Contrariamente ao que diz Vladimir Putin, o Ocidente não tem a intenção de dirigir o mundo. Não se trata de definir as regras e fazer os outros obedecer. As regras existem, foram sendo construídas por todos, pela comunidade das nações, ao longo de décadas. Dizem respeito ao respeito pela dignidade humana, às liberdades e à segurança das pessoas. O que se pede é que sejam reconhecidas e praticadas, sem excepções.
Se a Nova Ordem Internacional reconhecer regimes ditatoriais como modelos, só porque são grandes potências – estou a pensar na China e na Rússia –, então deixem-me continuar na ordem actual, que reconhece as liberdades individuais e os direitos humanos. Na verdade, a ordem mundial que quero ver estabelecida é uma que respeite as pessoas, que lhes permita viver em paz e segurança, e com dignidade. Por isso, é fundamental lutar pela primazia dos valores sobre a força, pelo valor da vida de cada cidadão e pela necessidade de aprofundar a cooperação internacional. E o respeito pela natureza, pelo equilíbrio ecológico, pela renovação dos recursos naturais.
É nesse sentido que o mundo pós-pandemia e pós-agressão russa deve evoluir. É isso que os cidadãos de Myanmar, do Burkina Faso, da Nicarágua, da Síria, da Ucrânia, da Rússia e muitos outros ambicionam.
Acho importante que se debata o que significa construir um mundo novo.
Agosto foi um mês de paragem para mim. Mas tive várias vezes a vontade de comentar porque o mundo não parou para férias e o mês teve uma abundância de acontecimentos marcantes. Ao olhar de modo rápido para as semanas que passaram, vejo que a agressão contra a Ucrânia e todas as consequências daí resultantes, as questões do clima – secas, fogos e inundações – e da instabilidade política, incluindo no país de Donald Trump, continuaram a preencher as páginas principais das notícias. E a anunciar uma rentrée e um final de ano bem complicados. Com consequências directas no poder de compra e na vida das famílias.
O regresso deste blog coincide com a divulgação do relatório do Alto-Comissariado para os Direitos Humanos, um organismo da ONU, sobre as violações sistemáticas do direito à vida, à liberdade e à sua cultura das populações uigures da província chinesa de Xinjiang. O documento documenta uma política e uma prática repetidas de crimes do Estado chinês que podem ser considerados como crimes contra a ordem internacional, por serem crimes contra a humanidade, de discriminação étnica e de punição colectiva de pessoas por razões culturais, religiosas e raciais.
Para além de tudo o mais, o relatório deve fazer-nos pensar numa questão que é cada vez mais premente: como devem as democracias relacionar-se com as ditaduras e os regimes que abusam da força para espezinhar os direitos mais fundamentais dos seus próprios cidadãos? Esta é uma questão que não pode continuar a ser varrida para debaixo do tapete.
O negacionismo e os movimentos contra a vacina da Covid dão espaço aos frustrados da vida, aos primários radicalizados e violentos para se mobilizarem. Não devem, no entanto, ser impedidos de se manifestarem, desde que tais manifestações respeitem as normas democráticas, a propriedade alheia e a livre circulação dos outros cidadãos. Quando isso não acontece, e a opção que tomam é a da violência, do bloqueamento das vias públicas, da agressão às autoridades responsáveis pela manutenção da ordem e das liberdades de todos, a resposta deve ser firme. E ter consequências criminais.
Assim aconteceu ontem em Paris. E assim está já a acontecer em previsão da manifestação de amanhã em Bruxelas. No caso belga, a polícia previu o encaminhamento das viaturas dos manifestantes para o enorme parque de estacionamento do Heysel, que dispõe de 10 mil lugares à entrada da cidade. A partir daí, os manifestantes terão que utilizar os transportes públicos para chegar ao local de concentração. Ou seja, poderão manifestar-se, mas não estarão autorizados a bloquear a cidade com os seus veículos. É uma medida equilibrada. E um bom exemplo.
Cerca de 10 mil extremistas de direita juntaram-se hoje no centro de Viena para protestar contra o governo, que é conservador e de direita, diga-se, contra a imposição do uso de máscaras e contra o confinamento.
Foi uma manifestação que mostrou claramente que as ameaças à democracia representativa estão a ganhar força. Tratou-se de mais um exemplo de como os ultras e as diversas correntes antissistema e neofascistas se preparam para explorar a crise que estamos a viver na Europa. Com o tempo e se não forem travados, estes grupos acabarão por representar um perigo muito sério para as liberdades no espaço europeu.