A eleição do ministro das Finanças da Irlanda, Paschal Donohoe, como líder do Eurogrupo e sucessor de Mário Centeno deve ser vista como uma vitória das ideias económicas e orçamentais liberais. Também representa um triunfo para os países do Norte da Europa, que defendem uma linha de menor intervenção estatal na economia e impostos mais baixos para as empresas. Donohoe é um político do centro-direita, a família política que neste momento mais pesa na União Europeia. É muito vivo e explica-se bem. Por isso e por ter o apoio dos Estados economicamente mais saudáveis, pode-se esperar que desempenhe um papel activo na presidência do Eurogrupo. Terá, no entanto, que encontrar um ponto de equilíbrio entre a sua preferência pelo liberalismo económico e as políticas mais intervencionistas preconizadas pela França, Itália e Espanha.
Os principais bancos europeus vivem momentos de grande incerteza, devido às dívidas soberanas.
Ontem UBS, o banco suíço, dizia-me que tem apenas um pouco mais de 4,2 mil milhões de euros em obrigações do tesouro de países europeus com algum grau de dificuldade. Cerca de 3 mil milhões dizem respeito à dívida do Estado italiano e apenas 100 milhões têm que ver com a Grécia. Não haveria, neste caso, razoes para preocupações.
Hoje, por outras vias, fiquei a saber que os grandes bancos estão a prever uma insolvência grega da ordem dos 60%. Este é um valor muito superior ao que havia sido previsto durante a última cimeira europeia, em Julho. Nessa altura, a percentagem que servia de base de trabalho era 21%.
Prevêem em relaçãoà Irlanda e a Portugal um incumprimento de 40%.
E no que respeitaà Itália, a perda seria da ordem dos 20%.
Estes valores, se não forem compensados por participações dos Estados mais ricos da Europa, levarão vários bancos àinsolvência.
Com uma situação destas, os próximos dias, vésperas da cimeira europeia do fim-de-semana, serão de grande ansiedade.
A cimeira da UE transformou uma boa parte da dívida grega em dívida a longo prazo e outra, em dívida perpétua. Sem contar que haverá igualmente uma insolvência parcial, a primeira no mundo Ocidental, desde o fim da Segunda Grande Guerra.
São medidas importantes. Não reconhecem, no entanto, que sem um investimento maciço na economia do país e sem mudanças profundas na política económica, a começar pela privatização do que pode ser privatizado e a abertura à concorrência de certas actividades até agora protegidas por medidas legislativas arcaicas e corporativistas, a Grécia não conseguirá sair do processo declínio em que hoje se encontra.
Entretanto, a influência de Angela Merkel saiu reforçada. Como van Rompuy viu as suas atribuições serem ampliadas.
Portugal e a Irlanda vão beneficiar por tabela, com juros mais baixos, equivalentes aos da Grécia e com prazos de reembolso mais alargados. Mas não convém esquecer que uma extensão do período de reembolso significa, também, um alargamento do prazo durante o qual a política económica de ambos os países vai estar sob a supervisão apertada do FMI e da UE.
Finalmente, numa nota mais leve, diz-se que anda em Bruxelas, nos corredores do poder, um fantasma pesado e quase invisível. Quando aparece, por se vestir de presunção, desempenha um papel patético.
O mal-estar entre os ministros das finanças europeus mais importantes é evidente. Vem no seguimento das declarações do PM Sócrates, ao dizer que as condições do programa de ajuda financeira eram mais favoráveis, no caso de Portugal.
A Grécia e a Irlanda também não acharam graça a essas declarações de "vitória". Aproveitaram, no entanto, a boleia. Sobretudo, a Irlanda. Pediu, ontem, uma revisão das taxas de juros que lhe são aplicadas.
O oportunismo e a má-fé políticas, mesmo ocorrendo num canto perdido da Europa, acabam por fazer mossa noutras terras também.
O discurso de tomada de posse de Cavaco Silva tem umas partes técnicas, que talvez não fossem necessárias numa intervenção deste género, sobretudo as referências às variáveis macroeconómicas, mas também tem uma série de verdades políticas. No conjunto, faz um bom diagnóstico da situação, dramática, no meu entender, em que se encontra o país.
Só razões de mero partidarismo, que não são razões ideológicas, mas sim de clubismo, podem levar a que não se aceite o que o Presidente disse esta tarde. Os eternos optimistas, que na realidade o não são, fingem, apenas, pois sabem bem em que ponto se encontra Portugal, juntam-se assim aos estreitos de ideias e aos psicopatas do radicalismo pouco inteligente e dizem que não gostaram.
