Estive hoje no Pavilhão Desportivo da Ajuda, para receber o reforço da vacina contra a Covid-19 e ser vacinado contra a gripe. Foi um serviço impecável, graças ao trabalho das jovens enfermeiras do SNS, dos Sapadores de Lisboa destacados para dar apoio logístico e organizativo e de todos os que trabalhavam nos bastidores. Excelente.
A minha colega Louisa C., cidadã suíça residente em Montreux, enviou-me uma mensagem este serão. Está contente, porque irá receber a primeira dose da vacina contra a covid a 26 de janeiro. A segunda será administrada 25 dias mais tarde. Tudo sem demoras, claro e certinho.
Louisa não tem qualquer problema de saúde. Tem apenas a mesma idade do que eu. Por isso, está no grupo prioritário.
Perguntava-me duas coisas. À primeira, disse que sim, que aceitarei ser vacinado. À segunda, respondi que não, que não tenho indicação alguma de quando será a minha vez. E mais não disse, pois ela sabe que eu vivo em Portugal.
Os eleitores do Partido Democrata no Estado do Nevada estão, neste momento, a votar para escolher quem poderá ser o candidato presidencial do partido. Os resultados só serão conhecidos amanhã, em virtude da diferença horária com Lisboa. Mas já é claro que um dos temas que mais mobiliza é o que diz respeito à protecção na doença. O acesso a serviços de saúde é uma questão fundamental para os cidadãos, ali, noutros estados e noutras partes do mundo. Incluindo em Portugal. Nenhum político pode ignorar esse assunto.
A mensagem de Ano Novo do Presidente da República vale a pena ser ouvida. Breve, vai directamente às grandes preocupações que Marcelo Rebelo de Sousa vê perfilarem-se em 2020. A saúde, a segurança, a coesão e a inclusão sociais, a ênfase numa sociedade baseada no conhecimento e,ainda, a questão do investimento.
Por detrás das palavras, o Presidente diz-nos que o Sistema Nacional de Saúde está com muitas dificuldades e que a segurança das pessoas não é tão boa como certos arautos do poder nos querem fazer acreditar – e eu, que sei um pouco de segurança, continuo a pensar que o país tem um grau de insegurança que merece mais atenção. Também nos lembra que as desigualdades sociais e a pobreza são uma realidade nacional, que a economia precisa de mais competências e de mais, bem mais, investimentos, públicos e privados.
Estas prioridade não nos podem fazer esquecer outras. Mas já seria óptimo se, neste ano que agora começa, se começasse a dar-lhes mais atenção.
Ninguém lhe pergunta pelo nome. Há anos que passa o dia na esplanada da rosa-dos-ventos, junto ao Padrão dos Descobrimentos, em Belém. A vender óculos de sol. Durante alguns anos, foi o único vendedor. Agora, o sítio está cheio de “ciganos”, como ele diz, todos no mesmo negócio. Ele também é cigano, mas de outra estirpe, um verdadeiro senhor, sem sotaque e sempre bem apresentado. Elegante, à sua maneira, que quem vende deve inspirar confiança.
Para quem passa, hoje ou frequentemente, é apenas um velho cigano que por ali anda, 67 anos de idade, a tentar vender uns óculos que poucos compram. Na verdade, com a concorrência que por ali há agora, tem dias em que vende apenas um par. Diz que mesmo assim vale a pena, que isso o ajuda a passar o tempo, permite-lhe sair de casa, longe do rio, na zona de Loures.
Nestes últimos tempos, anda encostado a uma canadiana. Tantos anos de pé, à volta do mundo que está desenhado no chão da rosa-dos-ventos, deram-lhe cabo de ambos os joelhos. De vez em quando não se aguenta nas pernas e cai. Mas com a afluência de turistas, há sempre quem o ajude a levantar-se. Um vendedor de óculos de sol vive e sobrevive de pé.
Está inscrito no Hospital de Loures há muito mais de dois anos, para fazer a operação que os joelhos lhe pedem. No chamado Serviço Nacional de Saúde. Já o convocaram, há cerca de um ano, para falar com o anestesista. E depois, é só esperar. E lá continua à espera, talvez mais um ou dois anos. Nessa altura, já deverá andar de cadeira de rodas, sempre à volta do mapa do mundo. O SNS pode não funcionar, mas a vida de vendedor ambulante não pode parar.
Entretanto, vai-se consumindo na resignação revoltada de quem não tem nome nem acesso. E de quem sabe o que significa ter que esperar pelo SNS.
O Diamantino é, afinal, à sua maneira, como muitos de nós.
Hoje lembrei-me do velho Deng Xiao-ping (1904-1997). O tal que dizia, por outras palavras mas com o mesmo sentido, que o importante não era a cor do gato, se branco ou preto, mas sim se caçava, ou não, ratos. É o pragmatismo político levado ao extremo.
Mas a verdade é que precisamos, no nosso caso bem português, de introduzir uma forte dose de pragmatismo na nossa prática política. Há conversa a mais, ideologia superficial em abundância, e poucos resultados práticos. Ora, o que os cidadãos querem é que o país funcione melhor, que lhes facilite a vida. Esse é o critério que conta.
Ora, estamos e temos estado, nas mãos de incompetentes. O verdadeiro combate político passa pela luta contra essa ineptidão. O Zé que vê a sua companheira esperar às portas do Serviço Nacional de Saúde até já não haver solução não pensa na cor do gato que está no governo. Fica convencido, isso sim, que a incompetência mata os pobres. A Maria, que aos 26 anos ainda anda à procura do primeiro emprego, depois de vários estágios faz-de-conta, compreende agora que o sistema educativo não a preparou para a vida. A incompetência do sistema público de educação dá cabo da vida aos jovens pobres, sem no entanto beliscar o futuro dos filhos dos ricos. E dos políticos…