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Vistas largas

Crescemos quando abrimos horizontes

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Crescemos quando abrimos horizontes

Contra o radicalismo islâmico

Terror ou democracia

Victor Ângelo

Quase duzentos e cinquenta anos após a sua morte, Voltaire permanece como um dos pensadores mais influentes da história de França e da Europa. Escreveu abundantemente e foi conselheiro dos grandes de então. O seu pensamento político e filosófico abriu o caminho que levaria à Revolução Francesa e à divisa nacional, que ainda hoje se mantém: Liberdade, Igualdade, Fraternidade. Os seus escritos troçavam dos dogmas religiosos, numa altura em que era muito perigoso fazê-lo, batiam-se contra a intolerância, advogavam a liberdade de expressão e a separação da igreja do estado. Em 1736, escreveu uma peça de teatro contra a intransigência religiosa, que intitulou “O Fanatismo ou Maomé, o Profeta”. Nesta tragédia, Voltaire crítica diretamente e com todas as letras o fundador do Islão. Pessoalmente, leio a obra como sendo uma investida contra as religiões, num caso, de modo aberto, noutro, o do catolicismo, de maneira mais subtil, para não pôr em risco a sua pele.

Agora tornou-se impossível ensinar Voltaire nalgumas escolas de França, nomeadamente nos subúrbios de Paris. Certos alunos, vindos de famílias muçulmanas radicalizadas, impedem que tal aconteça. Para essas pessoas, Voltaire é o pior dos infiéis, aquele que se atreveu a conspurcar o nome do Profeta. No passado, a Santa Inquisição católica queimava os hereges em público. No presente dos maníacos islamistas, Voltaire seria degolado. Além de Voltaire, é um perigo falar do Holocausto ou condenar o antissemitismo, citar o escritor Gustave Flaubert e o seu romance Madame Bovary – uma mulher livre e apaixonada, um péssimo exemplo para um radical que considera que as mulheres devem ser submissas e andar tapadas da cabeça aos pés – ou procurar discutir Charlie Hebdo e as caricaturas de Maomé. Uma boa parte do sistema escolar público francês vive num clima de desassossego, em que a reação violenta de certos alunos substituiu o debate de ideias. E a intimidação começa cada vez mais cedo. Já se conhecem histórias de meninos que, nas escolas pré-primárias, recusam sentar-se ao lado das meninas.

Tudo isto nos leva à decapitação criminosa e absurda que ocorreu na semana passada. A vítima, o professor Samuel Paty, era um homem corajoso e consciente de que a missão das escolas também é a de formar os futuros cidadãos, livres, iguais em direitos, solidários, respeitadores e responsáveis. Mas, em França, a escola laica tem estado a ser ativamente minada pelos islamistas radicais desde 2005. Uma sondagem recente revelou que cerca de 40% dos professores de disciplinas literárias, cívicas e de humanidades se autocensuram e não mencionam, nas suas aulas, seja o que for que possa provocar a ira dos estudantes mais fanáticos. Por isso, a minha primeira reação à notícia do ato do tresloucado foi de admiração perante a coragem e o sentido de dever profissional de Samuel Paty. Lembrou-me ainda que a resposta à ameaça terrorista passa por um comportamento vertical, inequivocamente firme.

Mas a coragem e a firmeza não podem ser apenas questões individuais. O terrorismo não é o resultado, como alguns pretendem, das ações de “lobos solitários”. O velho visionário Friedrich Nietzsche dizia que “tudo o que é absoluto pertence à patologia”, mas no caso do terrorismo, é isso mais o contexto social. Estamos perante um fenómeno identitário extremo, um ecossistema social que faz viver num pântano ideológico salafista milhares de famílias. São uma franja minoritária dos cidadãos europeus de fé muçulmana, mas muito desestabilizadora.

