosos e corruptos. Os que mandam rodeiam-se de quem não os ponha em causa. Fica tudo ao mesmo nível de inépcia, de mesquinhez e de cupidez.
Certos intelectuais continuam a tentar explicar as mudanças políticas que se vivem nalguns países europeus com uma longa referência à “crise dos sistemas financeiros”. Mas, não se percebe bem que crise é essa.
Sim, assistimos, nalguns países, incluindo no nosso, a graves problemas relacionados com a dívida pública e o impacto que tiveram sobre a situação económica, a doméstica e a da vizinhança. Sim, vimos vários bancos em dificuldades, aqui, na Grécia, em Itália, Chipre, etc, mesmo no Reino Unido. Sabemos, todavia, que na base desses problemas estavam más decisões de gestão, créditos atribuídos por razões políticas e amizades corruptas, para além dos desafios resultantes de um crescimento económico negativo ou anémico. Sim, fomos testemunhas da expansão e da globalização dos mercados financeiros, de uma penetração muito significativa de capitais estrangeiros nas economias europeias, de uma concorrência de um novo tipo, de proporções nunca vistas.
Tudo isso provocou e continua a causar instabilidade e, nalguns casos, grandes rupturas nos sistemas financeiros. E temos mais tempestades à vista: o Brexit sem acordo, a confrontação comercial entre os Estados Unidos e outras grandes economias, a dívida pública italiana, ou ainda, o possível colapso de um par de grandes bancos bem como a revolução que a Inteligência Artificial irá ocasionar. Com a internacionalização dos mercados de capitais e a rapidez dos fluxos financeiros, uma gripe num sítio pode facilmente transformar-se numa pneumonia mais além, nas economias frágeis e dependentes do exterior.
É evidente que estes fenómenos criam insegurança e grandes receios. Muitos cidadãos têm medo e sentem-se impotentes . E quando olham para o poder político, para o funcionamento das instituições, não ficam tranquilos. Em muitos casos, os mais fracos não vêem na liderança política quem se interesse verdadeiramente pelas suas preocupações. Antes pelo contrário. Os políticos parecem andar num outro planeta. E quando se aproximam, soam a falso, dir-se-ia que lhes falta a sinceridade. O empenho.
É aí que encontramos as chamadas crises políticas. Os movimentos de radicalização. O baralhar das cartas e o aparecimento de outros ases, nem sempre da melhor cepa. E assim, o edifício político, que as nossas democracias europeias foram construindo, passa a enfrentar grandes tremores e parece estar prestes a desabar. Por isso se fala tanto de crise política.
Na verdade, é a questão da representatividade que está em jogo. O debate deve começar por essa questão. Quem nos representa e como?
Se eu fosse dirigente de um partido político, a minha mensagem programática seria construída à volta de três verbos. Dignificar. Simplificar. Proteger.
O diálogo com os meus concidadãos teria sempre como objectivo aprofundar o significado, o conteúdo e a relevância de cada um desses verbos.
Escrevo muitas destas palavras com um lápis. É um truque. Ou, talvez apenas, uma ilusão. Mas, conta. Ajuda-me a ter sempre presente que tudo é precário, que pode ser apagado facilmente ou mudar de tom. Sobretudo quando se trata de coisas políticas.
Tentar apaziguar os extremistas não é solução. Os extremismos, radicalismos e outros populismos não se combatem com cedências ou alianças, mais ou menos disfarçadas, com esses fanáticos. Conceder encoraja, abre espaço, permite dar a ilusão a um certo número de eleitores que os radicais têm razão, que lutam ajuizadamente pelos interesses do povo, como eles gostam de dizer. Com o tempo, esses movimentos aproveitam o espaço político assim criado e acabam por dominar a agenda, a narrativa e a liberdade de opinião. Na sua essência, os movimentos radicais são a antecâmara de um regime de ditadura.
A história da Europa do século XX mostra que os extremistas entraram na esfera do poder por meios constitucionais, em governos de minoria. Depois, pelo uso da demagogia, do engano, da sabotagem e da manipulação do ódio de massas acabaram por dominar e impor, de modo categórico e violento, a sua agenda. No final de um processo deste género surgiu sempre uma tragédia nacional.
