Hoje, para mim, o destaque vai para o comportamento corajoso – corajoso é uma palavra insuficiente para descrever a intrepidez do acto praticado, num contexto da governação terrorista que se pratica no Irão – da equipa nacional de futebol. Ficaram silenciosos quando o hino nacional do Irão foi tocado. Mostraram, assim, a sua solidariedade com o povo do seu país, que anda há semanas nas ruas das principais cidades a pedir a demissão do líder religioso supremo e a liberdade. Perante povos assim, sinto que somos pequenos.
Hoje celebra-se o Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto. Pessoalmente, considero o dia como particularmente importante. Trata-se de crime que ocorreu no passado recente da Europa, que vitimou milhões de inocentes. O dia lembra-nos não apenas esses milhões de vítimas, mas também que uma barbaridade desse tipo e tamanho ocorreu num dos países mais avançados do continente europeu. Ou seja, que o radicalismo político e a xenofobia podem acontecer nas nossas paragens e que por isso devem ser firmemente combatidos, logo que saiam para a praça pública. O holocausto mostrou que a selvajaria e o ódio podem levar a situações absolutamente abomináveis, mesmo nas sociedades mais avançadas.
Os movimentos radicais da extrema-direita estão a tentar aproveitar-se das restrições que a nova vaga de coronavírus impõe para organizar manifestações de rua e criar novos segmentos de contestação da ordem democrática.
As manifestações que ocorreram este fim de semana ou nos dias anteriores, nos Países Baixos, Bélgica e Áustria, mostraram que os extremistas de direita têm alguma capacidade de mobilização. São, por isso, um perigo. Agravado ainda, porque essas manifestações oferecem oportunidades aos anarquistas e a outros niilistas para destruir e pilhar bem como para criar situações de mal-estar social, de insegurança colectiva e de descrença na capacidade das instituições democráticas de manter a ordem pública.
O grande desafio para os democratas é conseguir fazer chegar aos cidadãos mensagens de moderação, de tranquilidade e de respeito pelas autoridades, a começar pelas que são responsáveis pela saúde pública.
É importante que se entenda que estão em jogo duas questões fundamentais. Por um lado, a saúde pública e a salvaguarda da vida e do bem-estar das pessoas. Por outro, a protecção da imagem da democracia, das suas instituições e da aceitação da legitimidade das decisões tomadas por quem foi investido em posições autoridade.
Este é o link para a minha crónica de hoje no Diário de Notícias.
E o último parágrafo do meu escrito é assim:
"Ruídos recentes levaram-me a escrever este texto. Refiro-me à polémica sobre os brasões na Praça do Império frente ao Mosteiro dos Jerónimos, à ideia demolidora que trouxe o Padrão dos Descobrimentos para as redes sociais ou, ainda, ao passamento de um antigo militar que ganhou as suas medalhas no campo da guerra colonial. A paixão extrema das posições assumidas por muitos mostra, uma vez mais, que ainda não conseguimos falar com serenidade do Portugal que virou a página há quase cinquenta anos. Ora, sem esquecer o acontecido, os muitos problemas que temos pela frente pedem que passemos ao capítulo seguinte. Caso contrário, andaremos em conflito com nós próprios, absortos aos tiros nos pés, para o proveito e gáudio de quem nos quer manter distraídos."
Deve ser do confinamento prolongado, mas noto que várias pessoas conhecidas estão a ficar mais intolerantes. Quando falam de política ou de personalidades públicas, nas áreas da política e da intervenção social, perdem facilmente o equilíbrio. Os comentários que emitem são mais radicais, mais definitivos, mais ofensivos também.
Creio que é altura de lembrar a todos que os passeios higiénicos não estão proibidos. É bom apanhar vento no rosto e refrescar os olhos e a cabeça.
Não podemos deixar que a pandemia nos torne mais extremistas. Um país de extremistas e de gentes de ideias feitas é um país que não está bem consigo próprio.
Estou inteiramente de acordo em considerar demagógica a decisão do presidente da Câmara de Lisboa relativa aos brasões que se encontram na Praça do Império, frente ao Mosteiro dos Jerónimos. Para além da demagogia, a retirada desses brasões só pode ser vista como uma manifestação de radicalismo desmiolado.
Se Fernando Medina está de facto preocupado com essa praça a primeira coisa que deveria fazer seria a de mandar limpar e arranjar as escadarias e o túnel que a liga à esplanada do Padrão dos Descobrimentos. Essa infra-estrutura está frequentemente nauseabunda e também precisa de uma remodelação. Tem, por exemplo, dois ascensores para cadeiras de rodas. Nenhum deles funciona há meses e meses.