Em situações como a francesa – e noutros países europeus, nomeadamente na Bélgica e nos Países Baixos, que vão no mesmo sentido do que se tem verificado em França – é fundamental acertar numa resposta política adequada. Numa outra ocasião, escreverei sobre o tratamento securitário da questão. Politicamente, convém começar por reconhecer que o fanatismo, ao colocar uma interpretação manipulada, primária e ignorante da religião acima dos valores da república, é uma ameaça para a democracia e para a paz social. Se os democratas não conseguissem tratar do radicalismo terrorista, a extrema-direita, chame-se ela Le Pen ou outra coisa, noutro país qualquer, utilizaria essa falência para conquistar o poder. E então esmagaria todos, não apenas os exaltados de faca em riste e as suas comunidades de apoio.

(Crónica que ontem publiquei no Diário de Notícias, edição semanal em papel)

 

 

 

Ainda sobre o Irão e nós

O meu amigo A. é visceralmente anti-americano. Todas as suas análises dos factos correntes assentam nesse sentimento, desde que hajam americanos metidos ao barulho. E as suas entranhas ainda ficam mais vulcânicas se a notícia tiver que ver com o Presidente Donald Trump.

Assim, os seus comentários sobre o assassinato do general iraniano Qassem Soleimani – um assunto sobre o qual escrevi longamente – eram previsíveis. Demoliam, forte e feio, o Presidente dos Estados Unidos. E davam os líderes iranianos como os bons da fita. Ou, menos menos, não havia uma sombra de uma crítica sobre eles.

Eu também não estou de acordo com a decisão tomada por Donald Trump. O meu texto de ontem menciona as principais razões, que são de ordem política e moral. E chamo a atenção para os riscos de agravamento dos conflitos numa região do globo que já está em crise profunda, com várias populações a sofrerem as maiores tragédias há anos. Toda e qualquer acção que leve a uma escalada da miséria e dos confrontos existentes só pode ser condenada. Sem equívocos.

Mas também é de condenar o regime que o Gen. Soleimani defendia. O Irão é um inferno político gerido em nome de Deus. É uma ditadura de religiosos com ideias dos tempos das ténebras, sem qualquer tipo de espaço para a liberdade e para os direitos humanos. É uma aberração histórica, vizinho de outros desvarios semelhantes e de inspiração semelhante, como por exemplo, a Arábia Saudita. O meu amigo A. não conseguiria respirar qualquer pontinha de democracia no Irão. Nem seria aceite, por ser visto ou como cristão ou como ateu, duas condições inaceitáveis nas terras dos religiosos do fanatismo.

Perante isto, que fazer, que papel poderemos desempenhar, enquanto europeus?

Modestamente, aqui ficam duas ideias.

Por um lado, procurar atenuar o confronto entre os Estados Unidos e o Irão, bem com os conflitos entre este último e os seus vizinhos sunitas. A mediação é a via. É isso que a França, em ligação com o Japão, têm tentado fazer, de modo confidencial, nos últimos meses. Não se fala no assunto, os contactos têm sido altamente secretos, mas existe uma tentativa de mediação. É evidente que esse processo ficou seriamente afectado com a decisão de matar, tomada pelo Presidente americano. Também é verdade que Donald Trump não acredita nas possibilidades de êxito dessa iniciativa. Na sua maneira de ver, a força é quem mais ordena. Mas as mediações são assim, têm primeiro que ganhar a confiança das partes. Mediar exige que se tenha a paciência de caminhar num labirinto.

Por outro lado, cabe-nos continuar a falar de democracia, do direito das populações em decidir que regime e dirigentes políticos querem, insistir na liberdade e na tolerância religiosas, enfim, nos valores que definem o mundo deste tempo que é o nosso. Temos, porém, que o fazer com coerência, evitando a duplicidade que tantas vezes nos caracteriza.

