O Orçamento de Estado para 2009, hoje aprovado na Assembleia da República contra os votos de todos os partidos, com a excepção fiel e submissa dos deputados do PS, parte de um cenário económico pouco realista. As previsões de receita, quer em termos de IVA, quer de outras tributações, são excessivamente optimistas. Melhor dizendo, não têm qualquer fundamento técnico, são meras construções políticas para ganho do partido do governo.
Numa altura em que é evidente para todos que a zona euro está em contracção económica, é absolutamente injustificado construir um cenário orçamental como o que hoje foi aprovado. As receitas, quando os nossos parceiros económicos europeus estão a atravessar um período de recessão prolongada, irão necessariamente ser inferiores aos valores previsitos.
Se, por outro lado, as despesas forem realizadas como programadas no OE, o que irá certamente acontecer por ser preciso captar votos e por isso fazer obra que encha o olho, o ano de 2009 verá o défice das contas do Estado agravar-se de um modo muito significativo.
Há aqui, meus amigos, uma tentativa deliberada de engano público e de caça aos votos. Que nada tem que ver com a democracia avançada que dizemos querer construir. Nem com uma Esquerda responsável.
Que tristeza andar-se a discutir se o salário mínimo em 2009 deve ser 450 Euros ou não.
Em política e em economia, uma média de salários mais elevada, dentro do razoável, claro, tem a vantagem de exercer um estímulo sobre a actividade económica. Essa e' a experiência na Suíça, nos países nórdicos e mesmo dos Estados Unidos. Um maior poder de compra , mesmo a um nível tão baixo como o de 15 Euros por dia -- o que se consegue fazer, em termos familiares, com esse montante diário? Apenas fome e milagres, creio... -- faz sempre aumentar o consumo, e atrai uma maior produção de bens e servicos.
A não ser que tudo seja importado...
Assiste-se 'a discussão do Portugal dos mínimos...
Em África, antes de uma visita presidencial a uma qualquer localidade, procede-se 'a pavimentação da estrada que leva ao lugar, 'a pintura dos edifícios que se encontram no itinerário oficial, compram-se bibes novos para as crianças das escolas, e distribui-se dinheiro sonante aos notáveis locais. Muitas destas coisas são feitas 'a última hora. Não só por não corresponderem a nenhum plano de longo prazo, mas por que se procura um efeito imediato, que se sabe ser de pouca duração, e por isso, tem que ser feito muito próximo do dia da festa.
Em Portugal, os métodos serão diferentes, mas a esperteza política e' muito parecida. Os meios passam por um orçamento de Estado cheio de prendas -- salário mínimo a crescer para além do que e' habitual, pensões e subsídios para a terceira idade, revisões salariais acima da inflação, pela primeira vez em quatro anos, escolas e serviços sociais a proliferar como cogumelos depois de um dia de chuvas, obras públicas e projectos anunciados com a fartura de quem sabe que e' para adiar, passadas as eleições, etc. A manha e' a mesma, a de procurar o máximo efeito antes do dia E.
Como dizia um dia um amigo Africano, o ideal seria convidar o Presidente a visitar-nos todas as semanas. Ou, em Portugal, organizar eleições todos os anos...
Foi agora a vez, de um modo concertado, de os bancos portugueses anunciarem que pretendem utilizar a facilidade de 20 mil milhões de Euros criada pelo Governo para apoio da estabilização financeira.
Surpreendeu-nos o anúncio feito em simultâneo, o que indicara' que a crise e' bem mais séria do que aquilo que se pensa. Não nos surpreendeu, todavia, o facto dos bancos portugueses estarem também a precisar de recursos financeiros frescos.
Mas o que mais continua a surpreender-nos de maneira muito particular e' de que pouco se fala da crise que se vive em Portugal, e das dificuldades que se projectam no horizonte próximo . O próprio orçamento do estado passa ao lado, como cão por vinha vindimada.
E' verdade que os Portugueses estão habituados a sofrer, e assim, mais crise, menos crise, que diferença fará?
Um dos meus colegas, que gosta de falar comigo sobre a economia, disse-me que uma sua cunhada e um certo número de outros empregados da mesma firma farmacêutica internacional, estabelecida há vários anos em Portugal, haviam sido notificados hoje de que iriam perder o emprego, devido ao abrandamento da procura.
Depois li que o director-geral do BIT (Bureau Internacional do Trabalho) prevê um acréscimo de mais de 20 milhões de novos desempregados em 2009, como resultado da crise económica que muitos países atravessam.
Falei, ao fim do dia, para a Bélgica. Na conversa, disseram-me que a multinacional Acelor Mittal, da indústria do aço, vai colocar centenas de trabalhadores da sua fábrica de Gand numa situação de desemprego parcial, dois dias por semana, por falta de encomendas.
Perante estes factos e outros, por que será que os nossos políticos, ao discutir o orçamento do Estado para 2009, não colocam as questões do emprego no centro do debate? Será que não vêem o problema?
O desemprego esta' a entrar-nos em casa, meus senhores.