Os resultados eleitorais mostraram um elevado grau de maturidade dos cidadãos. Houve empenho em participar, apesar da situação pandémica, e uma votação útil à esquerda, onde a única opção razoável, para a maioria, era um voto no PS. À direita, houve uma dispersão, por uma razão que me parece clara: a alternativa de direita, que era encabeçada por Rui Rio, não convenceu. Rio mostrou não ter o carisma nem uma imagem de estadista que fossem suficientes para captar eleitores. Apareceu, aos olhos de muitos, com demasiada ligeireza, que não convencia as pessoas que havia ali um dirigente de um futuro governo. Faltou-lhe gravidade, no sentido de solenidade de maneiras e tratamento profundo das questões.
O grande vencedor foi, na verdade, António Costa. Conseguiu fazer passar uma mensagem de seriedade política, de estabilidade e equilíbrio. Tem todo o mérito. Até porque não foram umas eleições fáceis. Uma parte do eleitorado que desta vez disse não à abstenção veio para votar à direita. Mas Costa soube manter a sua base de apoio e captar os que haviam anteriormente votado comunista ou pelo Bloco.
Uma maioria absoluta é muito melhor do que uma geringonça a cair aos bocados. Sobretudo uma geringonça com um partido do passado e outro de irrealistas românticos, incapazes de compreender como cresce um país e que alianças externas deve ter. O fim desse estranho arranjo político é talvez o ponto mais positivo desta eleição.
A dúzia de deputados do Chega irá fazer algum barulho na Assembleia da República. Mas como diria o saudoso Almirante Pinheiro de Azevedo, se ainda estivesse entre nós, será só fumaça. O povo mostrou, acrescentaria, ser sereno.
Parabéns a António Costa pela sua vitória eleitoral.
E igualmente aos eleitores, que apesar da pandemia, votaram e fizeram diminuir a percentagem da abstenção.
Quando ao resto, ainda é cedo para tirar conclusões, excepto que Rui Rio não convence o eleitorado e que os comunistas e os bloquistas pagaram a factura relativa à queda do governo. E que o CDS-PP desapareceu do mapa político.
Um outro ponto a ter em conta: continuar a observar o que significa o crescimento da Iniciativa Liberal. O do Chega, sabemos o que é.
Vi o debate entre António Costa e Rui Rio durante um minuto. Não tive paciência para mais. Mas admiro os 3,3 milhões de portugueses que assistiram ao duelo. Sim, porque na verdade tudo isto não passa de duelos ao vivo, de espectáculos para mostrar que se é mais arguto que o adversário.
É preciso fazer política de outra maneira. O meu texto de ontem no Diário de Notícias era sobre isso, a necessidade de construir plataformas políticas e de alargar a governação, de modo a torná-la tão próxima e representativa quanto possível do mosaico social que é a nação portuguesa.
Não se pode fazer política com base na hostilidade e na exclusão de largos sectores da sociedade. Sobretudo num país como o nosso, que precisa de uma mobilização cívica que permita ultrapassar o subdesenvolvimento, a pobreza de muitos e as disparidades sociais e regionais.
Acredito ser necessário proceder a uma mudança profunda dos valores, dos comportamentos e das prioridades para conseguir acelerar o desenvolvimento económico e social e diminuir o fosso que nos separa das médias europeias.
A minha mensagem é simples: tem de se fazer política de outra maneira. Com serenidade, com prioridades bem definidas, com o empenho público e privado, em associação com os poderes locais e as associações de cidadãos, e também com objectivos concretos que possam ser avaliados.
É isso que falta nos debates. Continuamos a agir como sempre fizemos, com ideologias ultrapassadas, incapazes de nos guiarem na transformação do país
Não tive a oportunidade de seguir de perto o congresso do PSD. O mesmo terá acontecido à maioria dos portugueses. Assim, a pergunta que faço – e que muitos farão, os que viram a coisa de longe – é a de tentar perceber que imagem ficou, agora que esse acontecimento político chegou ao fim.
A resposta é difícil, porque o partido não tem bandeiras muito nítidas. Dá a impressão que pode ser a alternativa a um governo liderado pelo PS, mas não avança com propostas concretas e mobilizadoras. É tudo muito genérico, mais do mesmo, mas dito por gente que não é do PS. Ora isso não é suficiente. Parece ser apenas conversa, propaganda partidária, sem nada de verdadeiramente transformador.
O país precisa de mensagens que sejam vistas pelos cidadãos como potencialmente transformadoras. E que digam respeito ao quotidiano das pessoas bem como ao futuro dos seus filhos, ou seja, que puxem o país para a frente. Só assim se mostrará garra política e espírito de missão. Sem isso, o resto é mais do mesmo, com personagens cinzentas e que projectam uma imagem oportunista.
Muito se disse nas últimas 24 horas sobre a vitória de Rui Rio. Uma vitória que para muitos foi uma grande surpresa, já que o seu adversário parecia reunir o apoio de todos os bem-pensantes que constituem a vida pública portuguesa, pelo menos do lado direito da mesma.
A realidade acabou por ser outra. Não irei aqui acrescentar nada ao que já foi dito sobre o fosso que parece existir entre as elites e o povo. Direi apenas que quando se ganha e perde por uma margem tão pequena deve ser porque nenhum dos dois candidatos reúne as características que os militantes gostam de ver num dirigente político. Por isso, tanto faz votar por A como por B.
