Os presidentes da África do Sul, do Senegal, da Zâmbia e das Comores estão neste momento no comboio que os levará da Polónia a Kyiv, onde se encontrarão amanhã com Volodymyr Zelensky. No dia seguinte, viajarão para são Petersburgo, para uma reunião com o Presidente russo. À última hora, os presidentes do Congo, do Egipto e do Uganda anularam a sua participação nesta viagem, pretensamente por razões de saúde.
A iniciativa foi primeiramente apresentada como uma missão de consultas com vista a um possível processo de paz. Com a intensificação dos combates, o objectivo foi reduzido a uma tentativa de manter o acordo sobre a exportação de cereais. A delegação africana será bem recebida em ambos os países, por razões diplomáticas, mas não deverá conseguir alcançar um resultado significativo. Neste momento, as partes beligerantes estão sobretudo focadas nas operações militares em curso. Este pode ser um momento determinante, para um lado ou o outro, no que respeita a ganhar vantagem operacional. Essa vantagem terá um grande impacto no futuro político do conflito.
O Presidente do Congo, Denis Sassou-Nguesso, que é uma velha raposa política, no poder desde 1979, com uma breve interrupção entre 1992 e 1997, foi o iniciador deste projecto. Habilidoso como é, entregou em seguida a direção do mesmo ao Presidente da África do Sul, país que é membro dos BRICS. E agora acabou por não ir, por achar que as condições de segurança relacionadas com a viagem por trem não eram suficientes. Penso, no entanto, que a verdadeira razão que o levou a anular reside no facto de Sassou-Nguesso considerar que a viagem seria um fracasso em termos de resultados. E ele já não tem idade para andar a perder tempo com um assunto que não lhe traria qualquer dividendo político.
Sassou-Nguesso tem-se mantido no poder graças ao apoio militar constante vindo de Angola. É, além disso, um dos dirigentes africanos mais corruptos. A Ucrânia não lhe diz nada.
O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, visita a partir de hoje, e até sexta-feira, Angola e o Senegal. Acompanham-no vários chefes de grandes multinacionais espanholas. Serão assinados acordos de investimento, comerciais e outros, sobretudo com Angola.
Esta deslocação corresponde ao lançamento do plano espanhol Foco África 2030. Tive a oportunidade de ler o documento. É um plano bem feito, claro e ambicioso. Aí se diz sem rodeios que a Espanha quer ser o país líder, dentro da União Europeia, no que respeita a África. E definem-se as prioridades e os países prioritários. Para além dos três mais importantes, que são designados como pontos de ancoragem de Espanha em África – Nigéria, Etiópia e África do Sul – são considerados prioritários o Senegal, a Costa do Marfim, o Gana, o Quénia, a Tanzânia, Moçambique e Angola.
Para garantir o bom seguimento do plano, serão reforçadas as embaixadas de Espanha em África, bem como as delegações comerciais e as Técnicas de Cooperação. E haverá um contacto muito mais frequente com os dirigentes africanos e os embaixadores de países africanos representados em Madrid.
Foco África 2030 levantará certamente muitas interrogações em Paris e, creio, em Lisboa. Estas duas capitais não deixarão de fazer uma leitura muito atenta das intenções espanholas.
O taxista que me levou ao aeroporto, em Bruxelas, tem as suas raízes no centro do Senegal, numa cidade – Kaolack - de uma região árida, a meio caminho entre Dakar e Banjul, na Gâmbia.
Passei muitas vezes por Kaolack, mas não me lembro de alguma vez ter parado e saído do carro: quem quer visitar uma terra de pó e de cabras, um centro urbano perdido no meio de um descampado inóspito, uma cidade atacada por todos os lados pela pobreza e a desertificação?
Hoje, disse-me, a situação está ainda pior. Há mais areia e menos esperança. Como em muitos outros sítios do Sahel. As famílias vivem das remessas que os seus filhos lhes enviam do estrangeiro, que há senegaleses emigrados em todos os cantos do mundo.
No caso do meu taxista, 390 euros seguem mensalmente em direcção a Kaolack. Os seus irmãos e outros parentes mais chegados enviam também a sua parte. O destinatário é a irmã mais velha, que ficou e substitui, como chefe da família, a mãe de todos, entretanto falecida. A irmã funciona como o centro de uma família alargada, várias gerações que ficaram para trás. Recebe um total de 2400 euros de remessas mensais e com esse dinheiro cuida e faz viver e estudar mais ou menos sessenta membros da família. A sua casa de Kaolack é como uma aldeia dentro da cidade, onde mora tudo menos o futuro.