Estou em fim de viagem, mas, mesmo assim, quero dizer, alto e bom som, que a Comissão Europeia e os ministros dos Negócios Estrangeiros europeus estão todos, face à crise humanitária na fronteira entre a Líbia e a Tunísia, a dar a impressão de andarem a apanhar bonés.
Aquela conversa bonita, muito intelectual, cheia de referências a estratégias, que de vez em quando ouvimos, é só para disfarçar a incompetência.
Uma vergonha.
Uma grande falta de sentido de responsabilidades e de coragem política.
A verdadeira face da crise traduz-se nos números crescentes do desemprego. Cada número esconde uma pessoa e em cada pessoa esconde-se um drama.
Uma política de combate à crise passa, antes de tudo, pelo incentivo à manutenção dos postos de trabalho e pela formação profissional para novos tipos de emprego. Só que, neste momento, não se entende qual é a política de emprego do governo. Qual é a estratégia. Apenas se observam reacções após os acontecimentos, uma reposta a reboque da crise. Sem capacidade de antecipação.
Os centros de emprego e formação profissional são, por outro lado, buracos sem fundo, de funcionários afogados na sua própria inaptidão funcional. Um desespero, para quem tem que lidar com eles.
Com vários dirigentes políticos, nacionais e locais, a viver na zona cinzenta que define a corrupção, o ideal seria que se juntassem todos num partido único, uma nova formação, que poderia ter Alcochete como sede, Felgueiras como centro de estudos, Oeiras como campo de treino, a conta estaria no BPN, o símbolo seria o loureiro, a árvore, a supervisão estaria a cargo do Banco de Portugal, e assim sucessivamente, que membros activos não faltariam a este partido de gente esperta, que o medo seja louvado, e a falta de justiça nos assegure a vida eterna.
As notícias que me trouxeram de Lisboa dizem que a cidade está cada vez mais suja, mais desordenada, mais mal gerida, a cair de podre e de incompetência.
É a porta de entrada em Portugal.
Segundo parece, muitos dos portugueses de Lisboa passam ao lado. Terão outras preocupações, ou tornaram-se cegos...
E a Câmara Municipal serve para quê? Só para atribuir casas baratas aos senhores influentes da política?
O que o Presidente da República declarou ontem, em Odemira, quando falava da questão muito séria do aumento da criminalidade violenta, é que falta uma estratégia adequada, capaz de responder aos novos contornos que o problema da insegurança apresenta hoje em Portugal.
Que o Presidente tenha que o dizer, em vez do governo, que tem a responsabilidade executiva na matéria, é um facto político de monta. Significa, fundamentalmente, que o Governo passou a ser apenas uma administração a reboque, que reage tardiamente em vez de prevenir. Está a transformar-se, como acontece em muitas partes do mundo, numa administração paralisada pelo medo de cometer erros e perder apoios.
Há que mostrar que a crise tem custos políticos para alguns dos membros do Governo, os directamente ligados à questão da segurança e ordem interna. Sem um gesto significativo, incluindo em termos da responsabilidade ministerial e da necessidade de mostrar que se quer levar, a partir de agora, a questão muito mais a sério, o Governo arrisca-se a perder novos pontos no que respeita à sua imagem de eficiência. Uma imagem que está cada vez mais em riscos de ser alienada.