 

 

A Catedral de Notre-Dame como um símbolo

A grande lição que tiro da maneira como muitos responderam, em França, ao incêndio da catedral de Notre-Dame é clara. Mostra-me a importância da história, dos valores e dos símbolos que definem a identidade de um povo. Não é uma questão religiosa, nem um menosprezo pelas dificuldades da vida que muitos enfrentam.

Sri Lanka: condenar a barbárie

Este domingo de Páscoa ficará marcado pela extrema violência dos atentados praticados hoje no Sri Lanka e que tiveram como alvos igrejas católicas e hotéis frequentados por turistas estrangeiros. Foram actos profundamente chocantes, com consequências devastadoras, quer em vidas quer ainda para a tranquilidade que o país tem procurado estabelecer nos últimos anos.

Não se sabe ainda, apesar das especulações que por aí circulam, quem deve ser responsabilizado por estes crimes hediondos. Mas tem que haver uma condenação muito firme destas acções terroristas. Todos os quadrantes de opinião e de cultura devem expressar horror e solidariedade. E deixar as polícias continuar o trabalho de investigação que se impõe. Depois se falará de responsabilidades.

 

Sábado, véspera da Páscoa

Sábado de Páscoa. Uma parte da cidade de Bruxelas foi para a beira-mar. Organizaram-se, mesmo, comboios especiais, para responder à demanda e para evitar os engarrafamentos nas autoestradas. Outra parte, está a apanhar Sol nos parques da cidade. Que isto de ter 26 graus ao começo da tarde não pode ser desperdiçado.

Curiosamente, muitos dos jovens acham que é uma excelente ocasião para ter férias. O come;o da Primavera. Porém, não têm uma ideia clara – alguns não têm ideia alguma – do que significa Páscoa. Para além dos ovos de chocolate, para os mais pequenos, que os procuram nos jardins.

Assim se trata uma cultura milenária. Com Sol, praia e chocolate.

Terrorismo

O massacre de fiéis em duas mesquitas de Christchurch, na Nova Zelândia, deixou-me horrorizado. Tem que ser condenado com convicção e sem qualquer sombra de reservas. Todo o tipo de violência é condenável. A violência em massa e de modo cego, levada a cabo por razões de diferença étnica ou cultural, é particularmente perversa. É um acto de terrorismo. Tem como objectivo criar um clima de medo colectivo e de intolerância.

O que é ser europeu?

Na semana que passou, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos aprovou de modo unânime uma sentença que reconheceu ao governo da Bélgica a legitimidade para proibir o Niqab – o véu que cobre a cara e só deixa ver os olhos das mulheres que o utilizam – nos lugares públicos.

A argumentação teve em conta questões de segurança, de igualdade entre os homens e as mulheres e o imperativo da integração de cada pessoa na sociedade a que pertence. Se a sociedade não aceita, como é o caso da Bélgica, o Niqab, o Tribunal achou que haveria que ter esse facto em linha de conta.

A decisão procurou assim fazer o equilíbrio entre os direitos individuais e as exigências que decorrem da vida em sociedade. E deu, em grande medida, muita importância à questão do “viver com os outros”.

Estamos perante um contributo importante para a questão da diversidade de culturas na Europa. Esse assunto precisa, cada vez mais, de ser encarado de modo aprofundado, nas suas diferentes facetas e tendo em conta o que significa, nos dias de hoje, pertencer a uma nacionalidade europeia.

Uma visita que conta

Sou simplesmente ateu. Sem militância. Por isso, de um ponto de vista religioso, a próxima visita do Papa Francisco ao Santuário de Fátima deixa-me indiferente.

Reconheço, no entanto, que estas matérias têm outras dimensões, para além das relacionadas com a fé. Mesmo quando se trata de uma peregrinação, como é o caso desta vez. Assim, há o lado político da visita. O impacto económico. A dimensão securitária. A questão da imagem de Portugal.

Por todas estas razões, a visita do Papa deve merecer uma atenção especial. É fundamental que corra bem.