Entretanto, os mercados mostraram, hoje, que não acreditam em economias falidas e em governos manhosos ou incompetentes. Os juros que exigem a Portugal, à Irlanda e à Grécia revelam o que muita gente, influente nos negócios internacionais e na política global, pensa desses países.
A Espanha e a Itália têm uma imagem apenas um pouco melhor.
Nestas circunstâncias, a cimeira do euro, nesta Sexta-feira e a de toda a UE, mais perto do final do mês, nãovão conseguir chegar a um acordo sólido e credível. É que os problemas dos países europeus em crise são bem mais profundos do que as medidas de austeridade parecem fazer crer. São problemas estruturais que só poderão ser resolvidos com base em grandes reviravoltas em cada um dos países em causa.
O Conselho Europeu de fim de ano terminou esta tarde. Desde então, o Euro perdeu valor. Apesar da aprovação do mecanismo financeiro de estabilização do Euro, de que os países fogem como o Diabo da cruz, ninguém quer ser visto a bater a essa porta, e também apesar da encenação da reunião do Conselho ter sido preparada para dar uma aparência de calma e unidade de propósito, ao nível dos líderes.
Entretanto, o BCE continua a ser a única tábua de salvação de certas economias. Na semanapassada, o Banco adquiriu 2.67 mil milhões de Euros de papéis públicos e de obrigações do tesouro da Irlanda e de Portugal. Este tipo de intervenção não é sustentável, a prazo. É uma medida de curtissimo prazo, que apenas serve para adiar os problemas.
Nos mercados, a Irlanda atingiu a casa dos 8.3% e Portugal viu a sua taxa de juros andar pelos 6,47%. Em ambos os casos, tratam-se de valores insuportáveis para essas economias. Mais tarde ou mais cedo, vai haver gente chamuscada.
Mas, está tudo sob controlo, dizem-nos, na frente ocidental.
Ou seja, vamos para férias de Natal tranquilos, embora sem nada resolvido.
gastou2,67milmilhoesdeEurosnacompradeobrigacoesdo Tesouro e outro certificados de dívida publica da Irlanda e de Portugal
As mensagens provenientes da Alemanha, sobre a crise da Irlanda, e efeito dominó na Península Ibérica, sobre as sanções a aplicar a quem não for disciplinado, a maneira como ignoram os senhores de Bruxelas, o voto de inutilidade que conferem ao Parlamento Europeu, todas essas mensagens parecem muito confusas. Dão a impressão de que não há uma opinião coerente sobre a situação.
Mas, a minha análise é diferente. Berlim sabe o que faz e o que diz. A confusão aparente talvez não seja confusão alguma. Talvez haja um plano a prazo sobre uma reorganização das relações políticas e económicas na Europa. Ou seja, uma estratégia relacionada com uma nova configuração europeia, que, para já, se esconde por detrás de uma retórica que deixa muitos de nós perplexos.
A greve geral de amanhã tem lugar no momento em que a crise na Irlanda chama a atenção internacional para Portugal e Espanha. É uma daquelas coincidências que mais valia não terem acontecido. Saber que Portugal precisa de produzir e ver o país parado, em revolta profunda, não deve ajudar muito os que, por esse mundo fora, estariam dispostos a investir algum capital nestas bandas.
Por outro lado, certas empresas, já em grandes dificuldades, vão perder mais uns cobres com a paralisação. No caso da TAP, dizem-nos que a acção laboral vai trazer um prejuízo de 4 milhões. Não sei se este número não estará exagerado. Mas, que a greve vai agravar o défice da transportadora aérea, não tenho dúvidas. E depois, quem tapa mais este buraco? Os contribuintes, claro.
Compreendo, sem qualquer tipo de ambivalência, o mal-estar e descontentamento dos cidadãos. A crise da economia portuguesa e das finanças públicas empobrece, nalguns casos, de modo drástico, uma população já pobre à partida. Sempre me considerei do lado dos que trabalham e dos que lutam contra a pobreza. A minha história de vida assim o mostra.
Mas, a greve geral, serve para quê, exactamente? Cerca de 80% dos inquiridos por um jornal diário - o Público - pensa que a greve não vai contribuir para a melhoria das condições de vida dos portugueses. É verdade que não se trata de um inquérito científico. Mas, dá um resultado curioso.