Acima vos deixo o link para o programa desta semana sobre a Europa, uma produção semanal da Rádio TDM de Macau. Desta vez, faço uma leitura das eleições gerais na Hungria, da onda de homicídios entre jovens em Londres, de Carles Puigdemont na Alemanha, e dos roubos de dados pessoais feitos por empresas parceiras do Facebook.
Quando Barack Obama visitar Madrid a 11 de julho, encontrar-se-á num país à procura de um governo. É verdade que estas visitas não acontecem por acaso. Sobretudo se se tiver em conta que o quadro político que terá resultado das eleições gerais de 26 de junho será complexo e de difícil arrumação. No centro dessa complexidade estará o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE). Relegado para a terceira posição, em termos de lugares nas Cortes do Reino, será no entanto a liderança do PSOE quem terá a chave da solução governativa nas mãos. Como será utilizada, eis a grande questão do momento.
Do exterior, incluindo dos EUA e de outros países influentes no seio da UE, choverá uma bateria de conselhos, pressões, dirão alguns, mais ou menos discretas. Assim funcionam as nossas democracias e os nossos aliados. A preferência dos parceiros externos da Espanha, especialmente nesta fase de múltiplas incertezas na arena internacional, irá no sentido de uma grande coligação entre o Partido Popular (PP) e o PSOE, liderados ou não pelos seus atuais dirigentes. Uma coligação que, para ser perfeita, incluiria ainda os chamados Ciudadanos, um agrupamento político do centro liberal que surgiu como uma contestação cívica à corrupção que manchou sobremaneira o PP no passado recente.
Esse seria claramente o arranjo preferido por uma Europa que já tem demasiados problemas em cima da mesa e que muito gostaria de contar em Espanha com um governo estável, forte, alinhado ao centro e politicamente previsível. Criaria igualmente as condições para uma Espanha mais ativa na cena europeia, diferente da que existiu nos últimos anos, que foram tempos de afastamento e de perda de influência em Bruxelas. Seria além disso um governo mais determinado a participar nas iniciativas comuns em matéria de migrações internacionais, de combate ao terrorismo, sobretudo no Norte de África, e na vigilância marítima ao largo da Península Ibérica, na parte que lhes cabe, sempre que se tratar de “acompanhar” os submarinos e outros navios russos em trânsito por estas paragens, no seu vaivém habitual entre São Petersburgo e o Mar Negro.
Uma grande coligação à espanhola não tem, no entanto, pernas para andar. Os antagonismos entre os populares e os socialistas, incluindo as inimizades pessoais ao nível dos líderes, têm raízes sociológicas profundas e marcam a vida política do país. Não constituem terreno propício para acordos programáticos. Por outro lado, se entrar num pacto governativo, o PSOE tem medo de perder a prazo uma fatia ainda mais vasta do seu eleitorado, que se deslocaria fatalmente para os movimentos à sua esquerda.
No final da sua estada, Obama poderá chegar à conclusão que um governo minoritário de base PP será a alternativa política mais provável. Esse governo manter-se-á no poder enquanto puder beneficiar da abstenção do PSOE nos momentos cruciais. Dará a impressão, por isso, de ser um governo com os meses contados, com eleições à vista nos finais de 2017 ou na primeira metade de 2018. Não terá condições nem vontade para fazer aprovar as reformas de fundo que já foram várias vezes recomendadas pela Comissão Europeia e pelas instituições da economia internacional. Em matéria orçamental, cairá em tentações perdulárias, como modo de ganhar popularidade, pisando assim ainda mais o risco das normas orçamentais em vigor na zona euro. No fundo, tratar-se-á de um governo fraco que contribuirá para enfraquecer, à sua maneira, uma já fragilizada UE.
Com uma taxa de participação nas eleições gerais de hoje próxima dos 73%, os eleitores espanhóis deram-nos uma lição de democracia. Como já nos haviam dado uma outra de política popular, de empenho cidadão, ao criarem dois poderosos movimentos de massas, Podemos e Ciudadanos. Sem esquecer que ambos tiveram excelentes resultados nestas eleições.
O acidente com o avião da companhia alemã Germanwings continua a dominar as notícias na nossa parte da Europa.
Esta tarde François Hollande, Angela Merkel e Mariano Rajoy visitaram o local que funciona como centro de operações, a poucos quilómetros do local do embate na montanha. Haverá quem critique estas deslocações, dizendo que mais não são do que exibição política. Se esses dirigentes tivessem decidido ficar nos seus gabinetes, à espera das notas de informação, muitos outros criticariam aquilo a que chamariam de falta de sensibilidade política.
Quando se lidera, há que saber fazer escolhas. Neste caso, a opção mais correcta era bem clara. Foi isso que os três líderes fizeram.
Vale mais pecar por excesso que por defeito. E um líder tem que mostrar empenho pessoal na resolução e esclarecimento de algo que é visto como um drama público e de grande interesse para muitos. Tem também que dar apoio aos que, com muita abnegação, intervêm na resposta a este tipo de acidentes, bombeiros, polícias, pessoal de saúde, funcionários da administração local, etc. A experiência diz-me que essas manifestações de apoio são altamente apreciadas por quem anda no terreno, ao vento e ao frio, no contacto com a dor e destruição.
Com Berlusconi uma vez mais a definir a agenda, a Itália está embrenhada numa nova corrida para a confusão. Reina a demagogia. Até Monti já faz promessas eleitorais irrealistas, ao revés da orientação que seguiu enquanto chefe de governo. Uma parte significativa do eleitorado irá votar, sem grande fé no prometido, mas com base no “nunca se sabe”.
A crise que rodeia Mariano Rajoy e a direcção do seu partido é mais uma machada profunda na credibilidade da classe política espanhola e em geral. A percentagem dos que ainda acreditam nos políticos, sobretudo em certos países europeus mais fragilizados, é cada vez menor.
Tudo isto tem um impacto muito negativo sobre a saúde da democracia. Assim se prepara o terreno que é favorável à emergência de ditadores. Há, por isso, motivo para preocupações reforçadas.
A decisão do Banco Central Europeu, que anunciou estar disposto a comprar obrigações de países da zona euro que estejam a seguir um programa formal de reformas estruturais, é uma boa notícia. É também um convite, para que a Espanha e a Itália pensem a sério na reforma das suas finanças públicas. Por isso, nos próximos dias e semanas convirá estar atento aos sinais vindos desses dois países.
Muito do futuro da Europa passa por Madrid e Roma. Creio, no entanto, que Mariano Rajoy é um problema bem maior do que os políticos italianos.
Entretanto, em Portugal, a taxa de crescimento do pessimismo continua de vento em popa. Só é superada pela elevada percentagem que a cacofonia de ideias ligeiras consegue atingir, todos os dias. Mas a verdade é que os portugueses gostam de foguetes e de facadas no ar. Chamam a isso "debate de ideias".
Fim de dia em Palencia, no nordeste da Espanha. A conversa é sobre as condições impostas pela UE relativas ao apoio ao sistema bancário do país. Apesar da retórica e das fanfarronices de Mariano Rajoy, a verdade é que se tratam de medidas de fundo e sob a supervisão apertada das instituições europeias.
Vou ver com mais cuidado. Entretanto, as notícias vindas da Alemanha, pela manhã, não são animadoras. A corrente de opinião desfavorável à Europa do Sul é cada vez maior e ganha cada dia mais preconceitos.