Ninguém é obrigado a fazer fila durante 12 ou mais horas para passar uns segundos em frente do caixão de Isabel II. Que centenas de milhares de pessoas o façam é extremamente significativo: a Rainha, enquanto pessoa, marcou várias gerações de britânicos e de outros povos do Commonwealth. Também foi claramente apreciada por muitos que nada têm de ver com a história e a cultura do Reino Unido e dos países a ele ligados. Uma das características que poderá explicar um nível ímpar de apreço será a serenidade com que exerceu a função. A serenidade é um atributo pouco frequente entre os líderes políticos. Poderá dizer-se que no seu caso era fácil ser serena, na medida em que o cargo era permanente e vitalício. Mas ela sabia que nos dias de hoje, nada na política pode ser tido como favas contadas. A opinião pública pesa muito e é muito instável. Perde-se com facilidade, na actividade da governação, a credibilidade. Ela não a perdeu.
Sempre, mas sobretudo numa altura de grandes desafios, a voz de quem ocupa uma posição de autoridade deve ser clara. Cada resposta deve ser credível e fácil de entender. E expressa de um modo sereno.
Continua a haver pouca serenidade no debate público sobre o Orçamento 2012. É, para mim, uma grande preocupação, num momento em que Portugal está sem dinheiro. O que é dito é inflamatório, está a aumentar a confusão junto das pessoas e vai levar ao caos social. E, igualmente, à deterioração da credibilidade externa do nosso país. Ou seja, torná-lo num país a evitar.
O governo continua a perder terreno, na frente de batalha da informação pública, sem conseguir explicar o que deveria ser simples de explicar: neste momento, Portugal não pode passar sem o financiamento exterior do Estado. E essas verbas não se tornarão disponíveis se o programa de estabilização não for aplicado, com resultados tangíveis.
A oposicao, em vez de preparar propostas alternativas, apenas faz ruído.
O Presidente da República veio agora aumentar o volume desse ruído, com declarações ambíguas e difíceis de entender. Qual será o seu objectivo? Quando uma empresa do sector privado não consegue pagar os salários, deve-se obrigar todas as empresas do sector a proceder da mesma maneira?
Entretanto as centrais sindicais convocaram uma greve geral para 24 de Novembro. Têm todo o direito de o fazer. Mas será essa a melhor resposta, numa altura de falência como a actual? O responsável de uma dessas centrais falou dos "agiotas internacionais". Estaria a referir-se ao BCE, à CE e ao FMI?
A impressão que o PM deixou, hoje, em Bruxelas, após a conferência de imprensa, foi negativa. Mostrou-se com os nervos à flor da pele, intempestivo, arrogante e agressivo, incapaz de respeitar os jornalistas, ou seja, quem estava numa posição mais fraca. As respostas dadas pareciam farpas de combate, como se os profissionais dos média fossem inimigos pessoais, ou conspiradores a agir contra o que o PM pensa ser o futuro e o bem de Portugal. Foi uma má exibição junto de um grupo de jornalistas de grande qualidade. Gente que não tem medo de caras feias nem se deixa impressionar por olhares ferozes.
A boa liderança requer autocontrolo, serenidade, capacidade de empatia, respeito pelos outros, disponibilidade para compreender as posições que possam parecer diferentes. Faz-se com um sorriso amistoso, com graça e sentido de elevação. Com educação e sofisticação.
A crispação e agressividade têm que desaparecer da política portuguesa. Para o bem de todos.
O ministro das finanças de um país cada dia mais irreal - fantasista, diriam alguns, tragicómico, retorquiriam outros - diz que anda por aí um submarino. Não se percebe bem para que serve, nas palavras do ministro, mas deve ter como missão secreta arruinar as contas públicas. Se assim é, então estamos de facto num país muito estranho, em que as finanças e a defesa parecem pertencer a governos opostos. E onde a incompetência dos que tratam das finanças navega nas águas submersas do nosso populismo. Só que o populismo é um mar de pouca visibilidade, com muitos perigos e pouca serenidade.
Creio que é altura de pôr os pés em terra. Estamos à beira do precipício, há já algum tempo. Em vez de se tentar contornar o buraco, anda-se à paulada, quando a terra nos está a fugir de debaixo dos pés. Os marinheiros do submarino serão certamente muito competentes para uma navegação escondida. Mas a marinhagem de terra está cada vez mais desnorteada. Dá provas, todos os dias, que não está à altura dos ventos que sopram. Incompetentes, diriam alguns. Incapazes, responderiam outros. Hesito entre uma opinião e a outra...
O tema do meu escrito de hoje na revista Visão centra-se nas questões de segurança nas terras hostis do Sahel, incluindo na fronteira com o Darfur.
A minha tese é que certas organizações não-governamentais não estão a perceber a natureza dos riscos que existem nessa região. Agem como se a insegurança tivesse motivação política. E falam, a torto e a direito, da neutralidade que é preciso manter.
Mas a verdade é que não se trata de conflitos políticos. São actos de banditismo, de criminalidade pura e dura. Ameaças concretas contra as populações e contra os agentes humanitários. As Nações Unidas têm duas grandes operações de segurança na zona, a MINUAD. no Darfur, e a MINURCAT, no Chade e na República Centro-africana. Ambas têm como mandato proteger as organizações humanitárias, os refugiados e deslocados, bem como as populações locais, que são presas fáceis dos homens armados.
Ser protegido pela ONU não faz perder a neutralidade nem a independência das organizações. E permite continuar o trabalho de assistência, salvando muitas vidas em perigo.
Hoje, cedo, senti uma brisa fresca. Está um lindo dia de Sol. Mas também se consegue apanhar um pouco de frescura, à sombra das árvores que estão na plena força do Verão. Tudo isto é altamente apreciado, quando se vem de vários meses no Sahara e no Sahel.
O verde e a brisa dizem-me que é tempo de desaceleração. Por duas semanas.
Quem anda aos ventos secos compreende melhor a bênção que sai do verde das árvores frondosas.
Refugiado do Darfur, com quem me encontrei no campo perto da localidade chadiana de Goz Beida. Revelou uma grande dignidade e uma postura serena perante os desafios da vida. E não são poucos, para quem teve que abandonar tudo, e concentrar-se num campo em que o tempo passa lentamente.
Seria tão útil levar os nossos dirigentes políticos ao encontro destas pessoas. Cada conversa seria uma lição de vida. Serena. Com muita luz do Sol e um resto de esperança em dias melhores.