Por tudo isto, a única maneira acertada de tratar essas correntes de pensamento passa pelo isolamento político, uma espécie de quarentena permanente, pelo denúncia da natureza nefasta dessas ideologias, enquanto fantasias perigosas, irrealistas, excluidoras, espoliadoras e totalitárias. Passa, em resumo, pelo combate político a sério, pacífico mas corajoso, que isso de dar tréguas aos facciosos e a outros sectários só lembra aos oportunistas com vistas curtas.
Os terríveis incidentes, que ontem aconteceram em Barcelona e noutras partes dessa região de Espanha, lembram-nos que as ideias extremas são uma ameaça permanente, aqui e em vários países do mundo.
O combate contra o terrorismo requer serviços de polícia altamente preparados. Mas não só. Exige, igualmente, um combate ideológico corajoso e franco. É preciso repetir, e voltar a dizê-lo, que os extremismos totalitários, incluindo os que se escondem por detrás do nome da religião, constituem aberrações criminosas e que como tal devem ser tratados. Convém acrescentar, mais ainda, que, nas nossas sociedades democráticas, o terror perde, e perderá sempre. Não há vitórias baseadas na violência contra as pessoas!
O jornal diário belga “La Libre”, que é uma instituição no círculo da imprensa francófona do país, acaba de realizar um inquérito sobre a tradicional questão que tem dividido a política, a Direita contra a Esquerda e vice-versa.
O resultado revela de certa maneira aquilo que a candidatura de Emmanuel Macron tem estado a mostrar, não apenas em França mas noutras sociedades europeias. Para uma parte do eleitorado, a classificação de Esquerda ou de Direita perdeu o sentido que tinha. Já pouco significaria. Assim, mais de 64% dos inquiridos acham que a clivagem entre os dois campos está ultrapassada. Os novos desafios não se enquadram nem à esquerda nem à Direita.
Será que a agenda política nestes países terá perdido uma boa parte da sua dimensão classista? Será que ser progressista ou conservador tem hoje um outro significado? Ter-se-á entrado num período da nossa história em que as posições se definem noutros termos?
A verdade é que se diria que os debates sobre os comportamentos sociais, incluindo as novas formas de organização das famílias, ou sobre a imigração, a globalização, a segurança, os direitos humanos, e outras grandes questões internacionais, levam a uma vida política mais complexa que a simples separação entre ser de Direita ou de Esquerda. Hoje, vemos partidos que nalgumas destas matérias seriam tidos como de direita enquanto noutras defendem posições que sempre foram associadas ao lado oposto.
Há cada vez mais informação disponível. As fontes são múltiplas e o material produzido vai muito além da nossa capacidade de o ter em conta.
Este facto deve fazer-nos reflectir sobre o que deve ser a nossa intervenção escrita. E também sobre o estilo dessa mesma escrita. Não se pode escrever hoje como se escrevia quando o livro era rei e o jornal diário o seu mais fiel servidor.
Mas também nem tudo pode ser redigido como se redige um texto de 140 caracteres para o twitter. Mesmo reconhecendo a importância dos tweets. Uma importância que Donald Trump e os seus souberam aproveitar com um grande sentido de oportunidade. Divulgaram dezenas de milhares de textos curtos, frases acutilantes, embora muitas vezes fora do espaço da verdade. Mas a verdade é que ganharam a guerra da informação e da intoxicação.
Este blog foi dos primeiros a escrever sobre a catastrófica situação a que sucessivos governos e interesses partidários do chamado “centrão” conduziram a Caixa Geral de Depósitos. Os anos da governação Sócrates foram particularmente desastrosos para a Caixa, que foi emprestando dinheiro a torto e a direito, sem qualquer outro critério que não fosse o da roubalheira e da negligência criminosa. Os de Passos Coelho foram anos de empurrar o problema para a frente, a fingir que este não existia.
Agora o cidadão vai pagar uma vez mais a conta. Trata-se de pôr o banco de pé, dizem. Eu acrescento que se trata acima de tudo de criar as condições para que a interferência política volte a acontecer. Não houve vergonha no passado. Seria ingénuo pensar que a haverá agora e nos próximos anos.
Os partidos querem controlar os bancos para poderem satisfazer as suas clientelas. É o saque organizado sob o lema do banco público.