No caso do Crédit Suisse quem perdeu, e bem, foram os acionistas e os detentores de obrigações emitidas pelo banco. Os accionistas viram o valor das suas acções passar de cerca de 12 Francos suíços (CHF) há dois anos para 0.88 CHF hoje. Nos últimos cinco anos, o valor dessas acções caiu 94.20%, ou seja, uma queda quase total. Quem sofreu agora uma perda absoluta foram os grandes detentores de obrigações, os detentores profissionais. O governo suíço declarou essas obrigações nulas, de valor zero. Esta decisão surpreendeu os mercados, que estão habituados ao princípio da segurança do capital facial das obrigações.
Para a economia suíça tudo isto é um grande golpe na imagem do seu sistema financeiro. Esse sistema é um dos três pilares da economia do país, sendo os outros o turismo e as indústrias de ponta, sobretudo a farmacêutica. Mostra que a supervisão bancária não foi feita de modo independente e competente. Ora, essas são duas características fundamentais para que o sistema bancário funcione de maneira correcta e inspire confiança.
A tempestade de poeira, que ontem e hoje se fez sentir na Península Ibérica, também chegou aos Alpes suíços. Gstaad, uma das cidades mais ricas e exclusivas da Suíça, também recebeu a poeira vinda do Saara. E os seus habitantes, quase todos gente que vive noutros pontos do país, mas que tem uma residência secundária na cidade ou nos arredores, lembraram-se, por uns escassos momentos, que há gente no Sahel que sofre esse tipo de tempo várias vezes ao longo do ano.
Na semana passada, tive a honra, pela sexta vez, de liderar os dois últimos dias da formação que o governo suíço dá anualmente aos seus quadros destacados em países onde existe algum tipo de conflito nacional.
Essa formação é feita numa base militar especialmente vocacionada para o apoio a destacamentos suíços no estrangeiro. Os participantes são civis, que se encontram ou se preparam para servir as embaixadas do país em lugares como Kinshasa ou na Birmânia, ou ainda para trabalhar para operações de paz, missões de mediação política ou de capacitação policial. Dura quinze dias, em regime de internamento e dedicação exclusiva. Passa em revista questões de segurança, de política internacional, os mandatos da ONU, NATO, OSCE e outras organizações, procede a exercícios de simulação de resolução de conflitos e de análise política.
Uma das questões mais centrais tem de ver com a liderança. Que significa boa liderança? Que exemplos podem ser estudados? Como ir mais além, na compreensão da questão da liderança, muito para além de um simples enunciado de princípios e atributos genéricos, muitas vezes lidos em livros escritos por que nunca praticou uma qualquer liderança de uma operação complexa?
A Suíça investe neste tipo de matérias e acaba por desempenhar um papel bem superior ao que seria de esperar, tendo em conta a neutralidade e a dimensão do país.
A minha colega Louisa C., cidadã suíça residente em Montreux, enviou-me uma mensagem este serão. Está contente, porque irá receber a primeira dose da vacina contra a covid a 26 de janeiro. A segunda será administrada 25 dias mais tarde. Tudo sem demoras, claro e certinho.
Louisa não tem qualquer problema de saúde. Tem apenas a mesma idade do que eu. Por isso, está no grupo prioritário.
Perguntava-me duas coisas. À primeira, disse que sim, que aceitarei ser vacinado. À segunda, respondi que não, que não tenho indicação alguma de quando será a minha vez. E mais não disse, pois ela sabe que eu vivo em Portugal.
Como acontece noutros países europeus, a Suíça tem agora vários rostos. Tive uma vez mais a ocasião de o observar, ao longo de um par de dias de partilha de experiências com jovens suíços destacados no estrangeiro, ao serviço das suas embaixadas ou do sistema das Nações Unidas.
Falo de quem tem a nacionalidade, não dos imigrantes que vivem no país, que são muitos e diversos.
Uma característica evidente, comum a esse novo tipo de suíços, é que a a nacionalidade implica integração e aceitação das regras de vida e dos valores que a Suíça tradicional sempre considerou seus. Assim, existe um deve e um haver claro: a obrigação de um certo tipo de comportamentos cívicos é compensada por um Estado que protege e cria condições de vida de qualidade para os seus cidadãos.
Sobre a Venezuela, repito que a saída da crise necessita de uma iniciativa de mediação internacional. A situação actual é muito grave e não permite que haja que vença e quem seja humilhado e possivelmente esmagado. A violência levaria a isso, a vencedores de um lado e vencidos, do outro. Seria uma tragédia nacional. E as divisões internas profundas ficariam por resolver. As causas do conflito não seriam resolvidas.
É preciso negociar. Com a ajuda de facilitadores externos e imparciais. A ONU está numa situação de fraqueza e não pode desempenhar o papel que deveria ser o seu. Infelizmente, assim é. A União Europeia também está excluída, por ter tomado posição, de modo inequívoco. E a América Latina encontra-se numa posição semelhante, de um lado ou do outro.