O curioso foi o que aconteceu depois da votação. O discurso de vitória de Rio foi uma dissertação bem feita e marcadamente política. Mobilizadora. Se o candidato tivesse falado assim nas semanas anteriores, creio que teria tido uma vitória muito mais expressiva. É difícil de compreender porque não o fez. Dir-se-ia que a candidatura do seu adversário e os apoios que iam aparecendo na comunicação social o deixaram meio atordoado. Mas o homem sabe mexer-se ao nível das bases. E acorda quando ganha.
Agora, o desafio que tem pela frente é manter-se acordado até finais de janeiro.
A comunicação social portuguesa parece já ter decidido quem deverá ser o próximo líder do PSD. Sentem-se melhor com um dos candidatos. E dão-lhe projecção. É uma forma de democracia muito especial: a democracia do papel de jornal. Ou do visual. Efeitos, meus amigos, efeitos.
Dizem os politólogos mais em voga na nossa praça que o caso Sócrates não afecta, ao nível da opinião pública, nem o partido de que foi secretário-geral nem o actual patrão do mesmo partido, o Primeiro-Ministro António Costa. Ao ver os resultados das sondagens, até parece que têm razão.
Talvez afecte, isso sim, o principal partido da oposição e todos os outros aparentados a esse. Primeiro, porque não consegue tirar vantagem de uma mancha que poderia servir como grande tema de ataque, até porque Costa e outros no poder estiveram subordinados a Sócrates, conheciam-lhe os pontos negativos e fecharam os olhos, por uma questão de oportunismo e de carreirismo. Segundo, porque ao não pegarem no assunto dão azo a que se confirme que também eles têm telhados de vidro. Por isso, calam a boca e chutam para fora.
Na realidade, há mais corrupção na nossa política do que aquilo que se pensa. Não se fala da matéria, pois haveria muita roupa suja para lavar. Certos compadres ajudam a que o assunto não apareça nas páginas públicas.
E quanto mais se sabe mais nos apercebemos que a política actual atrai sobretudo quem vê nisso uma oportunidade de subida na vida sem grande esforço, além do saber dizer que sim.
Na sondagem política que o Diário de Notícias publica hoje destaco três aspectos.
Primeiro, que Rui Rio, o dirigente do PSD, não consegue sair da cepa torta, nem mesmo quando António Costa perde pontos de popularidade. Falta a Rio a chama que um líder político precisa de ter. Isto quer dizer que não consegue projectar uma imagem clara do que significaria votar por ele.
Não terá, lá nas fileiras do seu partido, quem o posso aconselhar em termos de percepção pública? Ou é o homem que não ouve ninguém?
Segundo, o CDS/PP aparece como uma força irrelevante. Com 0,8% das intenções de voto, não acrescenta nada à direita e ao movimento conservador. Fazer acordos políticos com essa insignificância é puro teatro sem consequências, é parvoíce política.
Terceiro, o partido Chega parece ter chegado ao limite das suas forças. Os dados mostram que não tem sabido aproveitar a dinâmica criada pela disputa eleitoral presidência. Consegue, apenas, mobilizar os eleitores mais radicalizados dentro do espectro ultraconservador e numa lógica de saco de gatos enfurecidos, que se arranham uns aos outros.
O que aconteceu e continua a acontecer no nosso Ministério da Justiça, sobre as falsidades que oficialmente foram transmitidas a Bruxelas sobre o procurador europeu, não deve ser classificado como uma trapalhada. É bem mais do que isso. E muito grave. É um abuso do poder, por parte de um grupo de governantes que pensa estar de pé e cal na mó de cima. Olham à volta e não vêem oposição que lhes faça medo. Sentem-se seguros e, por isso, seguem o velho princípio do quero, posso e mando, ao qual juntam o igualmente velho hábito da política portuguesa, o compadrio.
Dito de outra maneira, é uma política sem ética. Corrupta até ao tutano. Sim, que a justiça faz parte do âmago do Estado. É uma função essencial de soberania que se mostra tão desvirtuada como muitas outras.
A Ministra não se demite e o Primeiro-Ministro não se manifesta. Estamos bem entregues.
A maneira como Rui Rio reagiu à nova sondagem do Expresso, que dá o seu PSD em queda acentuada, revela um cinismo parvo e um sentido de humor a que falta o bom senso. Em resumo, não revela inteligência política.
Na realidade, a reacção que tornou pública ajuda a perceber a razão da baixa da popularidade do PSD: não tem um líder à altura.
Numa altura em que o governo de António Costa atravessa várias tempestades – o Ministro Cabrita, o SEF, a mortalidade excepcionalmente elevada por causa da Covid-19, a falta de preparação para a campanha de vacinação, a imprecisão da agenda económica de recuperação, a TAP, a candidatura de Ana Gomes e as divisões que provoca no interior do PS, etc, etc – o líder do principal partido da oposição anda no Twitter a fazer comentários tontos. Para além de não conseguir agarrar o momento para mostrar que tem ideias, planos e uma visão para o país. Uma visão que é, todavia, bem necessária, na sequência dos vários impactos da pandemia sobre a sociedade portuguesa e também porque a governação tem sido uma governação pela rama, às apalpadelas e sem rumo certo.