Temos um sistema de administração de justiça incompreensível. Um homem sequestrou durante oito meses uma rapariga menor, fechando-a num quarto, com o uso da coação, a mais de 200 km da casa da jovem. Foi apresentado hoje ao tribunal e o juiz disse não ter encontrado razões para mandar deter o homem, enquanto aguarda julgamento. Foi mandado para casa, com apresentações periódicas à polícia. Se isto tivesse acontecido num país europeu e não em Portugal, o indivíduo ficaria na prisão até ao momento do julgamento. Mas nós temos os juízes que temos, no país que é este.
Não podemos ser a favor de um Estado de Direito e, em simultâneo, pensar que a política está acima das leis, das regras jurídicas e dos mecanismos de administração da justiça. A política deve ser feita dentro de um quadro legal claramente definido. E os políticos têm que estar conscientes que, se pisam a linha da ilegalidade, deverão ter que prestar contas. Essa prestação de contas far-se-á perante juízes devidamente mandatados para o fazer. Quando isso acontece, não se poderá falar de judicialização da política. Dever-se-á, isso sim, dar graças ao sistema que temos, que permite colocar perante um juiz um político que, de uma maneira ou outra, abusou do mandato democrático que lhe foi concedido.
Tudo isto pressupõe, como é fácil de entender, que existe uma magistratura independente, competente e auto-disciplinadora. Para a saúde da democracia, é fundamental que os juízes tenham um estatuto que os proteja, uma preparação adequada e mecanismos próprios para limpar, no seu seio, o trigo do joio.