Quem, então?
A minha sugestão seria a de um triunvirato de países neutros, liderado pela Suíça e incluindo o México e o Vaticano. Com um mandato aceite por Nicolás Maduro e por Juan Guaidó. E com a aprovação silenciosa, tácita, sem discussão, do Conselho de Segurança da ONU. Se tal for possível, se o Conselho conseguir chegar a esse tipo de decisão. Mas não seria indispensável. O acordo de mediação que contaria seria o que comprometesse os líderes da Venezuela. É nesse sentido que se deve olhar em frente.
Filipe tem pouco mais de trinta anos, mas já vive na Suíça há cerca de doze. É condutor numa empresa. A sua mulher, também de nacionalidade portuguesa, trabalha numa casa de repouso para a terceira idade, como técnica especializada em geriatria. Vivem bem.
Por razões profissionais, sempre que vou à Suíça estou com o Filipe. E pergunto-lhe como vai a presença portuguesa nas terras helvéticas. A resposta, nos últimos anos, tem sido sempre a mesma. Filipe não gosta de ver chegar à Suíça novos imigrantes, e isso também se aplica aos que vêm de Portugal. É a favor de uma política mais apertada, que torne a imigração mais difícil e leve a uma diminuição das novas entradas. Na realidade, vê em cada imigrante que vá aparecendo um competidor, alguém disposto a trabalhar por um salário mais baixo e que poderá pôr em causa o seu emprego ou pelo menos, o seu nível de vida.
Se pudesse votar, o seu apoio iria para o partido nacionalista suíço, gente que se opõe à entrada de novos trabalhadores estrangeiros, mesmo quando provenientes de países da UE. Isto apesar do acordo que existe entre a Confederação Helvética e a UE sobre a livre circulação das pessoas.
Em França há muito português que pensa como o Filipe. Um bom número desses lusitanos já tem a nacionalidade francesa. Irão votar, amanhã. Sabe-se que muitos apoiam Marine Le Pen. Votam, sem hesitações, pelo partido da xenofobia, eles que ostentam nomes de família que são obviamente de fora, sem raízes gaulesas. Mas votam contra a onda que poderá vir a seguir. E que estará disposta a trabalhar em condições que os portugueses da primeira geração conheceram em França, anos atrás.
HSBC, um dos maiores bancos do mundo, muito ligado aos interesses ingleses no Oriente, a começar por Hong Kong, está hoje nos cabeçalhos dos jornais. A razão é de peso. São milhares de milhões de dólares depositados em contas clandestinas, na filial suíça do mesmo. Essas contas foram agora reveladas por um grupo de jornalistas independentes que se dedica a estas coisas. Os titulares da massa são gente muito fina, embora nem todos muito sejam muito recomendáveis, antes pelo contrário. Alguns deles são conhecidos por terem ligações directas com o crime organizado ou com ditaduras da pior espécie.
Os dados são do período 2005-2007. HSBC diz-nos que essas coisas já não acontecem, nos dias de hoje. Será verdade, creio. E o motivo é simples. É que os controlos estão muito mais apertados. E a própria Suíça deixou de querer ser associada ao dinheiro sujo. Por isso, os bancos suíços têm estado a correr com os titulares não-residentes de contas na Suíça que não consigam demonstrar que estão em ordem com as autoridades fiscais dos seus países de residência. É uma boa medida. Embora haja quem diga, à boca pequena, que são apenas as contas menos gordas que caem nessa categoria. Quem tem muito cabedal acaba sempre por conseguir residir num país generoso do ponto de vista fiscal. E pode assim declarar aos banqueiros suíços que está tudo em ordem
Passei os últimos dias em Genebra, por motivos profissionais. A cidade continua cara. Mas continua cheia de turistas vindos dos mais diversos cantos do mundo. Lembra-nos, assim, que não é o preço das coisas que traz ou afasta os visitantes ricos. Para quem tem dinheiro, o que conta é a qualidade de vida, a segurança e a ordem pública, o bom funcionamento dos serviços, um ambiente de prosperidade e uma maneira positiva de encarar a vida. E isso, Genebra tem com abundância.
Passar dois ou três dias em Lauenen, a cinco quilómetros de Gstaad, nos Alpes suíços, com um Sol radioso, ajuda a perceber que tudo depende da capacidade de liderança. A localidade, com cerca de 800 habitantes e dezenas de chalés de madeira, era um buraco sem interesse há trinta anos. Hoje é um destino de turismo de luxo. Os habitantes, que outrora viviam ao sabor dos subsídios, são agora dos mais prósperos do país. As autoridades locais souberam dar a volta a uma natureza agreste e transformá-la numa fonte de riqueza. Para isso apostaram na conservação das belezas naturais, no ordenamento do território, na disciplina cívica e na segurança das pessoas e dos seus bens. Nada disto é excepcional. O que é excepcional é encontrar os políticos que tenham a coragem de o fazer.