A campanha de vacinação vai ser um cavalo de batalha política de primeira ordem. Certos governos e a própria Comissão Europeia serão acusados de não dar a prioridade necessária ao assunto e de incompetência. Estas bandeiras serão aproveitadas pelas oposições. E como são matérias muito sensíveis, questões de vida ou de morte, não deverá ser muito difícil mobilizar a opinião pública.
Veremos. Mas creio ser um assunto sobre o qual se terá muito para dizer. Para já, nota-se que a confusão já começou e que as campanhas de vacinação andam a passo de caracol, com uma ou duas excepções.
As semanas e os meses que temos pela frente podem ser um virar de página muito marcante. O panorama político poderá ser alterado muito substancialmente.
Para certas cabeças, a História é tão incerta como o futuro. Pode mudar quando mudam as relações de força numa determinada sociedade, quando acontece uma reviravolta profunda ao nível de quem está no poder ou quando o relato do passado precisa de ser contado de outra maneira, para dar legitimidade a quem acaba de conquistar a liderança. O exemplo mais frequentemente citado é o relativo ao Partido Comunista da União Soviética. A narrativa histórica foi sendo modificada à medida das alterações radicais na composição do Bureau Político. Personagens desapareciam, os factos eram narrados de outra maneira ou suprimidos, o que fora positivo no passado passou a negativo ou foi esquecido, e vice versa. No todo, quando Gorbachev chegou ao poder, nos anos 80 do século passado, já se estava na terceira versão da história da União Soviética. Um amigo meu, homem que tinha as suas raízes familiares na vizinhança do Kremlin, no sentido figurado, para dizer que vinha de uma família que havia beneficiado do regime, embora não estivesse no centro das decisões, costumava dizer-me que a História é imprevisível.
Lembrei-me disto, agora que vejo uns vândalos e uns intelectuais de meia tijela empenhados em julgar o passado com os olhos dos extremismos de hoje e dos radicalismos com que sonham. Lançam-se às estátuas e aos personagens do passado com a mesma estreiteza com que vêem a política do presente. Perante isso, há que dizer-lhes que não. Que destruir ou danificar representações do passado não é um acto político, mas sim um crime. Que atacar o Infante D. Henrique ou outra personagem de outrora, com toda a cegueira que caracteriza os primários da nossas cenas políticas de agora, é pôr em causa os genes históricos e sociais que nos definem.
A História deve ser interpretada. À luz do seu tempo, porém. Mas não é para escaqueirar nem para servir os populismos e as modas do tempo presente.
Intolerância e confusão mental, acudam-me, os nossos intelectuais estão infectados. Basta ver o que escrevem no Facebook. Não sabem o que é debater. Só conhecem o verbo bater.No meio da confusão, esquecem-se que a política é feita de mensagens e símbolos. Exige coerência entre o que se faz e a maneira como isso é entendido pelos cidadãos.
Estamos convencidos, muitos de nós, que criticar mostra inteligência. Ora, isso depende. Muitas vezes, sim. E muitas outras, não. É apenas um repetir de ideias feitas, de julgamentos apressados. De conversa ligeira, ouvida nas televisões ou lida nas redes sociais.
Um dos temas que está na moda criticar é a União Europeia. Esta semana a crítica tem-se focalizado na resposta financeira à crise resultante do impacto do coronavírus, a resposta que foi aprovada pela Eurogrupo na passada quinta-feira. Já aqui escrevi sobre isso. Hoje, apenas pergunto a quem acha mal o que teria acontecido a Portugal, se o nosso país não fosse membro da zona euro? O dinheiro teria vindo donde? E a que preço? Da Casa da Moeda, com um valor que nem daria para pagar o papel e a tinta?
Também pergunto se esses críticos não notam que existe, apesar de todas as contradições e dos muitos preconceitos nacionais, que todos temos, uma preocupação de encontrar soluções? Não será a solução perfeita – o que é isso, nos dias de grande crise? – mas é a solução que resulta de um equilíbrio de políticas. Um equilíbrio que não é fácil de obter, mas que se procura conseguir. Não é fácil, porque os níveis de desenvolvimento dos países membros continuam a ser diferentes. Mas obtém-se, com mais ou menos dificuldades, porque é inspirado por uma ambição muito clara, que é a de manter a União e fortalecer os seus mecanismos de resposta às crises.