Depois, cada um poderá voltar à agitação dos seus estados de alma.

Que esconde o burkini?

O burkini tapa muita coisa

Victor Ângelo 

 

            A interdição do uso do chamado burkini, em várias praias de França, é uma medida bastante controversa. A favor, encontramos uma boa parte da classe política francesa, incluindo ao mais alto nível, segundo se percebeu ao ler as declarações recentes de Manuel Valls, o primeiro-ministro. Argumentam, no essencial, que se trata de uma maneira de vestir que traz, de modo ostensivo e provocatório, a militância religiosa extremista para um espaço comum de lazer, criando assim situações que podem perturbar a ordem pública. Este argumento vale o que vale. Mas a verdade é que a legalidade da interdição acaba de ser aceite pelo Tribunal Administrativo de Nice. Contra, estão a Liga dos Direitos Humanos e certas organizações islâmicas, que veem na proibição um ato discriminatório e contrário à liberdade individual. E no meio da polémica surge a questão dos direitos das mulheres, sem que a sua voz seja particularmente ouvida.

            Em Portugal e noutros países da Europa com uma proporção pouco expressiva de muçulmanos residentes, não se entende o que está em causa em França. Como também o não compreendem os britânicos, apesar do peso das comunidades islâmicas no quotidiano do Reino Unido. Nesse país, o alheamento perante o que é diferente e a segregação informal criaram um equilíbrio social entre mundos paralelos, que vivem à parte e fingem ignorar-se.

            Voltando à França, a contenda esconde questões muito sérias. Na minha leitura, estamos perante mensagens políticas de um novo tipo e sinais de uma crise de sociedade que se anuncia. O que os políticos parecem querer dizer é que esperam dos muçulmanos de França um comportamento que mostre que estão dispostos a integrar-se mais e melhor na cultura do país, tal como esta é entendida pela maioria da população. O burkini poderá ser uma solução no Norte de África ou no Médio Oriente. Não cabe, no entanto, na maneira laica, moderna e sem preconceitos de estar na vida que se pratica no Ocidente e em particular nos areais do Mediterrâneo da Côte d´Azur. Mais ainda, a sua introdução é vista como mais uma bandeira de uma campanha que certos sectores radicais pretendem promover, com vista a ganhar importância política através de uma militância de cariz religioso extremo. 

            Tudo isto reflete as novas inquietudes que se vive em França – e noutros países da vizinhança. Uma parte da França ficou traumatizada com a ocorrência sucessiva de atentados. É igualmente revelador de um conflito latente entre comunidades nacionais, que só espera que surjam faíscas, como as dos burquinis, para que se acendam os ânimos e se extremem as posições.

            Terá sido atingido o limite de tolerância em relação à diversidade cultural e étnica, em sociedades como a francesa? Iremos entrar numa fase de conflitos abertos e de discriminação deliberada contra quem é diferente? Veremos certos grupos minoritários, mas convencidos da sua superioridade religiosa e da força da sua determinação, começar a pôr em causa os valores do secularismo, da igualdade entre os homens e as mulheres, da liberdade de escolhas, incluindo a possibilidade de não se acreditar no além? Grupos que procurarão impor um modo de estar na vida que nada tem que ver com as práticas europeias de hoje?

            Haverá certamente motivos para se estar ansioso em relação ao futuro. Há, no entanto, que debater estas questões com serenidade. Mas, para já, devemos ficar preocupados por ver que os autores dos atentados estão, em certa medida, a conseguir realizar dois objetivos importantes. Dividir a sociedade, por um lado. Por outro, levar os políticos e a opinião pública a concentrarem a sua atenção em questões que não deveriam ser mais do que assuntos marginais no grande espectro de problemas que a França e alguns dos seus vizinhos têm pela frente. Incluindo nós, enquanto parceiros no mesmo espaço geopolítico.

 

(Texto que hoje publico na Visão on line)

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